ClimaInfo, 02 de abril 2018

ClimaInfo mudanças climáticas

BRASIL BLOQUEIA REDUÇÃO DAS EMISSÕES DA NAVEGAÇÃO MARÍTIMA

O governo brasileiro se juntou à Arábia Saudita, à Índia, ao Panamá e à Argentina para bloquear o estabelecimento de metas de redução das emissões de gases de efeito estufa para a navegação marítima internacional na IMO (sigla em inglês da Organização Marítima Internacional), órgão da ONU que tenta estabelecer normas para a navegação internacional. O setor está sob pressão faz já um certo tempo para a adoção de medidas de redução destas suas emissões, coisa que o setor vem protelando desde o começo do século. Depois do Acordo de Paris, a pressão aumentou e, sob a liderança da União Europeia, vários governos sugeriram a adoção de metas de redução destas emissões. Mas a proposta enfrenta a resistência de dois blocos de países. De um lado, os vendedores de commodities que ficam longe do grande mercado da China, porque suas rotas são mais longas e os limites de emissão aumentariam os preços das commodities. Estão nesse bloco o Brasil e a Argentina (aliás, os negociadores brasileiros contam com o suporte técnico da insuspeita Vale do Rio Doce, uma das que perderiam espaço se o frete ficar mais caro). Outro bloco é o dos países que alugam sua bandeira para os armadores, como o Panamá, a Libéria e a Costa do Marfim. Fretes mais caros implicam queda de suas receitas. Como a navegação não entrou na NDC de país algum, estes governos fazem o que podem para ajudar empresas como a Vale.

E dane-se o clima.

http://www.bbc.com/news/science-environment-43584963

 

BNDES FACILITA PARA HIDRELÉTRICAS E MUDA O FINANCIAMENTO DA GERAÇÃO

Com três passos atrás, o BNDES, de Paulo Rabello de Castro, volta a dar dinheiro do contribuinte para projetos de grandes hidrelétricas. A gestão anterior, de Maria Sílvia, tinha reduzido o volume financiável,  aumentado o spread e reduzido os prazos. A uma semana do primeiro leilão do ano, o Banco voltou a oferecer o financiamento de 80% do valor total dos projetos e um prazo de 24 anos para a quitação da dívida. E mais, reduziu o spread. Ainda por cima, as novas regras passaram a incluir projetos voltados para o mercado livre, quando, até então, os empréstimos eram limitados à parte da energia vendida no mercado regulado. Pelo menos a taxa básica atual, a TLP, anda muito perto da Selic, diferentemente da sua antecessora, a TJLP, que quase sempre ficava alguns pontos abaixo. Isto indica, pelo menos teoricamente, que o subsídio a projetos hidrelétricos diminuiu ou até deixou de existir.

https://www.canalenergia.com.br/noticias/53056275/bndes-muda-regras-de-financiamento-do-setor-eletrico

http://www.valor.com.br/brasil/5416609/bndes-amplia-prazos-e-valores-e-corta-o-spread-no-financiamento-para-energia#

 

SOBRE O LEILÃO ANP DA SEMANA PASSADA

Na 6a feira, aconteceu mais um leilão de áreas para exploração de petróleo e gás. Do nosso ponto de vista, três pontos merecem ser destacados:

1- Foi a primeira vez que a sociedade civil conseguiu abrir espaço oficial para se posicionar: o pessoal da 350.org subiu ao palco e pediu para que os fósseis permaneçam enterrados por mais alguns milhões de anos para que o aquecimento global não seja aumentado. Desta vez não houve conflito com seguranças.

2- Não foram feitas propostas para as áreas em terra, nas bacias do Parnaíba e do Paraná, onde dizem haver muito gás natural. Se o gás natural é tido como o combustível fóssil de transição para a tal economia de baixas emissões, o desinteresse pode ser um sinal um tanto ruim.

