Planos de venda rápida levantam temores quanto a uma corrida global pelas reservas do pré-sal

Plataforma de exploração de petróleo na Baía de Guanabara

A de renúncia fiscal para o pré-sal aumentaria as emissões e contradiz a posição progressiva da nação em Bonn
(Jonathan Watts, The Guardian, 15/11/2017)

 

O Brasil está planejando uma venda rápida de suas reservas de petróleo antes que o encolhimento dos orçamentos globais de carbono pressione a demanda e os preços, advertem organizações ambientais.

 

O foco da preocupação é uma proposta do governo que dá até R$ 1 trilhão em renúncia fiscal para empresas que explorarem os campos de petróleo do pré-sal. Os que se opõem à proposta, dizem que o governo usaria até 7% do orçamento de carbono da humanidade – a quantidade de combustíveis fósseis que podemos queimar sem ultrapassar 2oC de aquecimento global.

 

O Observatório do Clima, WWF, Greenpeace e outros grupos dizem que os subsídios podem desencadear uma corrida pela extração rápida dos combustíveis fósseis com rivais como os EUA, Arábia Saudita, Rússia, Noruega e Reino Unido.

 

As acusações contradizem a posição do Brasil nas negociações climáticas desta semana, na qual os negociadores do país pediram ao mundo que seja mais ambicioso na redução das emissões de carbono.

 

“O país está fazendo exatamente o oposto: aumentando as emissões e se abrindo para as grandes petroleiras com subsídios bilionários no momento em que o país ainda tenta se recuperar de sua pior recessão”, disse Carlos Rittl, secretário executivo do Observatório do Clima.

 

Acredita-se que os campos de pré-sal contenham petróleo e gás equivalente a 176 bilhões de barris de petróleo bruto, ou 74,8 bilhões de toneladas de CO2. Isto é 7% do orçamento de carbono para 2oC e 18% para 1,5oC, de acordo com cálculos do Observatório do Clima.

 

A extração já está em andamento, mas o governo Temer, que assumiu o poder depois do impeachment da ex-presidente Dilma no ano passado, está ansioso para acelerar o processo.

 

Temer propôs a medida provisória MP 795 reduzindo os impostos até 2040 para as empresas que ganhem em leilões o direito de explorar os campos petrolíferos. O subsídio daria ao governo uma das menores participações em receita do mundo sobre cada barril, subvertendo efetivamente a concorrência.

 

“Este é um sinal terrível”, disse Jennifer Morgan, diretora executiva da Greenpeace Internacional. “Com este projeto, o Brasil tronará a responsabilidade global de redução de emissões ainda mais difícil do que já é”.

 

O Congresso deverá votar a MP 795 antes de 15 de dezembro. Os deputados da oposição dizem que os subsídios para o petróleo são injustos no momento em que os orçamentos da saúde e da educação foram congelados por 20 anos e os pagamentos pela proteção da floresta foram cortados.

 

O governo diz que a medida é necessária para garantir o sucesso de leilões futuros que gerarão receita para ajudar uma economia que está emergindo lentamente de sua pior recessão em um século. O governo Temer prevê que 70,5% de todo o investimento em energia até 2026 será empregado em combustíveis fósseis.

 

As emissões de carbono do Brasil subiram 8,9% no ano passado – o maior aumento desde 2008 – em grande parte como resultado do aumento do desmatamento na Amazônia e no Cerrado.

 

Isso ameaça o papel de liderança-pelo-exemplo que os diplomatas brasileiros especializados têm empregado há muito tempo nas negociações climáticas.

 

Representantes do governo dizem que muitos países também estão promovendo o petróleo e carvão e que, em alguns casos, como o da Alemanha, suas emissões também estão aumentando. Em comparação, eles dizem que o Brasil obtém 74% de sua eletricidade de fontes renováveis (principalmente hidrelétricas) e que o ritmo do desmatamento desacelerou em 16% neste ano após um aumento nos dois anos anteriores que afastou o país dos seus objetivos climáticos.

 

O principal negociador de mudanças climáticas do país, José Antônio Marcondes, insistiu que o Brasil faz sua parte e exortou as nações desenvolvidas a acelerarem a ação nos próximos três anos.

 

“Se quisermos atingir os objetivos estabelecidos em Paris, não podemos atrasar a ação até 2020. A ambição e as ações não devem ser adiadas”, afirmou. “Se não cumprirmos os prazos, se as coisas se tornarem ainda mais difíceis nas discussões – o que estamos fazendo tudo para evitar – não devemos, não podemos correr o risco de repetir Copenhague quando o mundo não conseguiu concordar com a ação”.

 

Foi exatamente este tipo de argumento positivo que permitiu que o Brasil avançasse as negociações e fizesse uma ponte sobre o fosso existente entre países ricos e países pobres. No entanto, quando perguntado sobre as propostas de subsídios ao combustível fóssil discutidas nacionalmente, ele foi muito menos seguro.

 

“É claro que estamos seguindo as discussões legislativas em torno de possíveis medidas fiscais. No entanto, não deve ser ignorado que adotamos objetivos de redução de emissões no Acordo de Paris que estão entre os mais ambiciosos do mundo – tanto entre os países desenvolvidos como entre os em desenvolvimento – e que esses objetivos estão além das drásticas reduções já alcançadas “, disse ele.

Artigo originalmente publicado no The Guardian.