O que a ciência do clima tem a dizer para o Brasil?

As cientistas do INPE Thelma Krug e Lúbia Vinhas, e os cientistas Jean Ometto e Luiz Aragão, da mesma instituição, propõem neste texto uma visão técnica baseada na ciência do clima do papel que deve ser exercido pelo Brasil frente às questões climáticas globais. O texto faz contrapontos gerais aos argumentos apresentados pelo negacionista Molion e seus colaboradores em carta aberta endereçada ao ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em 09/03/2019.

 

Neste documento, inicialmente, demonstramos as evidências existentes da atribuição de um papel significativo da ação humana nos padrões climáticos atuais. Na sequência, sumariamos de que forma podemos determinar as causas das mudanças climáticas e as consequências da negação da existência de um processo tão crítico quanto as mudanças climáticas antropogênicas. Esclarecemos que o problema vai além do dióxido de carbono (CO2) e concluímos com informações que levam a um maior conhecimento do problema para que o Brasil atinja um patamar de destaque na implementação de um modelo moderno de desenvolvimento econômico e sustentável.

 

Duas perguntas centrais são aqui abordadas:

1) Existem evidências para associarmos mudanças climáticas a ações antrópicas?

2) As ações de mitigação reprimem o crescimento econômico do país e sua reputação internacional?

 

As evidências físicas são robustas e suficientes para atribuir a influência humana no clima global

 

A evidência de que as mudanças generalizadas observadas no sistema climático, desde os anos 50, são atribuíveis a influências antrópicas tem crescido exponencialmente. A conexão entre a influência humana e as mudanças climáticas é analisada e discutida com base em uma extensa literatura cientifica. São mais de 15.000 artigos científicos abordando o tema “human influence” e “climate” na base do Google Acadêmico (Figura 1).

 

Figura 1. Número de artigos publicados sobre o tema entre 1900 e 2019 de acordo com a base do Google Acadêmico. Foram utilizadas as palavras chave “human influence” e “climate”

 

Essas evidências são compiladas pelos densos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças do Clima (IPCC). Inclusive, esses relatórios passam por revisão aberta não apenas de especialistas, mas da sociedade civil e governos. O efeito das influências antrópicas no clima tem se intensificado nas últimas quatro décadas. As evidências resultam da avaliação dos inúmeros estudos que incluem dados obtidos por institutos de pesquisa do mundo todo, compondo séries históricas e indicadores. Dentre esses indicadores climáticos, podemos citar: as temperaturas próximas à superfície; o conteúdo de umidade atmosférica; a precipitação pluviométrica sobre a Terra; o conteúdo de calor oceânico; a salinidade oceânica; o nível do mar; o gelo marinho do Ártico e a intensidade e frequência de extremos climáticos.

 

As avaliações de atribuição e incertezas indicam que é extremamente provável que as atividades humanas tenham causado, diretamente, mais da metade do aumento observado na temperatura média global de superfície de 1951 a 2010. Ressalta-se que mecanismos de retroalimentação (feedbacks) do sistema natural podem potencializar a forçante antrópica. Como dito, essa avaliação é apoiada por evidências robustas de vários estudos científicos usando diferentes métodos. As incertezas nos diagnósticos também são contabilizadas de forma transparente e formal, a partir de análises exploratórias profundas dos dados, dos resultados de projeções e da performance dos modelos. Os dados dos modelos, antes de qualquer projeção, são confrontados e calibrados com dados derivados de observações, incorporando assim as informações mais recentes, obtidas com maior exatidão por redes de coletas de dados de superfície distribuídas no mundo todo. Esses dados atualmente são ainda complementados pelos provenientes de um arsenal de satélites operacionais de Observação da Terra, onde a contribuição do Brasil é crítica, não só para o mundo e o clima, como também para manter a soberania sobre seus recursos naturais e sua economia.

 

Resultados da nova geração de modelos climáticos, cuja capacidade de simular o clima histórico melhorou em muitos aspectos, comparada à geração anterior de modelos 3 considerados no Quarto Relatório de Avaliação do IPCC, indicam que de fato há uma contribuição antrópica substancial no clima planetário (Figura 2).