3- No dia anterior, o TCU retirou duas áreas do leilão, exatamente as duas áreas mais valiosas. Os auditores querem entender se o país ganharia mais no modelo de negócio deste leilão, ou se seria melhor esperar um próximo, com um outro modelo. A ver nesta semana o que acontece.

Em todo caso, analistas do mercado fóssil consideraram positivo o resultado do leilão, já que o governo conseguiu um bônus de R$ 8 bilhões, mais do que esperavam.

Em tempo 1: vale deixar anotada uma frase sobre o fracking no país, cometida por um dos respeitados analistas, Pedro Zalan: “Ninguém faz fracking em shale gas no Brasil. Nunca fez, não faz e nem pretende fazer. Não há nem sentido geológico em se pensar neste assunto no Brasil”.

Em tempo 2: a ANP parece discordar do respeitado analista (veja no último link desta nota)

https://350.org/pt/fracasso-de-leilao-terrestre-e-vitoria-da-sociedade/

http://epbr.com.br/o-sucesso-da-15a-rodada-e-o-preocupante-sinal-para-onshore-por-pedro-zalan

http://epbr.com.br/quem-vai-pagar-os-investimentos-feitos-pela-petrobras-e-pelas-outras-varias-companhias

https://www.platts.com/latest-news/oil/riodejaneiro/brazil-plans-to-test-unconventional-oil-natural-26764858  

 

DUAS VEZES MAIS EÓLICAS EM 10 ANOS NO BRASIL

Uma das importantes consultorias especializadas em energia, a Make, projeta que, em 10 anos, a capacidade eólica instalada dobrará, o que acrescentaria mais 65 GW até 2027, um aumento de 4% ao ano. A Make inclui eólicas terrestres e offshore, ainda inéditas em escala no país. Só que esse cenário, assim como outros até mais otimistas, dependem dos outros países manterem ou acelerarem suas expansões. Se o volume de vendas continuar crescente no mundo, o preço das torres eólicas continuará a cair e a energia gerada ficará cada vez mais competitiva frente ao gás natural. Especialmente para o Brasil, interessa que a expansão das eólicas na América do Sul continue a crescer no ritmo atual.

Por falar em renováveis, no último trimestre do ano passado, as eólicas e fotovoltaicas inglesas geraram, pela primeira vez, mais energia do que as oito plantas nucleares de sua majestade. Só as térmicas a gás geraram mais, aliás, quase o dobro das renováveis.

https://www.canalenergia.com.br/noticias/53056032/capacidade-de-geracao-eolica-dobrara-em-10-anos-aponta-consultoria-make

https://www.theguardian.com/business/2018/mar/29/wind-and-solar-made-more-electricity-than-nuclear-for-first-time-in-uk

 

SISTEMA AVALIA VULNERABILIDADE CLIMÁTICA NO PAÍS

Um sistema de monitoramento das vulnerabilidades climáticas no Brasil foi oficialmente lançado na semana passada. O SisVuClima, desenvolvido pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), incorpora um modelo de análise da vulnerabilidade dos municípios em relação aos impactos da mudança climática global. O sistema abrange os municípios de seis estados: Paraná, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Maranhão e Amazonas. Segundo sua descrição, foram analisados “os eventos extremos esperados em cada município e como a região está estruturada para lidar com ele (sic). Com essas informações, o gestor terá um instrumento para nortear suas ações e um critério quantitativo para dar prioridade às estratégias de atuação”.

http://www.mma.gov.br/index.php/comunicacao/agencia-informma?view=blog&id=2917&tmpl=component&print=1

http://sisvuclima.mma.gov.br/sobre/

 

