ClimaInfo, 19 de março de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Governo ameaça desmonte da estrutura do Conama

O ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, convocou para amanhã uma reunião extraordinária do Conselho Nacional do Meio Ambiente, responsável por muitas das normas ambientais do país. É possível que o Conama seja reestruturado e tenha reduzida a participação da sociedade civil. Daniel Melo Barreto, representante das ONGs Ambientalistas do Nordeste e membro suplente do Conselho, diz que “tudo indica que tenhamos um desmonte e, principalmente, uma redução da participação da sociedade civil dentro do Conselho, de algumas instituições como o Ministério de Minas e Energia, Controladoria-Geral da União, Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), Confederação Nacional do Transporte, apresentaram sugestões neste sentido. Destaca-se que são instituições e órgãos que estão mais preocupados como o viés econômico do que com o ambiental”. Centenas de entidades assinaram uma carta endereçada ao Ministério Público, à Defensoria Pública e a outras entidades fiscalizadoras pedindo atenção ao desenrolar da novela. Salles segue firme na intenção de priorizar os negócios ao meio ambiente.

 

Desenvolver a Amazônia é sinônimo de preservação ambiental

O governo, presidente e ministério, insiste que a defesa do meio ambiente é um obstáculo ao desenvolvimento do país e que o mundo dos negócios estaria bem melhor sem a legislação ambiental. No final de semana saíram dois artigos que provam o contrário – que o desenvolvimento do país se dá no território, no meio ambiente, e que a destruição do meio ambiente, sim, impede o desenvolvimento econômico e social de um país. Virgílio Viana, ex-Secretário de Meio Ambiente do Amazonas, explica que “afrouxar o licenciamento ambiental aumenta a margem de lucro das empresas, em função da redução dos custos. Porém, quando ocorre um desastre ambiental, o que há é uma socialização dos prejuízos, que são pagos pela sociedade como um todo”. Talvez Viana não tenha levado em consideração que os prejuízos que a Vale está contabilizando com a paralisação de operações – tanto em Brumadinho quanto em Mariana, sem falar no desgaste da marca – devem superar o custo de cuidar das barragens para que elas não desabem.

Felipe Biasoli da Universidade Federal Fluminense escreveu um belo artigo sobre a exploração sustentável da floresta amazônica ser a melhor alternativa para preservá-la e, ao mesmo tempo, promover a melhoria da qualidade de vida da população que ali vive. Ele contrapõe este caminho apontado pelo governo que prioriza os negócios em detrimento da floresta e de seus povos, assim como a tese de que é preciso colocar uma cerca e proibir qualquer atividade econômica na região. Biasoli escreve que “as duas visões anteriores, tidas como inimigas mortais, são irmãs siamesas no que mais importa: ambas sofrem da falta de respostas práticas e imediatas para a melhoria real das vidas dos amazônidas.” O caminho é “valorizar os ativos da floresta viva: serviços ambientais oferecidos ao mundo pela manutenção da preservação, seus benefícios em termos de sequestro de carbono, presença do maior laboratório a céu aberto para pesquisas em fármacos, repositório de alimentos saudáveis ainda pouco explorado, serviços de biotecnologia com enorme possibilidade de desenvolvimento, potencial de expansão dos sistemas agroflorestais, consolidação do sistema de integração lavoura-pecuária-floresta, aptidão para exploração legalizada de madeira (…) A lista poderia prosseguir indefinidamente, mas a conclusão é contundente: preservar a floresta não pode ser ônus imposto aos amazônidas para fazer o resto do país e do mundo dormirem com a consciência tranquila. Preservar a floresta e utilizá-la de modo sustentável significa colher seus louros, oferecendo vida digna a quem ali vive.”

 

Projeto de lei transforma recifes de coral da Amazônia em Área de Preservação Permanente

Na semana passada, o senador Vital do Rêgo, da Paraíba, apresentou ao Senado Federal um projeto de lei que atribui aos corais da Amazônia a condição de área de preservação permanente. Conforme a legislação ambiental, a região passa a ser uma “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. O projeto de Vital do Rêgo também proíbe qualquer atividade que possa causar danos aos

corais amazônicos. Você pode opinar sobre o projeto de lei aqui.

