Florestas e mudanças climáticas: informação básica

Barco Munduruku no Rio Tapajós

Florestas, este é o tema da segunda matéria do ClimaInfo da série com as informações básicas sobre o aquecimento global e a mudança do clima. O desmatamento das nossas florestas é uma das maiores fontes de emissão de gases de efeito estufa do país. Acabar com o desmatamento e com a degradação florestal, plantar novas árvores e recuperar as florestas degradadas são ações de grande potencial para a contenção do aquecimento global e a estabilização do clima da Terra.

 

  • O desmatamento ao redor do mundo emitiu 800 milhões de toneladas de carbono em 2015, cerca de 7% do total de emissões provocadas pela humanidade (antrópicas). Se forem incluídas as emissões devidas da degradação de florestas, este percentual sobe para mais de 9%.

 

  • Nos primeiros 5 anos desta década, a média anual do desmatamento líquido[1] foi menor do que durante a década de 1990. Mas o aumento dos incêndios florestais e da degradação florestal implicam aumento do total de destruição de florestas, o que atingiu níveis recordes em 2016.

 

  • Cumprir as metas de redução de emissões do Acordo de Paris será muito difícil sem a interrupção do desmatamento. A reversão do desmatamento e o plantio de mais árvores tem o potencial de remover o equivalente a 10% das emissões globais atuais.

 

  • O aumento da concentração de dióxido de carbono na atmosfera limita a capacidade de absorção de carbono pelas florestas tropicais, e se o aumento da temperatura não for interrompido, as florestas degradadas podem vir a liberar ainda mais carbono no ar.

 

  • No Brasil, o desmatamento respondeu pela emissão de 1,6 GtCO2e, o que correspondente a 51% das emissões nacionais do ano de 2016[2]. Naquele ano, as emissões do desmatamento da Amazônia foram de 580 MtCO2e, do Cerrado foram de 220 MtCO2e e da Mata Atlântica, de 240 MtCO2

 

  • As emissões do desmatamento da Amazônia atingiram um pico em 2004, quando foram desmatados[3] quase 28.000 km2. Com o aumento de ações de comando e controle, as taxas de desmatamento cairam, mas o desmatamento continua. Em 2012, a área desmatada na Amazônia baixou para 4.500 km2, mas voltou a subir e atingiu quase 7.000 km2 em 2017.

 

  • O bioma Cerrado também perdeu cerca de 28.000 km2 em 2004; em 2012 o desmatamento atingiu 9.500 km2 do bioma e, em 2017, o Cerrado perdeu mais de 7.400 km2.

 

Desmatamento e degradação florestal estão entre as principais fontes de emissão de carbono à atmosfera

 

A destruição das florestas leva à emissão de dióxido de carbono à atmosfera, quando o carbono armazenado nas árvores e nos solos segue para a atmosfera. Florestas absorvem e armazenam dióxido de carbono à medida que as árvores crescem. As florestas do mundo atualmente absorvem cerca de um terço das emissões antrópicas de carbono.

 

As emissões líquidas do desmatamento – o balanço entre o carbono liberado pela destruição da floresta e o absorvido pela sua recuperação e/ou expansão – chegaram a quase 800 milhões de toneladas de carbono em 2015, segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura). A degradação florestal – quando algumas árvores são removidas, mas a floresta ainda permanece – liberou por volta de 270 milhões de toneladas de carbono no mesmo ano. Isso significa que a destruição de florestas como um todo representou mais de 9% das emissões globais de carbono em 2015.

 

O desmatamento precisa diminuir para que seja evitado um aumento perigoso do aquecimento global. Um quarto das reduções de emissão prometidas pelos países junto ao Acordo de Paris vêm de se evitar o desmatamento e melhorar o manejo de florestas. Limitar a elevação da temperatura em 1,5oC até o final do século – um objetivo para o qual os políticos prometeram “não medir esforços” – exige uma expansão em grande escala da área florestal no mundo todo.

 

A degradação e os incêndios aumentam a perda de florestas

 

O desmatamento líquido anual caiu de uma média de 7,3 milhões de hectares durante a década de 1990 para 3,3 milhões de hectares entre 2010-15, de acordo com a FAO. O relatório do IPCC de 2014 mostrou que as emissões por desmatamento nos primeiros 10 anos deste século caíram em comparação com a última década do século 20[4]. Mas nos últimos anos, a perda total de florestas tem aumentado, tendo atingido níveis recordes em 2016.

