ClimaInfo, 23 de janeiro de 2018

ClimaInfo mudanças climáticas

Uma leitura diária dos muitos assuntos relacionados às mudanças climáticas


CONFLITOS NAS TERRAS KAAPOR NO MARANHÃO

Jonathan Watts escreveu no Guardian sobre o conflito entre índios Kaapor e madeireiros na Terra Indígena Alto Turiaçu, Maranhão, a cerca de 300 km de São Luiz. Watts centra o artigo no assassinato de Sairá Kaapor, no meio do ano passado, para fazer um panorama dos conflitos provocados por madeireiros ilegais que extraem ipê da terra Kaapor e incendeiam a mata para abrir pastagens. Caracterizando a região como dominada por coronéis, Watts fala do clã do “grão-coronel” Sarney e o coronel local, Josimar Rodrigues. A polícia nem sequer abriu inquérito.

Os Kaapor são exemplo acabado de que as populações indígenas zelam pelas florestas melhor que qualquer agricultor. Basta buscar por Alto Turiaçu no Google para ver a mancha de verde escura que se destaca da área que a rodeia.

https://www.theguardian.com/world/2018/jan/21/amazon-forests-maranhao-state-loggers-kaapor-tribe-murder

 

EUCALIPTO TRANSGÊNICO

As empresas de celulose brasileiras estão desenvolvendo variedades de eucalipto geneticamente modificadas. O eucalipto no Brasil é um caso de sucesso da pesquisa genética voltada para a produção industrial. Agora, as empresas estão dando um passo além, deixando de somente selecionar variedades rentáveis para mexer nos genes propriamente ditos. O H421 gera 20% mais madeira. Para aproveitá-lo, as empresas terão que abrir mão de um certificado precioso fornecido pelo Forest Stewardship Council, o FSC que aparece em várias embalagens de papel. O FSC tem nas suas normas a proibição explícita de transgênicos. Para se ter uma ideia do rigor do FSC, a proibição se estende a todos os produtos de uma empresa, mesmo à parte eventualmente vinda de plantios 100% naturais e de regiões totalmente distintas.

Em tempo: produtores de mel de eucalipto também perdem a certificação, se forem empregadas as árvores transgênicas.

http://epoca.globo.com/ciencia-e-meio-ambiente/noticia/2018/01/o-dilema-do-eucalipto-transgenico.html

 

ÁREA PLANTADA COM CANA CONTINUA ESTAGNADA

Os produtores de cana apostam suas fichas no RenovaBio para superar a crise iniciada na gestão Dilma, quando o controle dos preços da gasolina fez com que o etanol perdesse competitividade. Se, em 2008, o país chegou a ter cerca de 450 usinas e planos concretos para mais 250, hoje sobraram 366, e em situação financeira precária.

Por conta dos baixos investimentos nos últimos anos, é esperada uma estagnação da produção de cana em 2018. Analistas ouvidos pelo Estadão dizem esperar que o setor consiga investir apenas metade do que seria necessário para fazer a ampla manutenção dos canaviais que poderia elevar a produtividade das lavouras. Como a perspectiva do preço internacional do açúcar não anima neste ano, de acordo com a ÚNICA, a União da Indústria de Cana-de-açúcar, a estratégia do setor é reduzir a produção de açúcar em 10% e aumentar a de etanol. Isto deve gerar um faturamento de R$ 90 bilhões, de acordo com levantamento preliminar da ÚNICA, uma queda de 8% em relação à última safra e uma quantia ainda insuficiente para novos investimentos, já que boa parte dos produtores precisa destinar parte de seu caixa para o pagamento de dívidas. Quanto ao RenovaBio, alguns produtores entendem que ele será regulamentado em 2018. A ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), reguladora do RenovaBio, terá a missão de elevar as metas de compra de etanol das distribuidoras (e melhorar as perspectivas dos usineiros).

http://economia.estadao.com.br/noticias/negocios,com-divida-de-r-100-bi-usinas-apostam-em-etanol-para-tentar-se-recuperar,70002159633

MUSEU AO AR LIVRE EXIGE VACINA CONTRA A FEBRE AMARELA

O Instituto Inhotim, no município de Brumadinho, perto de Belo Horizonte, é o maior museu de arte a céu aberto do mundo e local visitado por milhares de pessoas todo ano. Por causa da epidemia de febre amarela, passou a exigir comprovante de vacinação dos visitantes. Brumadinho é um dos quase cem municípios de Minas Gerais em estado de emergência pelo risco de febre amarela.

