ClimaInfo, 22 de fevereiro de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Informações sobre a Amazônia são pouco transparentes

O Instituto Centro de Vida decidiu verificar se os dados públicos dos nove estados da Amazônia Legal estavam, de fato, disponíveis. Só ⅓ dos dados procurados estão disponíveis em sites estaduais e de órgãos públicos. E, dos pedidos feitos via Lei de Acesso à Informação, só metade foi respondida satisfatoriamente e dentro do prazo. A principal conclusão do relatório mostra “um nível baixo de transparência das informações ambientais, tanto na modalidade passiva (em que é feito um pedido para obter o dado) quanto na ativa (em que o dado já é disponibilizado em sites).” Uma das autoras do trabalho, Ana Paula Valdiones, do ICV, disse a’O Globo que “é a partir da transparência que você consegue fazer com que os órgãos tenham um acesso mais rápido às informações para se conseguir identificar e combater as práticas ilegais. É a partir dela que o setor privado consegue rastrear os seus conectores, que um frigorífico consegue saber se um gado que está comprando vem de área legal ou não. E a sociedade consegue entender quais práticas acontecem na Amazônia e quais são os impactos nos recursos naturais”.

 

O rato que ruge enfrenta o ultraliberalismo de Paulo Guedes

Pedro Cavalcanti e Renato Fragelli comentaram gentilmente, no Valor, falando sobre os equívocos conceituais e outros do novo governo. Para o governo, o globalismo “não seria apenas uma ideologia, mas um esquema de dominação global. O objetivo último seria impor valores esquerdistas, uma moral secular e ateia aos diferentes países, substituindo assim seus valores tradicionais.” Por ‘tradicionais’ entende-se principalmente os valores cristãos e (extremamente) conservadores. O grande exemplo desta visão é a guerra comercial que Trump, o São Jorge, trava contra o dragão chinês, razão pela qual os norte-americanos estão pagando mais caro pelos produtos que consomem. Por aqui, dada a disparidade de tamanho entre o Brasil e a China, este enfrentamento seria apenas o de um “rato que ruge”. Cavalcanti e Fragelli mostram que a batalha interna acontece entre a visão antiglobalista e nacionalista de parte do governo e a escola ultraliberal do ministro da economia. Uma das primeiras rusgas entre os dois grupos se deu em torno da tarifa de importação de leite em pó, que o ministro Guedes quis reduzir a pó, mas que o lobby ruralista o fez recuar. Os autores concluem o artigo com um quase-aviso: “Em anos recentes, o país sofreu muito com o populismo de esquerda. A irracionalidade de agora vem do populismo de direita. Além do potencial de causar sérios problemas em nossas relações exteriores e em outras áreas-chave, como educação e cultura, a tendência pode levar a impasses na economia, dificultando a aprovação das reformas de que tanto o país precisa.”

 

O doloroso aprendizado da governança ambiental

A tragédia provocada pela Union Carbide no ano de 1984 em Bhopal, Índia, gerou uma grande transformação nas práticas da indústria química global, e as tragédias provocadas pela Vale em Mariana e Brumadinho podem ser a Bhopal da indústria da mineração: CEOs das grandes companhias de mineração internacional se reunirão na próxima semana em Miami para definir medidas globais “decisivas e apropriadas” a fim de evitar a repetição destas tragédias. O Valor e o Estado de Minas comentaram a reunião.

Em tempo: enquanto isso, a elevação do grau de risco da barragem de Vargem Grande em Nova Lima, Minas Gerais, levou ao fechamento da rodovia BR-356, a principal ligação entre Belo Horizonte e Ouro Preto. Um trecho da rodovia ficará fechado por tempo indeterminado. Segundo a PM, em caso de rompimento, a lama chegaria à BR-356 em apenas quatro minutos.

 

A mudança no clima ameaça a segurança nacional como dizem as agências de inteligência dos EUA? Trump indica negacionista para responder

A Casa Branca está reunindo um painel para avaliar se as mudanças climáticas são uma ameaça à segurança nacional. O painel será presidido pelo notório cético do clima e professor de física aposentado, William Happer, informa o Washington Post, citando “documentos [que] obteve”. O jornal acrescenta que as agências federais já afirmaram a ameaça representada pela mudança climática “várias vezes desde que o presidente Trump tomou posse”. O New York Times cita um memorando da Casa Branca de 14 de fevereiro, informando que o painel será composto por 12 membros, incluindo Happer, que o jornal descreve como um “negacionista do clima” cujas opiniões são “claramente contrárias ao consenso científico estabelecido”. Happer sugeriu que níveis mais altos de CO2 seriam benéficos, observa o Guardian. Outros meios de comunicação cobriram a notícia, incluindo Reuters, Axios, DeSmog e Vox (esta última traz a notícia nas manchetes): “O escolhido por Trump para a presidência do novo painel climático já disse que o CO2 foi difamado como os ‘judeus sob Hitler'”.