 

A história dos Waimiri-Atroari com os brancos

Rubens Valente escreveu sobre a tensão gerada nos Waimiris-Atroaris pela intenção governamental de atravessar suas terras com a linha de transmissão Manaus-Boa Vista. Ele fala da história deste povo e do contato com os brancos, especialmente com os militares. A parte pesada da história acontece durante a construção da BR-174 durante a ditadura militar. Valente se refere a um documento no qual o general de brigada Gentil Nogueira Paes, responsável pela obra, ordena à tropa a realização de “pequenas demonstrações de força, mostrando aos mesmos [índios] os efeitos de uma rajada de metralhadora, de granadas defensivas e da destruição pelo uso de dinamite”. A operação toda ficou guardada a sete chaves. Valente conta que “em 2014, a Comissão Nacional da Verdade calculou a tragédia em mais de 2.500 óbitos. Restaram cerca de 350 indígenas. Graças a um programa de indigenistas e antropólogos movido a recursos de uma indenização paga pela Eletronorte, hoje os índios comemoram 2.160 habitantes, crescimento populacional extraordinário que mostra como a demarcação de terras é fundamental para a sobrevivência de um grupo étnico.” O artigo traz depoimentos de sobreviventes do massacre, descrevendo mortes a tiros, facadas e envenenamento. Valente conta a conversa que teve com o procurador da República Júlio Araújo que disse que o Exército não mostra nenhuma vontade “para assegurar a elucidação da verdade (…) Apesar das evidências, há um ‘negacionismo’ do Exército quanto às violações decorrentes de ataques diretos às comunidades. Busca-se relativizar o genocídio, limitando-o às tarefas de ‘pacificação’, como se estas já não fossem etapa de um processo genocida que era alternado com políticas de extermínio. A União pretende mostrar que houve um conflito no qual os índios é que atacavam e as forças do Estado reagiam mediante uso adequado da força, tendo havido mortes apenas por força de doenças decorrentes do contato.” O atual secretário nacional de Segurança Pública, um dos principais auxiliares do ministro Sergio Moro, o general de Exército Guilherme Theophilo, assumiu o Comando Militar da Amazônia em 2014. Valente conta que, pouco antes, o General Theophilo se encontrou com os Waimiris-Atroaris e disse que “nós viemos aqui como o general Gomes Carneiro ou como o marechal Rondon. ‘Morrer se preciso for, matar nunca.’ E jamais como o general Gentil (…) “Se me fosse permitido usar a palavra do meu grande líder espiritual, o Papa João Paulo 2º, que (…) pediu perdão por algumas atrocidades que a Igreja Católica tenha cometido na Inquisição, eu pedirei perdão aos senhores se houve algum mal intencionado [sic] por parte do Exército brasileiro, que não é essa a nossa intenção, nem nunca foi. Nós somos sempre, vivemos sempre, para ajudar.” O artigo termina dizendo que “para os indígenas, sobrou só a alusão do general Theophilo ao Papa João Paulo 2º, um mea-culpa que os últimos comandantes do Exército nunca aceitaram fazer. Os Waimiris-Atroaris que esperem”.

 

Estudantes brasileiros inventam um jeito de remover o glifosato dos rios

Um grupo de 18 estudantes da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) de diferentes disciplinas conseguiu alterar a Escherichia coli – bactéria onipresente, dentro e fora do corpo humano – de modo a fazê-la degradar o glifosato, o agrotóxico mais usado no Brasil. A ideia é fazer um filtro cheio dessa variante da bactéria para colocar em rios ou lagos onde houver a presença do glifosato. O projeto está apenas começando e o grupo tem a intenção de participar da International Genetically Engineered Machine Competition no final de novembro, nos EUA. O evento é considerado a maior competição de biologia sintética do mundo.

 

Inspiração, humildade, tristeza e esperança de quem observou o movimento jovem da última 6ª feira

O movimento jovem que exige ação imediata contra a mudança do clima repercutiu em todo o mundo. Na 6ª feira, o foco foram as manifestações, as frases e os cartazes cheios de significado. Vale, agora, chamar a atenção para uma carta e um artigo, ambos de gente mais velha, ambos declarando a admiração pelo movimento. A carta foi escrita por Sasja Beslik, bósnio, sobrevivente da guerra civil dos anos 90, especialista no mundo financeiro onde trabalha com questões de sustentabilidade do sistema capitalista. A carta saiu na Medium, na 2ª feira da semana passada. Beslik diz que “tem dias que andando pelas ruas de Estocolmo sinto vergonha de mim, da minha geração e do trabalho que faço (…) um reconhecimento das decisões ruins que continuamos a tomar e das narrativas complexas que desenvolvemos para justificar nossa falta de coragem. Nos escondemos para não enfrentar o aquecimento global (…) Sabemos que não podemos continuar tratando o planeta como fazemos. Concordamos que precisamos mudar e, no entanto, não mudamos”. Mas Beslik crê que os sinais certos para o sistema capitalista seriam o suficiente para a gigantesca guinada que ele admite ser necessária. Amélia Gonzalez comentou a carta n’O Globo.

