ClimaInfo, 26 de novembro de 2018

ClimaInfo mudanças climáticas

Desmatamento cresce 14% no último ano

O desmatamento da Amazônia voltou a crescer: quase 8.000 km2 de floresta foram derrubados no bioma entre agosto de 2017 e julho de 2018, um aumento de 13,7% em relação ao mesmo período anterior. Os dados são da prévia das medições feitas pelo satélite Prodes divulgada pelo INPE e o MMA. A área total desmatada é maior do que a soma das áreas dos 39 municípios da região metropolitana de São Paulo. A rede de ONGs Observatório do Clima (OC) culpa o clima político: um governo Temer sem nenhum apetite para conter a banda retrógrada do agronegócio e os sinais de “liberou geral” na gestão florestal dados pelo então candidato Bolsonaro. Deve-se reconhecer, entretanto que, historicamente, o desmatamento aumenta em anos de eleições gerais porque os governos estaduais evitam desagradar os eleitores enviando as polícias estaduais para o acompanhamento das operações de fiscalização. A expectativa do OC e de outros observadores é que o desmatamento aumente muito ainda antes de voltar a ser contido. A área de desmatamento legal, onde há autorização para a supressão da vegetação, foi de 1.115 km2. Ou seja, mais de 6.700 km2 do desmatamento são, simplesmente, ilegais, uma área equivalente à da região metropolitana do Rio de Janeiro. Vale lembrar que o Estado brasileiro se comprometeu a zerar o desmatamento ilegal até 2030, mas a tendência detectada é oposta ao compromisso. A Folha, o Estadão e o jornal inglês The Guardian divulgaram para o mundo mais este papelão brasileiro.

 

Cientista brasileiro alerta contra o desmatamento e o desafio da redução das emissões globais

Paulo Artaxo, pesquisador do Instituto de Física da USP e membro do IPCC é um dos físicos brasileiros de maior reconhecimento internacional. Em um artigo divulgado pelo Project Syndicate, ele colocou toda a sua preocupação com o desmatamento da Amazônia frente ao que tem sido dito pelos membros do futuro governo Bolsonaro, inclusive pelo próprio: “No momento em que o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas alerta para o fato de precisarmos fazer progressos urgentes na redução das emissões de gases de efeito estufa, os planos de Bolsonaro alcançarão exatamente o oposto. Infelizmente para o Brasil, e para o resto do mundo, não há razão para acreditar que ele não possa ou não queira implementá-los.”

Artaxo também deu uma entrevista para o boletim da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura sobre o alerta dado pelo Relatório Especial 1,5oC do IPCC: o mundo precisa reduzir drasticamente suas emissões até 2040 e, depois disso, remover dióxido de carbono da atmosfera em quantidades inéditas. Ele conta que a ciência dispõe do conhecimento para dar conta do recado. “O grande problema são as decisões políticas que têm que ser feitas pelos nossos governos, de maneira a garantir a sustentabilidade da economia do planeta como um todo nas próximas décadas.” E não só os governos individualmente, mas, visto que a ação terá que ser coletiva e em consonância com diretivas globais. “Estamos extremamente atrasados na governança porque a ONU não foi estruturada para tratar de problemas destas dimensões e não há nenhum organismo internacional com a competência e o mandato necessários para lidar com uma questão tão complexa como as mudanças climáticas globais.”

 

O clima mudou, mas parte do futuro governo não acredita

Denis Burgierman, comentando no Nexo os incêndios da Califórnia e as enchentes das Alagoas, constata que os eventos extremos já estão vindo em bando. Sobre a Califórnia, ele fala da intensidade dos dois incêndios que, ocorrendo a centenas de quilômetros um do outro, obrigaram as equipes de combate a se dividir, tendo, portanto, sua efetividade reduzida. À diferença de outros incêndios, um deles já é considerado o pior da história em perda de vidas e propriedades e, também, pela devastação provocada sobre a floresta: “são centenas de quilômetros quadrados onde não restou coisa alguma que não se pareça com a fuligem no fundo de uma lareira”. De lá, Burgierman pula para as Alagoas, onde três dias de chuva anormal encharcaram de tal modo o solo que a chuva do quarto dia “escorreu serra abaixo, com uma força que ninguém imaginava ser possível. Duas horas depois dos moradores notarem o nível do rio subir, a água já cobria as casas (…) em cidades como a pernambucana Palmares, um bairro inteiro foi literalmente demolido. Andando por lá depois que a água desceu, a sensação não era de que tinha havido uma mera inundação – parecia uma ruína de guerra.”