 

Os números da FAO para o desmatamento subestimam a perda total de florestas. A Global Forest Watch (GFW), que baseia sua análise em dados de satélite, estima que o mundo perdeu quase 20 milhões de hectares de cobertura florestal em 2015[5] e quase 30 milhões de hectares em 2016[6]. A diferença se dá porque a definição da FAO para desmatamento só se aplica quando um grupo de árvores é removido permanentemente, e não faz a distinção entre uma floresta plantada e uma natural. O GFW mede as mudanças nas florestas do mundo usando dados de satélite – um método que leva em conta a perda de todas as árvores acima de uma certa altura, incluindo os cortes de florestas comerciais, o desmatamento e os incêndios.

 

O aumento da destruição de florestas em 2016 provavelmente foi resultado do aumento de incêndios florestais. Um El Nino extraordinariamente forte fez com que as temperaturas subissem, aumentando as chances de incêndios causados pelo homem se espalharem ainda mais. O World Resources Institute (WRI) afirma que o aumento do número de incêndios florestais é “preocupante em vários níveis”. Por exemplo, o aumento dos incêndios florestais poderia neutralizar as tendências de redução do desmatamento na Amazônia e aumentar drasticamente as emissões de carbono.

 

Dados recentes também sugerem as emissões por degradação de florestas podem estar sendo subestimadas. Do mesmo modo, quando há um desmatamento em regiões de turfeiras, os solos ricos em carbono ficam expostos e podem vir a emitir carbono quando secam e pegam fogo. Na Indonésia, em 2015, aconteceram grandes incêndios que queimaram turfeiras. Estima-se que estes incêndios tenham liberado mais de 475 milhões de toneladas de carbono – o equivalente a 60% das emissões líquidas do desmatamento global naquele ano, ou 4% de todas as emissões globais.

 

Plantar mais árvores ajuda a frear as mudanças climáticas

 

Ações de plantio de mais árvores e de restauração de florestas (aflorestamento e reflorestamento, ou AR) absorvem dióxido de carbono e poderiam fazer parte das medidas globais para frear as mudanças climáticas.

 

O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) sugere que ações de AR poderia remover entre 40 e 70 bilhões de toneladas de carbono da atmosfera ao longo de 100 anos. Isso poderia ajudar o mundo a evitar a ultrapassagem de limites perigosos da mudança do clima.

 

No entanto, as ações de AR pressionam recursos hídricos e o uso da terra. Por exemplo, para remover 4 bilhões de toneladas de dióxido de carbono por ano estima-se que serão precisos 320 milhões de hectares de terra, uma área quase do tamanho da Índia. Isso corresponde ao aumento de cerca de 8% da área global de florestas quando comparado com à existente em 2015. Para efeito de comparação, entre 1990 e 2015, a área global florestada diminuiu cerca de 129 milhões de hectares.

 

 

Potencial de remoção de CO2 da atmosfera pelas florestas

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

As causas do desmatamento em diferentes países

 

No Brasil, o desmatamento, ilegal em grande parte, tem um ciclo conhecido. Primeiro, em terras devolutas, da União, entram madeireiros para remover espécies de maior valor. Em seguida, a área é “limpa” e convertida em pastagens. Os madeireiros seguem para outra área para reiniciar o processo. No norte do Mato Grosso, a soja avançou sobre as pastagens, empurrando-as em direção ao sul do Pará. Durante a década passada, houve um movimento de assentamento de comunidades rurais pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário e, por um certo tempo, houve um desmatamento significativo nessas áreas. Em menor escala, houve cortes da floresta para formação das represas das grandes hidrelétricas, com destaque para Belo Monte, Jirau, Sinop, São Manoel e Colíder. O gráfico abaixo mostra a evolução do desmatamento neste século em Mato Grosso, Pará e Rondônia.

 

Evolução do desmatamento da Amazônia – fonte: http://www.obt.inpe.br/prodes/dashboard/prodes-rates.html (consulta em 05/11/2508)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Na Indonésia, a demanda por terras para plantações de palma, da qual se extrai o óleo de dendê, é uma das principais causas do desmatamento, principalmente em áreas de florestas nativas. A análise de incêndios florestais na Indonésia, feita pelo WRI, sugere que a produção de celulose e a indústria madeireira também estão por trás do desmatamento naquele país.

 

Metas e medidas para a redução do desmatamento

 

As promessas climáticas do Brasil, feitas como parte do Acordo de Paris, estabelecem uma meta de desmatamento ilegal zero e outra para o reflorestamento e a recuperação florestal de 12 milhões de hectares até 2030.

 

Na Indonésia a meta é reduzir as emissões de florestas, incluindo incêndios de turfa, entre 69% e 91% até 2030. O país se propõe a reduzir a taxa de desmatamento de 920.000 hectares por ano na média entre 2013 e 2020 para 325.000 hectares por ano na década que vai de 2020 a 2030.