Em tempo: o Independent relata que líderes militares, “dos EUA aos Países Baixos, (…) estão falando das mudanças climáticas” e da ameaça que estas representam à segurança.

 

Governo espanhol propõe investimentos de US$ 53 bilhões em plano de mudança climática

O governo socialista espanhol anunciou um plano de investimento público de 47 bilhões de euros para combater as mudanças climáticas ao longo de 10 anos. O plano, que seria parcialmente financiado pela emissão de títulos verdes (green bonds), visa tornar a Espanha neutra em emissões de carbono até 2050 e inclui propostas para compensar a perda de postos de trabalho nas indústrias poluentes. O investimento ajudará a reduzir a dependência de combustíveis fósseis importados, poupando 75 bilhões de euros em 10 anos. A Reuters descreve o plano como uma “declaração de intenções”, já que o governo enfrentará uma eleição geral neste abril.

 

Parlamento sul-africano aprova imposto sobre o carbono

A África do Sul introduzirá um imposto sobre o carbono no dia 1o de junho, depois da medida ter sido finalmente aprovada pelo Parlamento do país na 3a feira, noticiaram a Reuters e a Climate Home News. O imposto de carbono foi discutido pela primeira vez em 2010, conforme explicado no perfil detalhado da África do Sul publicado em 2018 pelo Carbon Brief. O novo imposto começará em 120 Rands (US$ 8,50) por tonelada de CO2, mas as permissões isentas de impostos cobrirão até 95% das emissões no primeiro período até 2022.

Ao mesmo tempo, o governo sul-africano socorrerá a empresa estatal de serviços públicos, a Eskom, com US$ 5 bilhões em três anos. A empresa está em crise, uma vez que as vendas de eletricidade estagnaram enquanto o custo do carvão – do qual obtém a maior parte da sua energia – aumentou acentuadamente e as suas novas centrais de carvão ultrapassaram seus orçamento, relata o Financial Times, que também aponta para “anos de má gestão corrupção e clientelismo”.

 

O futuro obscuro do carvão na Índia

A Reuters relata que há pouco futuro para o carvão, mesmo em países onde ele ainda é primordial, como na Índia, “simplesmente porque ele está ficando caro demais quando comparado às fontes limpas”. As projeções oficiais indicam que a demanda de eletricidade deve dobrar nos próximos anos e que o carvão seria o combustível mais competitivo. Mas este cenário está mudando pela queda acentuada no preço das eólicas e das fotovoltaicas, processo acentuado pelas mudanças que estão ocorrendo nos bancos e nos fundos de investimento que estão limpando seus portfólios da sujeira da poluição e do impacto climático do carvão. Empresas privadas estão desistindo de novas térmicas a carvão, sobrando só o governo indiano com interessado nelas. Um analista comentou a decisão recente da Glencore, que irá limitar sua produção, dizendo que “quando a maior exportadora do mundo limita sua produção é sinal de que o futuro é negro para essa coisa escura”.

 

Quais produtos de origem animal têm maior pegada ambiental?

Não é novidade que a carne bovina é o alimento com maior intensidade de emissões de carbono. Mas qual é o próximo item da lista? A pesquisadora Helen Harwatt, bolsista do Programa de Lei e Política Animal da Harvard Law School, pensava que seria a carne de galináceos, ou a de suínos. Mas ela se surpreendeu com os resultados de seus cálculos: depois da carne bovina, a classe de alimentos com maior emissão é a dos produtos lácteos. A produção de laticínios – incluindo leite, queijos, sorvetes e iogurtes – contribui com cerca de 3,5% das emissões globais de CO2 a cada ano. A pesquisa publicada no ano passado na revista Climate Policy se concentrou em investigar como políticas públicas podem incentivar o consumo de proteínas vegetais em substituição às animais. Helen diz que esta mudança teria “um impacto enorme”, mas reconhece não seria “prática para todos”. Ao invés disso, ela sugere que as pessoas procurem pelas coisas mais fáceis e práticas como, por exemplo, consumir leites alternativos de soja ou aveia, por exemplo. Em alguns nichos de mercado já se encontram leites e iogurtes feitos de ervilhas amarelas, e é relativamente fácil encontrar nos mercados das maiores capitais uma infinidade de substitutos vegetais aos queijos e sorvetes à base de leite. Outra possibilidade bastante fácil é a substituição de patês à base de queijo por molhos cremosos à base de grão-de-bico, como o hummus. O New York Times comentou a pesquisa.

