A destruição da Amazônia em números

gado substitui floresta

De um lado, #TodosPelaAmazônia. Do outro, um trabalho altamente profissional de desmatamento: a cada hora, caem por terra o equivalente a 128 campos de futebol de floresta. Sim, você leu direito: a cada 60 minutos. Isso significa que até você terminar de ler este texto, uma área equivalente a mais ou menos 10 campos de futebol terá sido destruída.

 

O Brasil está em guerra e as vítimas não são só as vítimas das balas, perdidas ou intencionais, disparadas em áreas urbanas. Existe um ataque sistemático à Amazônia em duas frentes: a legal e a ilegal. Na frente legal – que é a que chega ao noticiário – temos sido testemunhas de decretos arbitrários e absurdos que liberam terras da União a preço de banana para grileiros. Ou que tentam abrir mata virgem para negócios pouco inclusivos, como a mineração ou a exploração de petróleo. Na frente ilegal, avançam as motosserras e correntões.

 

Quase 25% do desmatamento da Amazônia ocorre hoje em terras públicas e 12% em áreas protegidas – percentual que dobrou desde 2008.  Em áreas públicas, a velocidade de destruição é 60 vezes maior do que a que ocorre dentro de áreas protegidas. As áreas públicas, que somam 80 milhões de hectares, ou 17% de toda a Amazônia, não têm uso definido. Não foram repassadas a produtores nem demarcadas como unidades de conservação ou terras indígenas. Também não são áreas militares nem de pesquisa. Por isso, encontram-se à mercê de grilagem, ocupações ilegais, degradação ambiental e sangrentos conflitos.

 

O profissionalismo dos desmatadores chega ao ponto de contratar profissionais de geoprocessamento para monitorar as queimadas e estabelecer pastos após a extração da madeira, assim como criar registros falsos de áreas invadidas para lhes conferir legalidade.   Para enganar os satélites, as quadrilhas preservam as árvores de copas mais altas enquanto derrubam outras espécies. Elas também desmatam pequenos polígonos, e não grandes áreas de uma vez só. Os bandidos passaram a desmatar também durante o período chuvoso, quando a dificuldade de se deslocar na floresta é compensada pelas nuvens que prejudicam a detecção pelos satélites.

 

E como violência gera violência, o desmatamento ilegal vem acompanhado de ameaças de morte – promessas que, muitas vezes, são cumpridas. Em junho de 2017, a revista Exame publicou matéria de capa sobre o desmatamento da Amazônia. Uma das fontes entrevistadas foi Olavo Perim Galvão que semanas depois morreu trabalhando.  Ele estava no táxi aéreo fretado pelo Exército Brasileiro, em Roraima, pela Operação Curare que caiu após decolar e explodiu, matando três agentes do Ibama.  É dessa matéria, das jornalistas Ana Luiza Herzog e Renata Vieira, que extraímos os dados acima e os que estão a seguir:

 

  • 60% do desmatamento vira pasto, mas com uma quantidade pequena de bois para uma ampla extensão de pastagens que não conta com qualquer prática de manejo. Resultado: produtividade baixa e degradação avançada em menos de uma década.
  • Pesquisas comprovam que o desmatamento altera o ciclo das chuvas na Amazônia, reduzindo a precipitação na superfície desmatada e elevando na região de floresta ao lado da área desmatada. Em Rondônia, a estação seca já está cerca de 30% mais seca do que a média. No noroeste do estado, o nível de precipitação é 30% maior. Mas não é apenas um problema regional: há consenso na comunidade científica de que a Floresta Amazônica tem papel determinante no regime de chuvas no centro-sul do Brasil.
  • Levantamento feito pelo Ipam e o Imazon revela que o PIB agropecuário da região amazônica cresce em proporção inversa ao ritmo do desmatamento. Nos anos de 2004 e 2005, quando a taxa de desflorestamento passou dos 27 000 quilômetros quadrados anuais, a riqueza gerada pela agricultura e pela pecuária na região alcançou cerca de 25 bilhões de reais. Já entre 2012 e 2013, quando a área desmatada havia caído vertiginosamente para pouco mais de 4 000 quilômetros quadrados anuais, a produção rural gerou 50 bilhões de reais.
  • Em 2017, os dez municípios campeões do desmatamento estão entre os mais pobres da Amazônia e do Brasil. A maioria deles fica no Pará, no Amazonas e em Rondônia.
  • Em 2004, o Brasil perdeu quase 28 000 quilômetros quadrados de floresta — uma área equivalente à do estado de Alagoas.
  • Entre 2004 e 2014, o ritmo de desmatamento caiu 80%.
  • Em 2015, os satélites do Prodes, sistema do governo que monitora com satélites o desmatamento da Amazônia, voltaram a registrar alta, de 24%.
  • Coincidentemente, o Ibama perdeu 30% do orçamento de 2015 para 2016 e vem sofrendo sucessivos cortes desde então.
  • Em 2016, o aumento de 29% confirmou a tendência, que se repetiria nos anos subsequentes.
  • A fiscalização também se dá em nível estadual, mas segundo a Associação Brasileira de Entidades Estaduais do Meio Ambiente, em 2016 as secretarias perderam, em média, um terço de seus orçamentos.
  • O desmatamento em 2016 acrescentou 130 milhões de toneladas de gás carbônico equivalentes às emissões do Brasil – quantidade que é o dobro de todas as emissões em um ano de um país como Portugal.
  • De agosto de 2015 a julho de 2016, o ritmo de destruição da floresta cresceu cerca de 30%. Nesse período, foram derrubados quase 8.000 quilômetros quadrados de floresta por ano, o equivalente a desmatar 128 campos de futebol de floresta por hora. É a maior extensão desmatada desde 2008 na Amazônia Legal. Boa parte do avanço concentrou-se nos estados de Pará, Mato Grosso, Rondônia e Amazonas.
  • Ao todo, a Amazônia já perdeu quase 20% de sua cobertura original, uma área equivalente a uma França e meia, entrando na faixa de risco de disrupção: estudos mostram que a perda de 20% a 30% de floresta leva a mudanças profundas nos ciclos naturais do bioma, como variação de temperatura e a consequente ameaça à vida animal.
  • Por falta de recursos, em setembro de 2016 o IBAMA não colocou um único agente em campo. Para contornar a falta de recursos, em novembro o IBAMA recorreu ao Fundo Amazônia, que está pagando o aluguel dos carros e helicópteros que monitoram a região até o final de 2017. Mas estes recursos também estão em xeque, com a decisão, por parte da Noruega, de cortar seus aportes pela metade porque sua finalidade – conter o desmatamento – não está sendo cumprida. Cerca de 200 milhões de reais já foram suspensos.
  • Em 2017, o IBAMA mantinha 960 fiscais em campo no país, 351 a menos em relação a 2010. Não há novos concursos desde 2012.
  • Apenas 30% das multas aplicadas pelo Ibama são pagas. A lentidão da Justiça joga a favor dos bandidos que, em muitos casos, mantêm a posse de bens apreendidos em operação, como motosserras, enquanto corre o processo penal.
  • Estima-se que 80% da madeira comercializada no Brasil seja ilegal, ou maquiada.

 

O vídeo abaixo foi produzido pela equipe da revista Exame.  A foto que ilustra este texto foi extraída do site do fotógrafo Rodrigo Baleia – https://rodrigobaleia.exposure.co/amazon-rainforest – onde você encontrará outras imagens igualmente impactantes.