AS REDES INTERLIGADAS DA CORRUPÇÃO

Essa nota não tem ligação direta com o clima físico. Mas o clima político fica mais fácil de entender a partir de um trabalho publicado no começo do ano no Journal of Complex Networks. Luiz Alves e grupo pegaram os mais importantes processos de corrupção ocorridos entre a redemocratização, entre 1987 e 2014 e montou um mapa de relacionamentos entre estes a partir das pessoas envolvidas. A figura é genial e mostra uma teia de corrupção que, no fundo, envenena e sufoca o país. Não deu para incluir o que veio após 2014, quando a Lava Jato ainda engatinhava.

https://arxiv.org/pdf/1801.01869.pdf

https://brasil.elpais.com/brasil/2018/03/28/politica/1522247105_599766.html

 

NEGÓCIO DE PETRÓLEO TEM POUCO FUTURO

Aos poucos as petroleiras vão admitindo que seu negócio não têm muito futuro e, junto com o mercado financeiro, começam a enxergar, cada vez mais perto, o dia em que a demanda por petróleo começará a cair. No começo do ano, o Bank of America disse que a entrada dos carros elétricos fará este pico acontecer por volta de 2030. Em seguida, a agência de rating Fitch disse que o pico ocorrerá antes de 2030. Logo depois, a BP disse que a demanda não vai nem crescer nem cair nos próximos 20 anos e, na semana passada, a Shell disse que o pico deve acontecer pouco depois de 2030, e que a demanda deve despencar em 90% até algum dia na 2a metade do século. Dois dos problemas destas visões é que se centram no carro como o grande consumidor de petróleo, e que as petroleiras mais moderninhas dizem que o gás natural é um fóssil quase limpo. Só que nem o carro é único transporte consumidor de combustíveis fósseis, nem o gás natural é limpo. Por enquanto, os cenários das petroleiras parece mais uma cortina de fumaça fóssil do que o começo de novos planos de negócio para estas megacorporações.

Por falar em Shell, Greg Muttitt desmontou no Price of Oil muita da fumaça que a empresa soltou com seu recente relatório Sky. Greg mostra que as contas da empresa deixam o mundo muito longe dos 2oC visados pelo Acordo de Paris. Ou, dito de outra forma, para que exista uma chance de 66% do aquecimento global ficar dentro deste limite, alguém terá que descobrir um jeito de remover uma quantidade brutal de CO2 da atmosfera. O que Greg acha bem difícil acontecer.

https://www-vice-com.cdn.ampproject.org/c/s/www.vice.com/amp/en_us/article/43bx5n/oil-companies-should-worry-about-peak-oil-demand

http://priceofoil.org/2018/03/28/shell-game-oil-company-says-climate-future-is-fossil-fuelled/

 

GREENPEACE ROMPE COM O FSC, A MAIS CONHECIDA CERTIFICAÇÃO FLORESTAL

O Greenpeace decidiu sair do Forest Stewardship Council (FSC), a mais conhecida das certificações de produtos sustentáveis da floresta, cujo selo aparece em várias embalagens de produtos de madeira, papel e papelão. Segundo o Greenpeace, o FSC anda falhando em “regiões de alto risco, onde as instituições democráticas e da sociedade civil são fracas e onde o nível de corrupção é alto”. Também disse que há nos métodos do FSC uma certa falta de transparência, exemplificada pela não publicação de mapas digitalizados com a localização das florestas certificadas. O FSC comunicou que está desenvolvendo ferramentas digitais para aumentar a credibilidade de suas certificações.

https://www.washingtonpost.com/world/asia_pacific/greenpeace-leaves-sustainable-wood-certification-group/2018/03/27/aa6c0a4e-3184-11e8-b6bd-0084a1666987_story.html

NORTE-AMERICANOS NÃO ACHAM A MUDANÇA DO CLIMA UMA AMEAÇA SÉRIA, E AUSTRALIANOS NÃO QUEREM MAIS CARVÃO

Uma pesquisa da Gallup apontou que diminuiu o número de republicanos que acredita que há um consenso científico acerca da mudança do clima, que seus efeitos já começaram e que a principal causa é a humanidade. Um terço dos republicanos acha que todo esse alarde sobre o clima é um exagero. No ano passado, mais da metade dos entrevistados republicanos achava que a mudança do clima é real. Agora são só 42%. Do outro lado do ringue, aumentou a quantidade de democratas que entende que os efeitos já estão aí e que o clima será uma ameaça muito séria ao longo de suas vidas. Como vários cientistas e políticos disseram ao longo do ano passado, a mudança do clima não está em votação.