Denis é mais um que se mostra preocupado com os sinais dados pelo futuro governo. Falando sobre a indicação do ministro das relações exteriores e do que este escreveu sobre a mudança do clima, ele se pergunta como uma pessoa inteligente e conhecedora do mundo pode achar que o aquecimento global é um complô chinês. “Talvez Araújo realmente acredite nessas pataquadas (…) e quem disse que gente inteligente não acredita em mentiras? Não fica paranoica? Se tem uma coisa que eu aprendi sobre a humanidade é nossa capacidade quase infinita de acreditar em ficção. Ainda mais quando ela nos dispensa de encarar o fogo.”

 

Empresários, povos indígenas e governos discutem alternativas limpas para ofertar energia para Roraima

Na semana passada uma reunião em Roraima discutiu a possibilidade da geração renovável suprir a demanda do estado. Vale destacar que estiveram presentes representantes do comércio, do agronegócio, das comunidades indígenas e gente dos governos do estado e federal. Para embasar as discussões, foram feitas palestras sobre eólicas, fotovoltaicas e o armazenamento em baterias. A reunião foi organizada pelo Instituto Socioambiental (ISA), pelo Instituto Clima e Sociedade (iCS) e pela Fundação Mott. Roraima é o último estado ainda desconectado do Sistema Integrado Nacional e vem sofrendo apagões frequentes. Explorar o potencial de solar e eólica certamente ajudará a normalizar a situação.

 

Ausência de planejamento logístico pode ter impacto climático

A equipe de transição de Paulo Guedes está listando as estatais a serem fechadas ou privatizadas. Em meio às muitas especulações, o Correio Braziliense reportou ontem que a Empresa de Planejamento de Logística (EPL) estaria entre as primeiras da lista. A EPL tem por missão ordenar a expansão de estradas, ferrovias e portos, e é o único pedaço do governo que tem uma visão de longo prazo para o transporte de carga.

Na semana passada, o SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa) mostrou que, nos últimos cinco anos, o transporte de carga vem sendo responsável por 25% das emissões da queima de todos os combustíveis, isto é, 5% do total das emissões nacionais. Abrir mão do pensamento sobre este setor estratégico é aumentar os riscos de aumento destas emissões e de mais greves de caminhoneiros, como a de maio deste ano.

 

Fórum Estadão discute a sustentabilidade do agronegócio

No Fórum Estadão Agronegócio Sustentável da semana passada, mais uma vez mostrou-se presente a dupla imagem projetada pelo setor: de um lado, a de agro-pop-tech, e do outro a de desmatador/envenenador. Sendo que esta última apareceu como queixa quanto à incompreensão por parte do público. Foi dito e repetido que “é preciso melhorar a imagem dos defensivos agrícolas” e que o “Brasil é competitivo e isso incomoda”. Repetiu-se o mantra segundo o qual ninguém protege mais a natureza do que o produtor rural brasileiro, como se o desmatamento que voltou a crescer na Amazônia e no Cerrado e a contaminação de corpos d’água com a química do agronegócio acontecessem em outro planeta. Falou-se dos avanços tecnológicos do setor – se bem que este ainda tem pouca repercussão na agricultura familiar, aquela que produz 70% da comida do brasileiro – da recuperação de pastagens e da crescente presença das fontes renováveis de energia. Vale a pena destacar que uma das mesas discutiu o tema “Brasil perderá ‘peso’ no exterior se deixar acordo de clima”.

 

EUA: relatório oficial mostra o tamanho do desafio climático

Na semana passada, 16 agências norte-americanas publicaram a 4a Avaliação Climática Nacional, aparentemente sem que o governo Trump interferisse no seu conteúdo. O trabalho é contundente: “Sem esforços globais substanciais e ininterruptos de mitigação e esforços regionais de adaptação, prevê-se que a mudança do clima provoque perdas crescentes à infraestrutura e às propriedades americanas e que impeça o crescimento econômico ao longo deste século. A mudança do clima afeta os sistemas naturais, os construídos pelo homem e os sociais (…) Esses sistemas interconectados estão ficando cada vez mais vulneráveis a impactos em cascata que são, frequentemente, difíceis de prever, ameaçando serviços essenciais dentro e além das fronteiras nacionais.” O relatório indica, portanto, que o país  precisa tomar ações rápidas e decisivas para mitigar as emissões e agir junto aos outros países para o mesmo objetivo. O relatório aponta três medidas essenciais que precisam ser tomadas o quanto antes: colocar um preço nas emissões, definir e fazer cumprir metas de emissões através de toda a economia e alocar mais recursos para as fontes limpas de energia. Folha e Estadão escreveram sobre o relatório.

