O que o Acampamento Terra Livre tem a ver com a mudança do clima?

Na manhã de ontem, era alta a tensão entre os milhares de indígenas reunidos no Acampamento Terra Livre (ATL), que ocupa até o próximo sábado uma parte da Esplanada dos Ministérios, em Brasília. A tensão foi provocada por repetidas declarações de Bolsonaro, pela presença da Força Nacional convocada pelo ministro Moro para “desencorajar” manifestações e por uma mensagem paranoica divulgada logo na manhã de ontem pelo ministério da agricultura. A tensão amainou depois de uma negociação na qual os líderes indígenas concordaram em afastar as barracas para um gramado ao lado do Teatro Nacional. O ATL foi notícia no El País e no The Guardian, ambos destacando o clima de confronto entre os Povos Indígenas e o governo. O Poder 360 publicou fotos do acampamento antes do deslocamento das barracas. E a APIB está divulgando intensamente as atividades que acontecem no ATL na sua página no Facebook.

E por que o ClimaInfo está destacando estas notícias sobre o ATL? Porque os Povos Indígenas são os que melhor preservam a biodiversidade e as florestas (e, portanto, o carbono nelas estocado). A constatação vem de há muito e é repetida em documentos do Banco Mundial, da FAO, do Vaticano e de muitos outros organismos multilaterais. O Banco Mundial diz que Povos Indígenas e comunidades locais cuidam de 18% das terras do mundo e que outro tanto ainda aguarda o reconhecimento legal. Essas terras contêm 24% do carbono armazenado em florestas tropicais e 80% da biodiversidade do planeta: “eles detêm o conhecimento e a competência ancestrais em como adaptar, mitigar e reduzir os riscos climáticos e os de desastres”. O Banco ainda diz que, apesar de representar menos de 5% da população mundial, eles são 15% do grupo dos mais pobres. A Natural Capital Coalition diz que isso “torna os Povos Indígenas e comunidades locais os parceiros mais importantes na luta global pela contenção das mudanças climáticas e pela preservação da biodiversidade”. A FAO, em seu relatório sobre o estado das florestas do ano passado, diz que a vulnerabilidade das florestas à mudança do clima é específica para cada local. Portanto, medidas de adaptação também dependem do contexto e local. Diz o relatório que “essa adaptação contextualizada deve ser guiada pela melhor ciência disponível e pelo conhecimento indígena e tradicional.” A ONU tem um braço específico para os Povos Indígenas. E a National Geographic publicou uma matéria interessante sobre o papel primordial desses povos.

Em tempo: em resposta a uma fala feita pelo presidente na semana passada em uma live no Facebook, os Yanomami reafirmam sua posição contra o garimpo em seu território, e reforçam que, ao contrário do que Bolsonaro disse, os Yanomami não são pobres e têm uma vida rica em meio à floresta. Davi Yanomami, uma de suas lideranças históricas, mandou um recado ao presidente: “O senhor fala que o Yanomami está passando fome e sofrendo. Nós, Yanomami, ninguém está sofrendo. Ninguém está passando fome”.

 

ClimaInfo, 25 de abril de 2019.