Do outro lado do mundo, outra pesquisa revelou que a maioria dos australianos querem se livrar do carvão, inclusive os que apoiam a ala mais conservadora da Coalizão de centro-direita atualmente no governo. 60% dos pesquisados apoia os esforços para deletar o carvão da matriz energética até 2030.

http://news.gallup.com/poll/231530/global-warming-concern-steady-despite-partisan-shifts.aspx

https://www.washingtonpost.com/news/energy-environment/wp/2018/03/28/partisan-split-on-climate-grows-even-as-u-s-fears-are-on-the-rise-poll-finds

https://www.theguardian.com/australia-news/2018/mar/29/majority-of-australians-support-phasing-out-coal-power-by-2030-survey-finds

 

DESERTO LOTADO DE VOLKSWAGENS

Por conta do escândalo ‘dieselgate’, no qual a empresa foi pega trapaceando nas medições de poluentes dos seus carros a diesel, a VW-EUA recomprou centenas de milhares de automóveis que havia colocado naquele mercado. Mais de 300 mil destes carros estão hoje estacionados em 37 áreas que a empresa teve que comprar ou arrendar para este fim. Uma foto divulgada pela Reuters é impressionante. Em uma destas áreas, no deserto perto de Los Angeles, tem cerca de 21 mil carros estacionados. A Volks já teve que desembolsar mais de US$ 3 bilhões só para acertar os motores desses carros e de compradores que quiseram ficar com eles.

Em tempo: uma porta-voz da VW disse que “esses veículos estão sendo armazenados em uma base provisória e rotineiramente mantidos de forma a garantir sua operabilidade e qualidade a longo prazo, para que possam ser devolvidos ao comércio ou exportados quando os reguladores dos EUA aprovarem as modificações de emissões apropriadas”.

https://www.reuters.com/article/us-volkswagen-emissions-storage/vw-storing-around-300000-diesels-at-37-facilities-around-u-s-idUSKBN1H50GQ

https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2018/03/deserto-vira-cemiterio-de-veiculos-da-volkswagen.shtml

https://g1.globo.com/carros/noticia/escandalo-do-diesel-faz-volkswagen-guardar-mais-de-300-mil-carros-recomprados-nos-eua.ghtml

 

O DESERTO DO SAARA ESTÁ SE EXPANDINDO

Um estudo que acaba de sair, e que é o primeiro a examinar a extensão do Saara numa escala de tempo de um século, mostrou que o deserto cresceu pelo menos 10% desde 1920, em parte por conta da mudança do clima. Desertos são regiões onde chove pouco, e este pouco depende de uma série de fenômenos naturais, em destaque a Oscilação Multidecadal do Atlântico e a Decenal do Pacífico. A primeira tem um período de entre 50 a 70 anos e, na sua fase fria, está correlacionada com pouca chuva ao sul do Saara. A do Pacífico corresponde a temperaturas variando num período de 40 a 60 anos. Para atribuir a expansão do deserto à mudança do clima, os pesquisadores removeram as duas oscilações da modelagem estatística e ficaram, basicamente, com os efeitos diretos da mudança do clima. Concluíram, assim, que mais de 60% da expansão do deserto se deve à mudança do clima. O trabalho também sugere que outros desertos mundo afora podem estar também crescendo.

https://journals.ametsoc.org/doi/10.1175/JCLI-D-17-0187.1

https://www.sciencedaily.com/releases/2018/03/180329141035.htm

 

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