http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/01/1951581-em-mg-inhotim-exigira-comprovacao-de-vacina-contra-febre-amarela.shtml

 

DEZ PREVISÕES DA BLOOMBERG SOBRE ENERGIA CADA VEZ MAIS LIMPA EM 2018

A Bloomberg divulgou suas previsões para o desempenho das fontes renováveis de energia em 2018. De modo geral, os analistas dizem que os preços devem continuar caindo, assim como os das baterias de lítio. Os dois maiores riscos previstos são crises políticas em lugares como Coréia do Norte, Arábia Saudita ou a Casa Branca de Trump, e uma ligeira tendência de aumento dos juros no mercado mundial, o que elevaria o custo de capital dos empreendimentos.

Das dez previsões da Bloomberg, seis são sobre fontes renováveis de energia e veículos elétricos:

  1. O investimento em renováveis deve ficar em torno dos US$ 330 bilhões alcançados no ano passado.
  2. Haverá mais de 100 GW de fotovoltaicos até o final do ano.
  3. Serão mais 60 GW de eólicas, 10% mais do que no ano passado.
  4. O preço das baterias de lítio continua a cair, apesar dos preços do lítio e do cobalto terem mais que dobrado em 2017.
  5. Serão vendidos 1,5 milhões de carros elétricos só este ano.
  6. Carros autônomos terão rodado 8,5 milhões de km até o final do ano, tanto em testes como na vida real.

Quanto às demais previsões: o gás natural deve continuar se expandindo, ainda mais na forma liquefeita, e o carvão vai continuar em rota de extinção nos EUA, apesar de Trump, bem como na Índia; 2018 será o último ano em que se verá o início de construção de mais usinas a carvão do que de plantas renováveis.

https://about.bnef.com/blog/clean-energy-10-predictions-2018/

 

O QUE PENSA O CEO DA FIAT SOBRE VEÍCULOS ELÉTRICOS

Sergio Marchionne, CEO da Fiat Chrysler Automobiles (FCA), tentou jogar um pouco de água fria no entusiasmo pelos carros elétricos. Segundo ele, a versão elétrica do Fiat 500, lançada na Califórnia por conta da legislação local cada vez mais restritiva à emissões, é vendida com prejuízo e que vender o veículo “em larga escala seria, naturalmente, masoquismo econômico extremo”. O centro do argumento de Marchionne são as matrizes elétricas. Ele diz que, nos países onde predominam usinas a carvão, os carros elétricos poderiam emitir mais do que os a gasolina.

A visão da FCA expressa por Marchionne distoa dos planos de concorrentes europeus, japoneses, chineses e, mais recentemente, norte-americanos.

https://projetodraft.com/precisamos-ser-realistas-a-respeito-dos-carros-eletricos/

 

ESTUDOS SOBRE IMPACTOS DA GEOENGENHARIA E BECCS SEGUEM NEGATIVOS

Duas notas sobre as andanças da geoengenharia. Pesquisadores norte-americanos publicaram um trabalho na Nature Ecology & Evolution sobre potenciais impactos de soluções de geoengenharia. O ponto de partida foi que essas proposições introduzem mudanças rápidas nos padrões climáticos, dando pouco tempo para que as espécies possam se adaptar e, assim, gerando um impacto importante sobre a biodiversidade. Eles rodaram modelos climáticos simulando a introdução de soluções que provocam a estabilização da temperatura mesmo nos pontos mais quentes do planeta. Interessante foram os resultados para um futuro onde, bruscamente, se retira a tal solução. Nessa situação, como os gases de efeito estufa continuaram se acumulando na atmosfera, ao se retirar a tal solução a temperatura média global aumenta rapidamente e, com isso, todas as outras consequências do aquecimento global, com enorme prejuízo para a biodiversidade.

Outro artigo estudou o impacto da adoção em larga escala das BECCS (sigla em inglês de Captura e Armazenamento de Carbono de Bioenergia). A ideia é das mais simpáticas: queime biomassa para gerar eletricidade e enterre o CO2 que sai pela chaminé. No ciclo, as plantas retiram (sequestram, capturam) carbono da atmosfera que acaba sendo enterrado bem lá no fundo e, espera-se, para sempre. Pesquisadores alemães ligados ao Instituto Postdam mostraram que, esses esquemas aliviam a pressão do aumento da temperatura de maneira direta, mas colocam em risco outros sistemas. Usando um trabalho publicado na Science em 2015, sobre limites seguros de uso dos recursos terrestres, os pesquisadores concluíram que, para ficarmos 100% dentro dos limites seguros, os BECCS retirariam menos de 1% do que o mundo emite anualmente. Para aumentar a quantidade de carbono capturado, haveria que entrar na zona de alto risco com potencial perda de 10% da cobertura florestal, e quase isso de segurança para a biodiversidade.