 

Verão do hemisfério norte terá tempestades mais fortes e mais lentas

Pesquisadores do MIT (Massachusetts Institute of Technology) partiram de uma série de dados meteorológicos iniciada em 1979 para analisar as tempestades de verão em todo o mundo. Eles constataram um aumento de 13% na energia elétrica que alimenta estas tempestades. A pesquisa também mostrou que, enquanto a violência das tempestades aumentou, a velocidade de circulação destes enormes sistemas diminuiu. Assim, o futuro verá tempestades cada vez mais fortes, ficando cada vez mais tempo sobre os mesmos locais. Por outro lado, a disponibilidade de energia que alimenta os ciclones extratropicais vem diminuindo porque estes dependem da diferença de temperatura entre o Ártico e os Trópicos. Como o Ártico está aquecendo mais rapidamente do que o resto do mundo, a diferença de temperatura está diminuindo e, junto, a força dos ciclones. Como os ciclones extratropicais são um mecanismo importante para a dispersão das ondas de calor, resulta que estas também ficarão cada vez mais fortes. Os pesquisadores afirmam com todas as letras que estas mudanças derivam diretamente da mudança do clima. A Bloomberg e o Daily Mail fizeram matérias a respeito da pesquisa.

 

Para ler

The Uninhabitable Earth (A Terra Inabitável)

David Wallace-Wells descreve um mundo bem ruim de se viver. Calor suficiente para derrubar pessoas, pragas pré-históricas renascendo do derretimento do gelo da Sibéria e do norte do Canadá, um colapso econômico que faz as grandes recessões dos últimos 200 anos parecem fichinha. Segundo algumas resenhas, tem gente que não aguenta e fecha o livro. O autor não parece se importar muito. Lá pela centésima página, ele escreve: “Se você chegou neste ponto, você é um leitor corajoso”. Wallace-Wells não usa frases reconfortantes e, assim, destoa dos discursos quase sempre otimistas. Tem uma resenha no Grist.

 

Para ler

Como as indústrias do fumo e dos fósseis enganam o mundo

O DeSmog produziu um extenso relato sobre os paralelos entre as campanhas de desinformação da indústria do tabaco e da indústria fóssil. A investigação mostrou que, no fundo, o trabalho sujo é feito pelas mesmas organizações. A investigação encontrou 35 think tanks baseadas nos EUA, no Reino Unido, na Austrália e na Nova Zelândia que defendem os interesses tanto da indústria do fumo quando da fóssil. Para ser exato, 32 delas receberam doações diretas do fumo e 29 as receberam direto dos fósseis. Não chega a ser surpresa que algumas das redes formadas por essas organizações estão diretamente ligadas aos famigerados irmãos Koch. O trabalho do DeSmog aprofunda os fluxos de dinheiro e os métodos por trás das campanhas de desinformação, das mentiras e dos ataques à reputação de quem lhes desafia. Leitura recomendada para quem tiver interesse e estômago.

 

Para ler

20 anos do mercado brasileiro de energia elétrica

Há 20 anos, nascia a Administradora do Mercado Atacadista de Energia – Asmae e, junto com ela, o mercado brasileiro de energia elétrica. Com a crise do Apagão de 2001, a Asmae perdeu as duas primeiras letras e virou a MAE. Em 2004, engendrou-se um novo modelo do setor elétrico e a MAE virou CCEE, a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, que dura até os dias de hoje. Para contar esta história e, portanto, as transformações pelas quais passou o setor elétrico, a CCEE lançou, no último dia 7, um livro comemorativo dos 20 anos do mercado brasileiro de energia elétrica. Vinte e três especialistas foram convidados a contar os episódios decisivos dessa história. Leitura indicada para quem quer debater desafios e oportunidades para os próximos capítulos desta história. A versão digital do livro está disponível no site da CCEE.

 

Erramos: A nota de ontem sobre a pesquisa das estações de tratamento de efluentes deu a entender que o trabalho era recente. Não é. O trabalho é de 2005. Pedimos desculpas pela confusão e agradecemos a Sandra Nogueira pelo toque.

 

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