O poderoso novo ministério da agricultura
Ontem, pela segunda vez, a futura ministra Tereza Cristina anunciou uma nova estrutura para o ministério. No final de novembro, ela havia anunciado que seu ministério teria 2 vice-ministros e 8 secretarias. No anúncio de ontem, pelas nossas contas, a estrutura ficou mais enxuta e terá 7 secretarias. O presidente da União Democrática Ruralista, Nabhan Garcia, cotado para vice-ministro, ficou como secretário especial de assuntos fundiários. Segundo o comunicado do ministério, feito no início da tarde de ontem, ele cuidaria da regularização fundiária, da demarcação de terras indígenas e quilombolas, do licenciamento ambiental e das políticas de reforma agrária (a inclusão do licenciamento nesta secretaria nos suscitou dúvidas quanto ao seu escopo e abrangência). Mas, um outro comunicado do ministério, feito três horas depois, dizia que “questões relacionadas a demarcações e conflitos de terra serão submetidas a um conselho interministerial.” A Embrapa e o Plano de Agricultura de Baixo Carbono ficarão debaixo da secretaria de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação. O cavalheiro anunciado como vice-ministro executivo há 3 semanas não apareceu na nova estrutura. A notícia da Agência Brasil disse que a futura ministra assumirá algumas responsabilidades que eram dos ministérios do Meio Ambiente, da Pesca e da Casa Civil.
Mais uma ameaça ao licenciamento ambiental
A atual Secretária Estadual do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável do Rio Grande do Sul, Ana Pellini, é cotada para a secretaria executiva do ministério do meio ambiente. O site BR18 diz que Pellini conseguiu reduzir o tempo médio do licenciamento de empreendimentos de 900 para 40 dias, mas não conta que, naquele estado do sul, não consta a existência de projetos de grandes hidrelétricas, de exploração de bacias petrolíferas off shore ou de grandes reservas minerais. De qualquer maneira, é difícil encontrar quem seja contra a redução do tempo necessário para o licenciamento, desde que as salvaguardas ambientais sejam respeitadas ou, até, mais aprimoradas.
Não é o licenciamento que emperra as grandes obras, mas sim os estudos ambientais mal feitos
André Aroeira escreveu no Intercept sobre “a percepção de que o licenciamento é culpado por não termos estradas suficientes, ferrovias, linhas de transmissão, portos, usinas, indústrias, importantes projetos minerários”, citando vários exemplos comumente usados para “comprovar como o licenciamento é um entrave ao desenvolvimento do país.” Aroeira analisa os processos com uma boa e velha lupa para concluir que o grande entrave do licenciamento não é a falta de pessoal, de recursos ou de definições claras de atribuições, embora tudo isso acabe atrapalhando. O maior problema é a má qualidade dos estudos ambientais apresentados pelos empreendedores. Diz ele: “a maioria esmagadora (quase 90%) dos estudos ambientais precisa retornar aos empreendedores para complemento (…) Um vai-e-vem que emperra a decisão sobre as licenças, atrasa os ritos, sobrecarrega os órgãos ambientais e abre caminho para judicialização, que atravanca tudo mais um pouco. Cada estudo tem milhares de páginas, modelagens complexas em temas diversos e imensos buracos de informação. Quando finalmente são analisados, entram e saem da fila para pedidos de complemento.” Como exemplo, Aroeira cita os recentes pedidos de licenciamento feitos pelas petroleiras BP e Total para a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas. Ambas as solicitações foram e voltaram várias vezes, com o Ibama sempre solicitando dados e informações que não vieram. Há poucas semanas, o pedido da Total foi negado definitivamente. Aroeira faz a pergunta de muitos milhões de dólares: porque profissionais altamente qualificados fazem um trabalhinho tão fraco? E adianta duas respostas interessantes. Talvez saia mais barato entregar projetos incompletos e deixar para o Ibama a tarefa de pedir mais informações, não se perdendo, assim, tempo e dinheiro para a confecção de uma análise completa. Ou talvez os empreendedores esperem que o problema seja resolvido por pressões institucionais, já que vários dos projetos atendem a interesses poderosos, às vezes da própria União. Aroeira termina com uma nota sombria: “Vai ser desastroso para o país se o licenciamento deixar de ser a principal trincheira de defesa ambiental para se tornar, de fato, uma mera burocracia, a papelada inútil que o futuro presidente já o acusa de ser. Uma espécie de profecia autorrealizável cada vez mais próxima de se concretizar.” Os desastres de Mariana (MG), dos vazamentos de petróleo na baía de Guanabara (RJ) e da Hydro-Norsk (PA) que o digam, só para citar acontecimentos recentes.