 

Figura 2. Atribuição das variáveis influenciadoras das mudanças no clima global

 

A consistência das mudanças observadas e modeladas em todo o sistema climático, incluindo o aquecimento da atmosfera e do oceano, a elevação do nível do mar, a acidificação dos oceanos e as mudanças no ciclo da água, na criosfera e nos extremos climáticos apontam para alterações em escala global, inclusive alterando o balanço energético na atmosfera e alterando a temperatura média da Terra, resultante principalmente do aumento de emissões antrópicas de gases de efeito estufa (GEE).

 

As emissões antrópicas aumentam as concentrações dos GEE na atmosfera, resultando em um aquecimento planetário proporcional a elas. Isso se deve a que esses gases têm o potencial de absorver o calor emitido pela Terra na direção do espaço e reemiti-lo, aquecendo o planeta. É importante notar que o CO2 não é o único gás de efeito estufa. Naturalmente, os GEE estão distribuídos na atmosfera na forma de vapor d’água (95%), CO2 (3,6%) e outros (1,4%). As emissões antrópicas estão distribuídas em 84% (CO2), 9% Metano (CH4), 5% Oxido nitroso, 2% outros. Apesar de o CO2 ser o gás mais importante, devido a sua contribuição majoritária nas emissões antrópicas, o CH4 tem um potencial de aquecimento global 28-36 vezes superior, e o oxido nitroso (N2O) têm um potencial 265-298 vezes maior que o CO2. Portanto, mesmo em quantidades inferiores a outros gases os GEE têm potencial de alteração do comportamento atmosférico e sua interação com a radiação provinda do Sol e da Terra.

 

As variações naturais na incidência de radiação solar são historicamente conhecidas e incorporadas nas análises. Os resultados dessas análises indicam que este forçamento natural, e suas flutuações, têm contribuição relativa muito menor que a alteração na composição química da atmosfera, determinada pelo aumento de emissões de GEE e outros poluentes. Esse fato se reforça pelo resfriamento estratosférico e aquecimento troposférico, sendo o primeiro diretamente relacionado a incidência de radiação solar e o segundo à sua composição química.

 

Nas análises de atribuição das alterações climáticas observadas, outros processos naturais são também considerados. A Oscilação Multi-decadal Atlântica (AMO), ou a oscilação Decadal do Pacífico são dois processos oceânicos de baixa frequência bem conhecidos. Estes têm, certamente, influência na variação natural do clima, entretanto, inúmeros estudos científicos evidenciam um desacoplamento da variação atual no aquecimento da atmosfera dessas flutuações. Estudos que encontram um papel significativo para, por exemplo a AMO, mostram que sua flutuação não se projeta fortemente nas séries de temperatura da atmosfera recente, no período de 1951-2010.

 

Torna-se importante ressaltar que as variações na composição química da atmosfera, em especial pela presença de compostos de carbono (como CO2 e CH4), esteve associada às grandes mudanças de clima no passado (dados derivados de estudos paleoclimáticos). Quando os níveis de CO2 subiram abruptamente (derivados de processos naturais de larga escala) o aquecimento global foi altamente disruptivo e causou grandes extinções de espécies. Um diferencial seríssimo que vivenciamos, é que a curva de aumento das concentrações de CO2 na atmosfera vem se alterando positivamente e exponencialmente. As taxas de mudança observadas atualmente são muito mais elevadas que as observadas em períodos pretéritos da história da Terra.

 

O ponto de discussão atual não é se as mudanças climáticas são causadas ou não pelos seres humanos, e sim que o clima está mudando e seus impactos climáticos atuais e futuros afetam e continuarão afetando diretamente a humanidade.

 

Como determinamos as causas das mudanças observadas

 

O clima da Terra está sempre mudando, afirmou Molion e colaboradores. Sim, não existe surpresa nisto. Isso pode ocorrer por vários motivos. Para determinar as principais causas das mudanças observadas, deve-se primeiro determinar se uma mudança observada no clima é diferente de outras flutuações que ocorrem sem qualquer forçamento. A variabilidade climática sem forçamento – chamada de variabilidade interna – é a consequência de processos que ocorrem dentro do sistema climático. A variabilidade oceânica em grande escala, por exemplo as flutuações do El Niño-Southern Oscilation (ENSO) no Oceano Pacífico, é a principal fonte de variabilidade climática interna nas escalas de tempo decenais a centenárias. A mudança do clima também pode resultar de forçantes naturais externas ao sistema climático, como erupções vulcânicas ou mudanças na irradiância solar. Forças como essas são responsáveis pelas enormes mudanças no clima que estão claramente documentadas no registro geológico. Forças causadas pelo homem também afetam o clima e estão relacionadas às emissões de gases de efeito estufa ou poluição particulada atmosférica (aerossóis). Qualquer uma dessas forças, provenientes de causas naturais ou humanas, pode afetar a variabilidade interna, bem como causar uma mudança no clima médio.