https://www.nature.com/articles/s41559-017-0431-0

http://www.observatoriodoclima.eco.br/saida-de-emergencia-para-o-clima-pode-arrasar-amazonia-e-recifes-de-coral/

https://www.nature.com/articles/s41558-017-0064-y

https://www.carbonbrief.org/geoengineering-carries-large-risks-for-natural-world-studies-show

http://science.sciencemag.org/content/early/2015/01/14/science.1259855

 

MUDANÇA DO CLIMA E CASAMENTO INFANTIL

Bangladesh é um dos mais claros de exemplos de como nações que praticamente não contribuíram com as causas são justamente as que mais sofrem com as consequências do aquecimento global. É também exemplo de como problemas ambientais e sociais estão relacionados.

Os efeitos das mudanças do clima sobre a renda das famílias estão levando a um aumento no número de casamentos de meninas, segundo um estudo de três anos citado pelo New York Times. O artigo relata a história de Nurul Haque, fazendeiro que perdeu toda a sua terra para o oceano e que, por isso, está considerando tirar da escola sua filha de 13 anos, Munni Akter, e casá-la com um homem mais velho, porque ele tem poucas opções financeiras para apoiá-la. Detalhe: Bangladesh já tem uma taxa de casamentos de meninas com menos de 15 anos da ordem de 22%, uma das mais altas do mundo segundo a UNICEF. Nicholas Kristof, que assina o texto do NYT, diz ter visto o mesmo em Madagascar e questiona se a história dessas meninas causará indignação semelhante à provocada no final do ano passado pelo vídeo do urso polar morrendo de fome.

https://www.nytimes.com/2018/01/19/opinion/sunday/climate-change-bangladesh.html

 

LEITURA ALTAMENTE RECOMENDÁVEL

De segunda a sexta, o ClimaInfo traz resumos das notícias que recomendamos para sua leitura. Abriremos aqui uma exceção para a entrevista de David Runciman, diretor do Departamento de Política e Relações Internacionais da Universidade de Cambridge. Uma das figuras mais badaladas do universo acadêmico britânico, Runciman destacou-se por oferecer, em linguagem simples, acessível e lúcida, reflexões originais sobre a política pós-1989. Para ele, a mudança do clima é a questão política definidora do nosso tempo. Na entrevista, ele faz ótimos comentários sobre a diferença entre o cético e o cínico climático, sobre o risco de deixarmos que os fatos falem por si e sobre porque não devemos confiar no mercado e na inovação para resolver o problema. A conversa vai além e envereda pelos riscos à democracia, incluindo os colocados pelo Facebook. Em resumo: leitura obrigatória, imperdível e impossível de ser resumida.

http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2018/01/1951709-estamos-assistindo-ao-fim-do-estado-moderno-diz-professor-de-cambridge.shtml

 

QUE DIFERENÇA HÁ ENTRE 1,5°C E 2,0°C DE AQUECIMENTO GLOBAL? É SÓ MEIO GRAU…

É uma pergunta honesta: esse meio grau entre 1,5 e 2 faz muita diferença? Faz. Pesquisadores europeus rodaram modelos climáticos para apontar as principais diferenças. Lembrando que são os melhores modelos disponíveis, mas que, para esse tipo de pergunta, as respostas são indicativas, não preditivas. O trabalho focou nos impactos na Europa, muito mais do que no resto do mundo.

– Sob 2oC de aquecimento, as ondas de calor duram 36% mais tempo do que sob 1,5oC.

– Com 1,5°C a disponibilidade de água fresca cai 9%, enquanto que, com 2°C, ela cai 17%.

– A intensidade de tempestades aumenta 40% no cenário 2oC em relação ao de 1,5oC.

– Sob 1,5oC, a produção mundial de trigo cai 9%, ao passo que sob 2oC, cai 16%; a queda para o milho é de 3% sob 1,5oC e 6% em 2oC.

– O nível do mar sobe 25% à mais sob 2°C do que sob 1,5oC.

https://www.carbonbrief.org/guest-post-what-can-climate-models-tell-about-impacts-onepointfive-two-degrees

https://www.indy100.com/article/2-degrees-global-warming-much-worse-than-15-inforgaphic-proof-paris-climate-agreement-8170756

 

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