Ayres Britto diz que Bolsonaro não pode mexer na Reserva Raposa Serra do Sol
O ex-ministro do STF, Ayres Britto, disse ontem que, por ter sido um processo transitado em julgado pelo Supremo, o futuro presidente não pode baixar um decreto desfazendo a Reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima. Ayres Brito ponderou com Bernardo Mello Franco, d’O Globo, que “as terras indígenas pertencem à União. Qual é o perigo para a soberania nacional? Nenhum”. E continua: “O usufruto dos índios não alcança a pesquisa e a lavra das riquezas minerais”, além de ter feito questão de dizer que as Forças Armadas não precisam consultar os índios ou a Funai para atuar na região. Ayres Britto reclama, como muitos outros, que “ficam dizendo coisas imprecisas, e até equivocadas, para projetar antipatia contra os índios. Depois que o Estado paga uma dívida histórica, civilizatória, ele não pode mais estornar o pagamento e voltar a ser devedor”.
Pecuaristas aumentam produção na Amazônia sem aumento de área
Gerson Freitas Jr., da Bloomberg, conta a história de pecuaristas que atuam na Amazônia e que, sem comprar mais terras, estão aumentando sua produção. Em parte da propriedade, eles plantam grãos para alimentar o gado, e adotam outras práticas que permitem confinar mais seu rebanho. Segundo Freitas, uma das empresas “plantou 3 mil hectares com grãos em suas quatro fazendas na região (… ) [e] cerca de 30 por cento do gado da empresa agora é alimentado em confinamento.” Freitas conta porque isso dá certo: “A rotação de lavouras e pastagem ajuda a fertilizar o solo, aumentando a quantidade de capim disponível para o gado, que ganha peso muito mais rápido e pode ser enviado para abate em menos de 20 meses, ante 36 meses em um sistema tradicional”. Um ganho de rendimento de 44%. Sem derrubar uma única árvore. O artigo, traduzido, foi publicado no UOL.
Consumo de água crescerá mais que a população
O Estadão teve acesso a projeções feitas pela Agência Nacional das Águas (ANA) para o consumo de água no Brasil. A ANA estima que, em 2030, o país consumirá 24% mais água do que agora, um crescimento de quase 1,8% ao ano. Para o mesmo período, o IBGE estima um crescimento da população de 8%. O que explica esse aumento são as previsões de crescimento da atividade econômica, em geral maior que 2% ao ano. A ANA também atribui o aumento à urbanização continuada do país. Marcelo Cruz, diretor da ANA, afirma que “a perspectiva de crescimento é elevada e inspira um sinal de alerta, para que tenhamos uma gestão compatível. Não significa que estejamos em um cenário fora do controle, porque nossos números de oferta de água são confortáveis. Por outro, há muito a ser feito. Mais da metade das águas que retiramos dos nossos mananciais e produzimos não chega ao consumidor, por problemas de infraestrutura.”
As águas brasileiras foram suficientes para que só ocorressem disputas pontuais entre os usos de irrigação, geração de energia e abastecimento da população. Normativamente, a prioridade é o abastecimento da população. A ver como isso se desenrola num próximo governo que terá um poderoso ministério da agricultura.
Os interesses econômicos que agiram na COP24
O físico Paulo Artaxo conversou com o Direto da Ciência sobre a pressão exercida pelos três maiores produtores de petróleo e gás – EUA, Rússia e Arábia Saudita – e pelo Kuwait, outro importante ator dessa esfera, para enfraquecer o texto final da COP24. “Houve uma grande briga na reunião sobre incluir ou não uma referência mais enfática ao relatório no texto final. O que alguns países como a Arábia Saudita e os Estados Unidos estão deixando claro é que farão o possível e o impossível para bloquear qualquer aumento nas ambições”. Artaxo ainda acrescentou que “os Estados Unidos, sob liderança de Donald Trump, mostraram que estão trabalhando para boicotar o Acordo de Paris. Mesmo que não saiam do Acordo, tentarão sabotá-lo. Eles estão respondendo aos interesses da indústria de combustíveis fósseis”.