 

Estudos de atribuição tentam determinar as causas de uma mudança detectada no clima observado. Ao longo do século passado, dados científicos indicam que a temperatura média global aumentou, portanto, se a mudança observada for forçada, então a força principal deve ser aquela que causa o aquecimento, e não o resfriamento. Estudos formais de atribuição de mudanças climáticas são realizados usando experimentos controlados com modelos climáticos. As respostas simuladas por modelos para forças climáticas específicas são frequentemente chamadas de impressões digitais dessas forçantes. Um modelo climático deve simular de forma confiável os padrões de impressões digitais associados a forçantes individuais, bem como os padrões de variabilidade interna não forçada, a fim de produzir uma avaliação significativa da atribuição de mudanças climáticas. Nenhum modelo pode reproduzir perfeitamente todas as características do clima, mas muitos estudos detalhados indicam que simulações usando modelos atuais são de fato suficientemente confiáveis para realizar avaliações de atribuição. Inclusive ressalta-se a constante atualização nas representações dos modelos dos processos físicos, assim como a capacidade computacional. Um exemplo simples, refere-se à previsão do tempo (e não clima), hoje tem-se muito mais confiabilidade na previsão de tempo que se tinha décadas atrás.

 

A Figura 3 ilustra parte de uma avaliação da impressão digital da mudança da temperatura global na superfície durante o final do século XX. A mudança observada na segunda metade do século XX, mostrada na série temporal pela linha preta nos painéis da esquerda, é maior do que a esperada apenas pela variabilidade interna. Simulações conduzidas apenas por forçantes naturais (linhas amarelas e azuis no painel superior esquerdo) não conseguem reproduzir o aquecimento global na superfície no final do século XX com um padrão espacial de mudança (superior direito) completamente diferente do padrão observado de mudança (meio direito).

 

As simulações que incluem os forçamentos naturais e antrópicos fornecem uma representação muito melhor da taxa temporal de mudança (inferior à esquerda) e do padrão espacial (inferior à direita) da alteração da temperatura observada de superfície. Ambos painéis à esquerda mostram que os modelos computacionais reproduzem o resfriamento da superfície naturalmente forçado, observado por um ou dois anos após grandes erupções vulcânicas, tais como as ocorridas em 1982 e 1991. Simulações com forçantes naturais captam as mudanças de temperatura de curta duração após erupções, mas apenas as simulações com forçantes natural + humana simulam a tendência de aquecimento de maior duração. Uma avaliação mais completa de atribuição examinaria a temperatura acima da superfície, e possivelmente outras variáveis climáticas, além dos resultados de temperatura de superfície mostrados na Figura 3. Os padrões da impressão digital associados a forçamentos individuais tornam-se mais fáceis de distinguir quando mais variáveis são consideradas na avaliação. Não é possível simular corretamente as mudanças climáticas observadas recentemente sem incluir a resposta às forçantes antrópicas, incluindo gases de efeito estufa, ozônio estratosférico e aerossóis. Causas naturais de mudança ainda estão em ação no sistema climático, mas as tendências recentes de temperatura são em grande parte atribuíveis ao forçamento causado pelo homem.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 3. Modelos forçados com causas naturais e naturais + antrópicas. As observações na linha preta são melhores modeladas quando se consideram as duas causantes

 

A importância do engajamento e da consciência da sociedade sobre a urgência nas mudanças no padrão de uso dos recursos naturais

 

Lê-se na carta aberta de Molion e colaboradores que “A hipótese do aquecimento “antropogênico” é um desserviço para a Ciência e um risco para as políticas públicas”. Primeiramente, a metodologia científica ensina que hipóteses não podem ser refutadas sem evidências geradas a partir de metodologias consolidadas. A negação da contribuição antrópica para o aquecimento global contradiz os resultados em milhares de estudos publicados em todo o mundo por cientistas de diferentes nacionalidades e trabalhando em diferentes instituições, com contribuições importantes de pesquisadores brasileiros. Uma análise no buscador Google Acadêmico, mostrou que existem 2 milhões de artigos publicados sobre o tema “Aquecimento Global”. Quando a busca é feita com o tema “Mudanças Climáticas” chega-se a um número superior a 3 milhões de artigos científicos. Portanto, é notório que apesar da necessidade de mais estudos, existe um volume significativo de informações que direcionam as atuais conclusões e ações.