 

O Programa das Nações Unidas para Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação (REDD +) visa reduzir as emissões fornecendo incentivos financeiros para proteger as florestas dos países em desenvolvimento. Inicialmente proposto em 2006, o REDD + foi incluído no Acordo de Paris de 2015. US$ 15 bilhões foram gastos ou comprometidos com programas de REDD + pelos governos nacionais até o momento. Mas algumas ONGs criticaram o programa por este não atacar as causas profundas do desmatamento, e até por desencadear conflitos locais.

 

O Desafio de Bonn é um esforço global para restaurar 150 milhões de hectares de terra desmatada e degradada até 2020 e 350 milhões de hectares até 2030. Uma estimativa sugere que isto absorveria o equivalente a 7% das emissões do uso de combustível fóssil.

 

O Brasil constituiu o Fundo Amazônia a partir de parcerias com a Noruega, a Alemanha e a Petrobras. O Fundo, gerido pelo BNDES, captou cerca de R$ 2 bilhões e alocou quase metade em 101 projetos. Boa parte destes recursos foram usados pelos estados da Amazônia Legal para a realização do Cadastro Ambiental Rural (CAR) criado pelo Código Florestal. Parte dos recursos também foram usados para apoiar as ações de comando e controle que refrearam o desmatamento.

 

Um estudo realizado em Uganda revelou que pagar aos proprietários de terras para não removerem árvores era uma maneira econômica de reduzir o desmatamento. A estes foram pagos US$ 28 por hectare que mantivessem a área protegida. Avalia-se que a ação cortou o desmatamento pela metade.

 

O impacto da mudança do clima nas florestas

 

O aumento do dióxido de carbono na atmosfera está fazendo com que plantas e árvores cresçam mais rápido e produzam mais folhas. Mas os efeitos positivos da expansão de florestas provavelmente serão largamente compensados pelas interação entre as ameaças da mudança do clima com outras tensões como a destruição de habitats, a poluição e a introdução de espécies invasoras.

 

A floresta amazônica é um grande sumidouro de carbono que, estima-se, há duas décadas removia dois bilhões de toneladas de dióxido de carbono da atmosfera a cada ano. Mas à medida que a quantidade de dióxido de carbono aumenta na atmosfera, as árvores estão crescendo e morrendo mais rápido. A capacidade da Amazônia de absorver carbono caiu pela metade desde os anos 90, conforme um estudo que coletou dados ao longo de 30 anos. À medida em que aumenta a quantidade de carbono na atmosfera, a capacidade das florestas tropicais de atuar como uma sorvedouro de carbono pode estar se estabilizando.

 

O aumento da temperatura também representa um perigo significativo. De acordo com o IPCC (p.15), existe um sério risco da floresta amazônica sofrer “uma mudança abrupta e irreversível em escala regional” ainda neste século, caso as emissões globais continuem a aumentar. Porque as plantas e árvores não podem migrar como resposta a mudanças de temperatura, é esperado que todas as espécies de árvores não consigam se adaptar ao aquecimento global e, portanto, corram em risco de extinção se os níveis de emissão chegarem aos pontos mais altos (IPCC, figura SPM.5, p.15).

 

Existe também o risco de que a mudança climática possa desencadear um processo de retroalimentação (feedback loop), (IPCC, figura 4-8), no qual os impactos do aumento da temperatura resultam em mais secas ou incêndios, resultando na liberação de mais carbono na atmosfera à medida em que a floresta é afetada.

 

 

[1] Desmatamento líquido: (total da área desmatada) – (total de áreas restauradas com florestas). Pode se referir só às áreas onde a restauração é natural e como espécies nativas ou não.

[2] Os dados do Brasil foram extraídos da versão 5 do SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa), publicado em 2017. http://seeg.eco.br/

[3] As áreas desmatadas foram baixadas dos sites do Prodes e Prodes Cerrado do INPE:

http://www.obt.inpe.br/OBT/assuntos/programas/amazonia/prodes

http://terrabrasilis.dpi.inpe.br/dashboard/deforestation/biomes/cerrado/increments/

[4] Tabela 11.1 em http://www.ipcc.ch/pdf/assessment-report/ar5/wg3/ipcc_wg3_ar5_chapter11.pdf

[5]  http://www.wri.org/blog/2017/07/global-tree-cover-loss-remains-high-emerging-patterns-reveal-shifting-contributors

[6] http://blog.globalforestwatch.org/data/global-tree-cover-loss-rose-51-percent-in-2016.html