 

Relatório da Comunidade Europeia levanta os impactos climáticos sobre um continente mais quente

O corpo científico da Comunidade Europeia publicou um relatório sobre os impactos climáticos que podem advir sobre o bloco. O trabalho mostra que, num cenário de aumento da temperatura global em 3oC:

– haverá mais de 130.000 mortes todo ano por conta de ondas de calor extremas;

– em alguns países, a produtividade do trabalho cairá de 10% a 15%; e

– enchentes costeiras, por conta da elevação do nível do mar, causarão cinco vezes mais danos, afetando 2 milhões de pessoas e gerando perdas de cerca de €60 bilhões por ano,

O relatório também diz que, se o mundo limitar o aquecimento global a 2oC ou menos, em linha com o definido em Paris, ao invés dos 2 milhões de afetados, serão menos de 500 mil. E as perdas anuais de €60 bilhões cairiam para €6 bilhões.

 

Preço do petróleo cai para menos de US$ 60 pela primeira vez em quase 2 anos

Para a Oil Price, a ação combinada entre Trump e a Arábia Saudita está puxando o preço do barril de petróleo para baixo. O “sócios” da OPEP queriam que os sauditas fechassem a torneira dos seus poços para segurar o preço acima de US$ 70, onde esteve durante boa parte do ano. Trump quer reduzir o impacto sobre o bolso de seus eleitores e o príncipe regente saudita, Mohammad bin Salman, quer evitar ser acusado da morte de um jornalista. Barril mais barato, em tese, vende mais e aquece o planeta.

 

Ciência desvenda as ondas de frio do hemisfério norte

Na semana passada, no meio de uma onda de frio extrema no nordeste dos EUA, Trump voltou a tuitar querendo mais aquecimento global. Não devia. Um trabalho recém publicado na Nature diz que na lista dos eventos extremos dinamizados pelo aquecimento global estão ondas ainda mais geladas varrendo o hemisfério norte. Um dos principais impulsionadores das ondas de frio é o Vórtice Polar Estratosférico, uma faixa de ventos rápidos girando a 30 km acima da superfície. Segundo Marlene Kretschmer, do Potsdam Institute for Climate Impact Research e uma das autoras do trabalho, existem duas maneiras pelas quais o Vórtice afeta o tempo no inverno. Se, durante o restante do ano, os ventos normalmente circulam o planeta a alturas relativamente constantes, no inverno, eles também oscilam verticalmente. O que os pesquisadores descobriram é que Vórtice pode absorver esses ventos causando uma onda de frio na Europa, ou refletí-los mandando temperaturas muito baixas para a América do Norte. O trabalho indica que o aquecimento global está afetando a dinâmica do Vórtice que absorve ou reflete os ventos planetários. Um Vórtice fraco, segundo os pesquisadores, está por trás dessa onda de frio extremo que virou piada para Trump.

 

Para assistir – webinar

Implantando a abordagem jurisdicional para produção sustentável no Mato Grosso e no Pará

Durante o seminário será apresentada e debatida a ferramenta Territórios de Produção Sustentável, com comentários de Luis Fernando Guedes Pinto (Imaflora), Maurício Voivodic (WWF) e Fabíola Zerbini (TFA)

Amanhã, 27/11, das 10h – 12h
Inscrições aqui.

 

Para ler

Climate change, markets and marxism

Adair Turner escreveu para o Project Syndicate um artigo curto e incisivo a partir do agora famoso blog do ministro indicado por bolsonaro para as relações exteriores, Ernesto Araújo. Turner leva a sério a visão da mudança do clima como um complô globalista-marxista, e argumenta que uma economia de baixo carbono, na verdade, dinamiza a economia mundial. E defende que, para o enfrentamento da mudança do clima, um novo patamar de equilíbrio entre mercado e governo precisa ser alcançado.

Turner é ex-diretor da Autoridade de Serviços Financeiros do governo do Reino Unido, foi membro do Comitê de Política Financeira de lá e, atualmente, preside o Institute for New Economic Thinking.

 

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