A indústria fóssil sabe que tem os dias contados e busca esticar seu prazo de validade até onde for possível usando de todos os meios a seu dispor. Lembrando que o pré-sal brasileiro tem papel de destaque nos planos petroleiros mundiais, embora ainda não tenha despontado nos planos climáticos nacionais.
O carvão nas planilhas internacionais
A Agência Internacional de Energia (IEA) publicou a edição 2018 de seu relatório sobre o carvão, prevendo que a demanda seguirá estável pelos próximos cinco anos, apesar dos vários questionamentos que enfrenta. A IEA lista pressões contrárias ao combustível fóssil vindas da questão da qualidade do ar, das políticas climáticas, de campanhas de desinvestimento, de anúncios de fechamentos e falências, da queda dos custos das renováveis e da concorrência cada vez maior com o gás natural. A Agência estima que a participação do carvão na matriz energética mundial cairá dos atuais 27%, para 25% em 2023. A Índia continuará a puxar a demanda a quase 4% ao ano. Os países do sul e do sudeste da Ásia respondem pelo restante do consumo, muito por incentivo da iniciativa chinesa ‘Belt and Road’ que, não muito discretamente, está transferindo térmicas sujas para seus vizinhos, de quem compra os excedentes de eletricidade. A rede americana NBC fez fez uma reportagem sobre a expansão no sudeste asiático e o Carbon Brief fez uma matéria bem mais crítica.
Em tempo: ontem a megacorporação japonesa Mitsubishi anunciou a venda de sua participação em duas grandes minas de carvão australianas, encerrando a participação do conglomerado na geração térmica a carvão. A Mitsubishi, dona de um grande parque siderúrgico, continuará presente no mercado de carvão destinado à fabricação de aço e outros metais.
A ‘Transição Justa’ ganha corpo
A preocupação com a ‘transição justa’ (dos fósseis para os renováveis) se concentrava mais na Academia do que no mundo político. A novela ‘Macron contra os Coletes Amarelos’ inverteu esta ordem e levou o assunto a ocupar um espaço importante durante as duas semanas da COP24, a ponto de a presidência da Conferência publicar a Declaração da Transição Justa que abre dizendo que “considerar o aspecto social para uma transição para uma economia de baixo carbono é crucial para conseguir a aprovação social para as mudanças que estão ocorrendo. Políticas públicas para reduzir emissões enfrentarão resistências da sociedade e riscos políticos significativos para os governos que as implementem, se não forem acompanhadas de programas de seguridade social para os trabalhadores cujos empregos serão perdidos ou transformados. Por estas razões, o tema da transição justa é uma questão essencial para governos, parceiros sociais e organizações da sociedade civil.” 54 países assinaram a declaração. O Brasil não. O Instituto Grantham, associado à London School of Economics, comentou a declaração apontando que o conceito deve reverberar em discussões nacionais e internacionais em pelo menos cinco domínios: políticas públicas, governança, estratégia econômica, finanças e enfoque local/regional.
As Forças Armadas dos EUA sofreram prejuízos bilionários com os eventos extremos de 2018
Em depoimento feito a um comitê do Senado norte-americano, o Senador Tim Kaine disse que o prejuízo causado pelo furacão Michael à Base Aérea Tyndall está estimado em US$ 5 bilhões. E isso porque, antes da chegada do furacão, a força aérea mandou todos seus modernos aviões de combate para bases mais seguras. Antes do senador, o General Robert Neller disse que o furacão Florence causou um prejuízo de cerca de US$ 3,6 bilhões ao Camp Lejeune dos fuzileiros navais. Uma matéria do Inside Climate News avança mais contas dos prejuízos sofridos pelas forças armadas dos EUA neste ano com dois avisos: o ano ainda não acabou e nem as contas e a elevação do nível do mar ainda é uma ameaça futura.
Erramos
A fração da Reserva Legal na Mata Atlântica é de 20% da área da propriedade e não de 35% como escrevemos ontem. Os 35% a tirariam do purgatório, segundo Marcelo Leite. Agradecemos a Luis Fernando Guedes Pinto pelo aviso.
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