Já o artigo foi escrito por Alden Mayer, 66 anos, diretor da Union of Concerned Scientists, que vem trabalhando com as questões climáticas há 30 anos. Mayer conta que acompanhou a manifestação, em especial as falas dos jovens diante do Capitólio, em Washington. “Me vi sentindo um leque de emoções: a inspiração vinda da força e da clareza moral, a esperança que suas ações inspirem líderes de governo e do setor privado a buscarem as mudanças transformadoras necessárias (…) a humildade em reconhecer que, a despeito dos nossos melhores esforços (…) não conseguimos mobilizar a ação climática na escala necessária. E sinto uma profunda tristeza pelo fato de que, mesmo se conseguirmos reduzir dramaticamente as emissões e ficar dentro dos limites do Acordo de Paris, o mundo que estes estudantes encontrarão ao longo de suas vidas será severamente estressado pelos impactos da mudança do clima”. No entanto, ele lembra uma frase ouvida quando do lançamento do Relatório 1,5°C do IPCC no ano passado: “Toda fração de grau de aquecimento que conseguirmos evitar, importa”. Mayer termina no mesmo tom emocionado: “a mistura amarga de tristeza, cansaço, frustração e raiva que tantos de nós guerreiros climáticos de cabeças brancas sentimos com muita frequência será sobreposta por algo fresco, inspirador e lindo: uma nova esperança e a gratidão por ela. Nós devemos isso a vocês, jovens amigos.”

Vale dar uma lida no relato feito por Amanda Costa no site do Engajamundo. Ela diz que “temos medo, anseios, borboletas no estômago e pressa. TEMOS MUITA PRESSA. Sabemos da urgência e queremos soluções. Estamos dispostos a mudar nossos hábitos, mudar nossa postura, cobrar nossos representantes e salvar nosso mundo.”

 

Alemanha pretende entrar em aliança pelo fim do carvão

Uma comissão especial criada pelo governo alemão concluiu, em janeiro, que o país poderia parar de queimar carvão até 2038. Na semana passada, a chanceler Angela Merkel constituiu um comitê climático combinando diferentes ministérios para redigir e enviar ao parlamento uma lei firmando os passos para a eliminação do carvão da matriz energética alemã. A Ministra do Meio Ambiente, Svenja Schulze, disse que “finalmente poderemos entrar para a aliança de países e negócios que estão abandonando o carvão, a Powering Past Coal Alliance”.

 

Tromba d’água na Indonésia mata mais de 70 pessoas

Trombas d’água tão intensas quanto rápidas atingiram o lado indonésio da Nova Guiné. Mais de 70 pessoas morreram nas enchentes e desmoronamentos. Segundo a BBC, autoridades disseram que os recentes desmatamentos aumentaram o risco provocado por essas chuvas. A Channel News Asia disse que a contagem de mortos chegou a 77 até ontem de manhã.

 

Pode passar de mil o número de mortos pela passagem do ciclone Idai no sudeste da África

O ciclone Idai atingiu Moçambique neste final de semana e, entrando continente adentro, passou pelos Zimbabwe e Malawi. O Idai começou como uma tempestade tropical inundando os três países e mais a Tanzânia. Ao invés de dissipar, fez meia volta e retornou às águas quentes do canal que separa Moçambique da ilha de Madagascar. Lá, ganhou força de furacão e se voltou novamente em direção à costa. O número confirmado de mortos passa de 200. Tanto o The Guardian quanto o Weather repercutiram o presidente Filipe Nyusi ,dizendo que a soma dos mortos pode passar de mil, posto que inúmeras aldeias foram inundadas e estão, por ora, fora do alcance das equipes de resgate. A BBC relatou que dois internatos foram atingidos por desmoronamentos de rochas que atingiram paredes e que mataram mais de 30 alunos enquanto dormiam. A Al Jazeera também deu destaque para a tragédia climática.

 

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