Novo governo coloca em xeque a governança socioambiental

Os professores e pesquisadores Fabio Scarano, Cristina Adams, Mercedes Bustamante, Carlos Joly, Helder Queiroz e Cristiana Seixas escreveram um artigo forte e muito interessante no Direto da Ciência. Eles lembram que durante a ditadura militar o controle do meio ambiente era fortemente centralizado. Desde a redemocratização, o entendimento das complexas relações entre as várias escalas de ambiente, em um fluxo fechado que vai e volta do global ao local, quase que exigiu o surgimento de uma governança também complexa. Na medida em que o Estado não dá conta da rede de nuances e a sociedade civil demanda mais participação, este espaço passa a ser ocupado por organizações não governamentais, sem fins lucrativos. Os autores argumentam que essa atuação acaba se dando ao longo de duas frentes: “Uma, mais informativa, para apontar equívocos e denunciar maus procedimentos que afetam negativamente a relação dos seres humanos com a natureza. Outra, mais operacional, para gerar ou aplicar conhecimento na solução de problemas ambientais que, por vezes, fogem da competência ou dos meios de governos, de empresas, de atores das comunidades locais ou de indivíduos.”

A preocupação dos autores é com a visão que o novo governo tem dessas organizações e com os inflamados tuítes contra os sistemas multilaterais. “Os questionamentos recentes do atual governo brasileiro sobre a participação em acordos multilaterais não nos isolarão das consequências e dos custos dos danos ambientais, mas poderão nos isolar e enfraquecer as bases para a busca de soluções aos nossos problemas.”

Se levado à cabo, o enfraquecimento ou a exclusão das ONGs da vida nacional, “as consequências recaem, em primeiro lugar, sobre a população brasileira, sobretudo nos locais com menores índices de desenvolvimento humano (IDH). Em um país de dimensões continentais como o Brasil e que abriga realidades locais bem diversas, onde os olhos e os braços do governo muitas vezes não chegam, são as organizações da sociedade civil que atuam junto às comunidades. A redução da atuação da sociedade civil enfraquece essas comunidades e as suas populações. Tal retrocesso é carta branca para a sobre-exploração dos recursos naturais e o incentivo para atividades de degradação ambiental, com sérias consequências para a saúde e o bem-estar de milhões de cidadãos. Ignorar a responsabilidade socioambiental do Brasil não passará impune aos olhos dos brasileiros e da História.”