 

As análises integradas sobre impactos antrópicos no ambiente indicam que a redução das emissões de gases de efeito estufa de natureza antrópica pode contribuir não só para mitigar as mudanças no clima, mas também para atingir vários objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 30 das Nações Unidas, da qual o Brasil é signatário. Os cenários de mitigação que resultam em baixa concentração de gases de efeito estufa até o final deste século indicam custos reduzidos para se alcançar a melhoria da qualidade do ar, os objetivos de segurança energética, a segurança alimentar, a segurança hídrica, com significativos co-benefícios para o bem-estar, a saúde humana e os ecossistemas.

 

Precisamos buscar os cobenefícios das ações humanas em relação ao clima e ao ambiente de forma geral. Por exemplo, no Brasil há um enorme potencial de contribuição para a redução de emissões de gases de efeito estufa, particularmente o CO2, que pode ser atendido pela ampliação da geração de bioenergia (e biocombustíveis) e reflorestamentos em larga escala, contribuindo para métricas de sustentabilidade. Estas ações têm efeitos positivos diretos, tanto nas atividades da indústria brasileira, na economia nacional e na modernização do modelo social brasileiro.

 

Ao indicar o negacionismo à mudança do clima e particularmente a influência humana, o Brasil perderá inúmeras oportunidades nos mercados internacionais e possibilidades de cooperação internacional, aceita pelos países membros do IPCC como o viabilizador crítico da implementação de atividades de mitigação e adaptação por países em desenvolvimento. Isto já foi demostrado pelo recente desembolso de US$ 100 milhões pelo Fundo Verde do Clima da Convenção do Clima, pelos esforços do Brasil em reduzir as emissões pelo desmatamento no país.

 

Torna-se imperativo destacar que todas as ações de mitigação e adaptação devem obrigatoriamente ser implementadas considerando co-benefícios para a sociedade, incluindo erradicação da pobreza, educação, saneamento básico, fontes alternativas de energia, acesso a água potável, educação e transporte. O modelo de desenvolvimento baseado em baixo carbono, portanto, não só permite a estabilização dos processos climáticos, garantindo a manutenção da produção agrícola do país, como também incentiva a indústria de inovação, reduz gastos hospitalares e coloca o país em uma posição resiliente quanto a dependência de fontes energéticas baseadas em combustíveis fósseis.

 

Assim, torna-se evidente que há inúmeras sinergias entre ações de mitigação da mudança do clima com o desenvolvimento econômico nacional e outros compromissos internacionais, como a Agenda 30, a Convenção da Biodiversidade, entre outros.

 

Uma estratégia focada em baixas emissões de CO2 não desvia atenções e recursos das emergências reais

 

Não existe, de forma alguma, uma obsessão pelo CO2 e sim uma mobilização de diversos segmentos da sociedade para tomar ações, preventivas, baseadas em um conjunto extensivo de dados e pesquisas. O CO2 vem sendo utilizado como referência à trajetória de alteração na composição da atmosfera, e a consequente mudança no balanço energético do planeta. A alteração na composição da atmosfera inclui vários outros compostos que não apenas o CO2, desta forma ações na redução de emissões de GEE (que, como dito no arquivo Molion), oferece oportunidades importantes para o Brasil, sob o ponto de vista comercial e ambiental, se adequadamente feitas.

