ClimaInfo, 28 de novembro de 2018

ClimaInfo mudanças climáticas

Bolsonaro pede a retirada do Brasil da organização da COP-25

Bolsonaro admitiu ontem, em conversa com jornalistas, ter participado da decisão de desistência do Brasil da organização da COP-25: “Houve participação minha nessa decisão(…) eu recomendei [ao futuro ministro das relações internacionais] que evitasse a realização desse evento aqui no Brasil”.

A jornalista Daniela Chiaretti analisou sobriamente o assunto no Valor. Comentando a preocupação de Bolsonaro com a soberania sobre a Amazônia, escreveu que “a grilagem corre solta em terras públicas, a enorme quantidade de hectares não designados torna terra de ninguém o que é de todos, o garimpo ilegal enriquece alguns criminosos com minérios dos brasileiros. O Brasil não precisa de ninguém para perder a Amazônia. Fazemos isso sozinhos.”

Ontem, pela manhã, antes da declaração do futuro presidente, a Deutsche Welle falou com o presidente do Grupo da América Latina e Caribe (Grulac), o senador argentino Rodolfo Urtubey, que evitou associar Bolsonaro à desistência brasileira, mas disse que segue buscando realizar a COP-25 na região, “para mostrar que também temos esse compromisso com o desenvolvimento sustentável”, insinuando sutilmente que o Brasil abriu mão desse compromisso.

 

Sobre Bolsonaro, o cancelamento da COP-25 no Brasil e o ‘Triplo A’

O futuro presidente eleito mencionou mais uma vez o ‘triplo A’ ao responder, ontem, uma pergunta sobre a desistência da organização da COP-25 no Brasil em 2019. Mas afinal, por que esta obsessão com uma obscura ideia do ex-presidente colombiano Juan Manuel Santos que nunca chegou a ser levada a sério pelos governos Dilma e Temer? Uma busca na internet dá uma pista: Bolsonaro e sua entourage se mobilizam com blogueiros, de preferência de direita, e a ideia que propõe organizar um megacorredor de biodiversidade de 200 milhões de hectares protegendo partes da Amazônia na Colômbia, no Brasil e na Venezuela foi objeto de matérias em blogs ligados à direita como o Ambiente Inteiro, o SputinikNews e o Defesa Aérea e Naval, todas baseadas em um pensamento geopolítico um tanto delirante de um tal professor Rogério Maestri. Para ele, “esse tal corredor ecológico (…) não é um corredor, é uma verdadeira ocupação. É o germe de uma ocupação de uma parte do Brasil com o objetivo de isolá-lo do norte, do Caribe, e a América do Sul da parte norte”.

Segundo uma matéria de 2017 d’O Eco, a repercussão desta ideia, quando foi assumida pelo ex-presidente colombiano, fez com que o assunto chegasse à Dilma por vias não diplomáticas, o que azedou a possibilidade da então presidenta levar a sério a proposta. Ainda segundo O Eco, representantes do governo Temer até chegaram a conversar sobre a ideia com suas contrapartes latino-americanas, mas esta “não teria a possibilidade de sucesso da forma como [foi] colocada”. Portanto, o ‘triplo A’ não chegou a ser agenda dos fóruns latino-americanos e nunca foi levado como proposta ao Acordo de Paris. Aliás, a lógica do Acordo de Paris se baseia em promessas soberanamente feitas pelos estados nacionais que dele fazem parte, e a promessa brasileira, nossa NDC, sequer menciona a proteção destas áreas.

Em tempo: na conversa de ontem com jornalistas, Bolsonaro disse que “se isso (o Triplo A) for o contrapeso, nós, com toda certeza, (…) teremos uma posição que pode contrariar muita gente. Mas vai estar de acordo com o pensamento nacional. Então, eu não quero anunciar uma possível ruptura dentro do Brasil, além dos custos [pela realização da COP] que seriam, no meu entender bastante exagerados, tendo em vista o déficit que nós já temos no momento”.

 

Para caminhar em segurança até o outro lado do precipício

Tasso Azevedo faz uma análise das emissões brasileiras de 2017 que acabam de ser publicadas pelo SEEG. Diz que as emissões ficaram estáveis porque, se, de um lado, aumentaram por conta da queima de combustíveis fósseis e do desmatamento do Cerrado, de outro, caíram por conta da redução do desmatamento da Amazônia em 12%. Tasso lembra que o agronegócio perde duas vezes com o desmatamento: pela mudança global do clima tender a reduzir as chuvas no Cerrado brasileiro, onde se concentra o setor agroexportador, e pelo reforço desta tendência no Centro-Oeste e no Sudeste, devido à redução da floresta Amazônica. O agronegócio é responsável pelo desmatamento do Cerrado, e tem se expandido sobre as áreas desmatadas da Amazônia. Tasso junta os pontos, olhando pelo lado cheio do copo: “mas é justamente essa particularidade, a relação entre desmatamento e as emissões do agronegócio, que pode nos levar em segurança ao outro lado do precipício. O Brasil tem tecnologia de ponta para a chamada agricultura de baixo carbono. É possível produzir mais sem a necessidade de derrubar tantas árvores. Reduzindo ao máximo o desmatamento e usando mais racionalmente as terras reservadas para a lavoura, podemos diminuir pela metade as emissões no setor, em menos de quatro anos. Seria bom para a nossa economia e para o clima do planeta.”