 

O Brasil tem potencial e características importantes para ser referência global no desenvolvimento equilibrado com o ambiente, na produção massiva de energias renováveis, produtos da biodiversidade, agricultura com impacto reduzido ao meio (que inclui não apenas ações que reduzam emissões de GEE, mas também otimização no uso de fertilizantes, agroquímicos, etc). Várias dessas alternativas podem ser financiadas internacionalmente, e ainda ser uma oportunidade para o Brasil no mercado internacional (por exemplo para produtos agrícolas). Há oportunidades em todos os setores. Por exemplo, o Brasil já está avançando neste modelo desenvolvimentista de vanguarda, respeitado mundialmente. A Política Nacional sobre Mudança do Clima contempla uma redução dos resíduos sólidos e efluentes (financiamento para acabar com os lixões no país, para aumentar a quantidade e tratamento de resíduos líquidos urbanos e aumento da eficiência energética). Interessantemente, as tecnologias nacionais também estão voltadas para auxiliar a manutenção do funcionamento ambiental. Como exemplo, nossa tecnologia de satélites, comunicação e nossa ciência em geral já foca no desenvolvimento sustentável. Será que temos que dar uma guinada em tudo que já foi construído e estabelecido nacionalmente e internacionalmente em prol de ideias contraditórias?

 

Como os outros países, o Brasil tem que identificar os seus nichos para estimular a inovação. No Japão, por exemplo, foram identificadas 10 tecnologias inovadoras até 2050. Existe a necessidade de sinalização para o setor privado de investimentos relevantes, com ou sem parceria internacional. Um exemplo recente advém do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Quioto, que gerou investimentos importantes para o Brasil, particularmente no setor Resíduos e Energia. Seria muito ingênuo não enxergar as enormes oportunidades que o Brasil tem de ajudar o esforço global de mitigar a mudança do clima, simultaneamente buscando o desenvolvimento sustentável. Inovação, oportunidades, identificação de nossos nichos, envolvimento do setor privado – são algumas palavras chave que precisam ser reforçadas.

 

Melhor conhecimento e maior resiliência

 

A ciência das mudanças climáticas se preocupa exatamente com isso. Quanto maior o conhecimento sobre o problema mais a sociedade e os indivíduos estarão informados e preparados para eventos climáticos extremos (como chuvas extremas, inundações, secas) e as consequências econômicas e sociais desses eventos. O aprimoramento da capacidade da meteorologia nacional é certamente relevante, entretanto mudanças no clima tem que ser vistas e tratadas de forma integrada e com amplitude socioeconômica e socioambiental. O exemplo claro desta afirmação é a economia brasileira. Um terço das exportações do Brasil, que mantém a balança comercial positiva e o crescimento do país, é derivada de produtos “naturais” (Figura 4).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 4. Exportações brasileiras divididas em produtos naturais (azul) e outros produtos (vermelho). Os números em negrito indicam a contribuição percentual dos produtos de origem vegetal e animal para o total

 

Portanto, se não tivermos ações para minimizar qualquer possível impacto climático sobre nosso país, nossa economia pode ruir. Este é um lado da história. Devido à preocupação global com as mudanças climáticas, essas exportações são dependentes de certificações demonstrando que os produtos não estão relacionados com a degradação ambiental (por exemplo advindos de áreas desmatadas). Se as políticas se direcionarem de forma contrária a manutenção das funções ambientais, perderemos uma fração significativa de nossas exportações.

 

Esta ação de cunho ambiental reprimiu o crescimento econômico e as exportações do país? Não (Figura4). O desmatamento amazônico diminuiu em aproximadamente 70%, reduzindo assim as emissões de CO2 e outros GEE, melhorando a saúde respiratória da população. A produção de soja, por outro lado, praticamente dobrou de 56.699.617 toneladas em fevereiro de 2007 para 113.393.434 toneladas em fevereiro de 2019 (IBGE). A imposição de restrições, permite a reformulação de modelos obsoletos de desenvolvimento e incentiva a inovação com desenvolvimento de biotecnologia, tecnologia agrícola, tecnologia de monitoramento e processamento de dados.

 

Com isso, terminamos a avaliação nos posicionando a favor do desenvolvimento sustentável do país baseado em conhecimento técnico e científico robusto. Temos todas as condições para demonstrar para o mundo que existem formas inovadoras e modernas de se desenvolver.

 


* Thelma Krug é Pesquisadora Titular do INPE e Vice Presidente do IPCC; Jean Ometto é Pesquisador Titular do INPE e Coordenador do Centro de Ciência do Sistema Terrestre; Luiz Aragão é Pesquisador Titular do INPE e Chefe da Divisão de Sensoriamento Remoto; e Lúbia Vinhas é Pesquisadora Titular do INPE e Coordenadora Geral de Observação da Terra.