 

Com dez anos de atraso, o padrão Euro-6 de emissões de motores diesel passará a valer por aqui

O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) finalmente publicou a resolução com o novo padrão de emissão de gases poluentes e de ruído para veículos pesados novos de uso rodoviário que valerá a partir de 2023. O novo padrão, chamado de P8, acompanha o Euro-6 adotado na Europa em 2014. Não há justificativa para mais essa procrastinação, posto que vários fabricantes já produzem aqui motores compatíveis com o padrão Euro-6. Mas as montadoras fizeram muita pressão e, agora, terão mais 4 anos para aproveitar as velhas linhas de montagem. Lembrando que quando Collor abriu o mercado para os importados, houve dois movimentos simultâneos: novas linhas de montagem mais modernas em novas fábricas e o aumento da pressão corporativista para fechar o mercado outra vez. Sinais como o dado pela procrastinação da adoção do Euro-6 e por programas como o Rota 2030 mostram que o segundo movimento ganhou.

 

O Brasil continua entre os dez países mais desiguais no mundo

A Oxfam publicou um relatório mostrando que a desigualdade de renda parou de cair pela primeira vez em 15 anos. Somos o nono país mais desigual do mundo. A causa principal, segundo a Oxfam, é a crise econômica que fez crescer o desemprego e reduzir o poder de compra das famílias. O Deutsche Welle comentou o relatório.

Em tempo: a mudança do clima atinge mais os pobres, as mulheres e as crianças. Sociedades mais iguais estão mais protegidas.

 

O benefício compensa o custo de zerar as emissões europeias até 2050

Ontem, falamos que a Comunidade Europeia anunciou a intenção de zerar suas emissões líquidas até 2050. Artigos do El País e do Euractiv analisam as propostas e, principalmente, os ganhos que a sociedade europeia terá se o objetivo for alcançado. As novas metas buscam se alinhar com o objetivo de manutenção do aquecimento global em 2oC, o que não seria obtido se as atuais metas fossem mantidas; estas buscam reduzir em 60% das emissões até o meio do século, o que é avaliado como insuficiente. A segunda motivação são os custos que serão gerados se tudo continuar como está. Se nada for feito, a economia perde dois pontos percentuais de crescimento, e terá que arcar com prejuízos de bilhões de euros causados por inundações, ondas de calor e secas. Neste cenário ‘tudo como está’, o número de mortes prematuras seria 66% maior, o que representaria um custo social adicional de € 200 bilhões. No final das contas, os ganhos superam em muito o custo efetivo da transição para a emissão zero. O Financial Times preferiu dar mais destaque para este última constatação.

 

França cria conselho para a ação climática e divulga sua estratégia para alcançar a emissão zero em 2050

O presidente francês, Emmanuel Macron, anunciou a criação do Alto Conselho para a Ação Climática, com o mandato de prover o governo de uma perspectiva independente sobre suas políticas de energia e clima. O Conselho também terá como missão produzir um relatório anual sobre a trajetória das emissões francesas frente à meta de descarbonização da economia até 2050 e fornecer recomendações. O think tank IDDRI enfatizou que a criação da Comissão não é uma resposta ao movimento dos “Coletes Amarelos”, que explodiu dias atrás. O movimento nasceu como oposição ao forte aumento no preço dos combustíveis baixado pelo governo, entre outras reformas econômicas que este pretende implantar.

A França também anunciou, um dia antes do anúncio da Comunidade Europeia, uma estratégia para descarbonizar sua economia até 2050. A meta foi traçada para ser compatível com a limitação do aquecimento global em 1,5oC. A estratégia prevê um conjunto de políticas desde as para a área fiscal até a obrigação de dar transparência às emissões embutidas nos produtos e nas empresas. E ainda avança, incluindo nesta obrigação os produtos importados. O governo francês reconheceu, no entanto, que é preciso avançar mais nos setores de transportes (vide “Coletes Amarelos”) e nas edificações. Também reconheceu que existem muitas incertezas, razão pela qual a estratégia será revista a cada 5 anos. Outra questão não muito bem detalhada no plano é o futuro das usinas nucleares francesas e o papel que estas terão na matriz elétrica em 2050.

A parte do plano referente à energia prevê, até 2030, triplicar a capacidade eólica do país, instalando mais 30 GW, e quintuplicar a capacidade fotovoltaica, instalando um pouco menos de 40 GW. A participação das renováveis passará a ser 40% da matriz energética.

 

O rio Reno seco obriga fechamento de grandes fábricas

A principal planta química da BASF fica em Ludwigshafen, às margens do Rio Reno. Ou melhor, do atual córrego Reno. Depois de anos de pouca chuva, as fortes ondas de calor deste verão na Europa agravaram a seca da bacia do rio. Poucos barcos ainda conseguem navegar pelas águas rasas, o que reduziu tanto o transporte de matérias-primas quanto o de produtos acabados. Assim, várias fábricas foram forçadas a reduzir a produção. A novidade é que, agora, a falta de água paralisou totalmente o funcionamento de várias plantas industriais, incluindo a da BASF.

 

Bem-vindos ao “Infernoceno”

Rob Jackson sugere mudar o nome do Antropoceno para Infernoceno: “Embora seja duro para mim, um cientista, dar um nome que soa mais como um gibi ou um filme de desastres ruim, é ainda mais duro assistir ao que está acontecendo sem levantar a voz. Os desastres do clima nos EUA custaram cerca de US$ 306 bilhões em 2017, quase US$ 100 bilhões a mais do que anteriormente. A mudança do clima não é uma ameaça abstrata para os nossos netos. Ela já chegou”.

 

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