Óleo no Nordeste: população se mobiliza, governo parece ter visões distintas do problema e segue faltando transparência

óleo no Nordeste

Mobilização da sociedade: O óleo continua chegando em grande volume no litoral nordestino. Moradores de diferentes localidades têm se mobilizado e trocado informações em grupos de WhatsApp sobre a chegada do óleo em novas localidades ou em regiões que já haviam sido limpas. Em Pernambuco, no Cabo de Santo Agostinho, cerca de mil pessoas participaram ontem de uma grande operação que retirou 150 toneladas do material tóxico das praias. Na Bahia, as praias da ilha do Morro de São Paulo, o 3º mais importante destino turístico do estado, amanheceram ontem interditadas para turistas por conta da poluição, no que foi o primeiro registro de óleo em grande quantidade em praias ao sul de Salvador. No final da tarde, a prefeitura da região anunciou que havia removido 1,5 tonelada de óleo do litoral da ilha e liberado o acesso a praias, embora seguisse não recomendando banhos de mar. Em Salvador, um grupo de pescadores e marisqueiros do Recôncavo Baiano ocupou a sede do Ibama ontem pela manhã: “Nós queremos saber o que será feito para as manchas de óleo não afetarem os manguezais. Somos os mais prejudicados por esse crime ambiental e eu não sei como vamos sobreviver. O descaso do governo está nos matando”

Salles minimiza problema enquanto Mourão mobiliza exército: Apesar da mobilização da sociedade e das imagens de contaminação que não param de chegar, o ministro do meio ambiente foi a Pernambuco e, lá, minimizou o problema. Salles disse ter percorrido todo o litoral do estado e que havia apenas um ponto com manchas de óleo, que até o fim do dia seria retirado. Mourão, presidente em exercício, parece ter outra opinião: na 2ª feira anunciou que 5 mil homens do Exército passariam a ajudar na limpeza das praias atingidas. Segundo o ministro da defesa, Fernando de Azevedo e Silva, o governo Bolsonaro não considerava necessária a entrada de homens do Exército nos trabalhos de limpeza das praias do Nordeste até que o produto começou a aparecer em maior quantidade e em mais localidades.

Falta transparência nas investigações: Em carta protocolada ontem junto ao governo federal, pesquisadores, ambientalistas e artistas afirmam que não há transparência na investigação e na operação de contenção e limpeza do óleo: “Pedimos que seja dada mais transparência ao caso, que já afeta tantas populações locais ao longo do litoral nordestino”, diz a carta, que repudia “o caráter sigiloso das informações”.

Suely Vaz de Araújo, ex-presidenta do Ibama, disse ao El País que “o Ibama acompanha a contaminação desde o início, mas não acionou formalmente o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água (PNC). Ele prevê uma estrutura organizacional e a autoridade nacional responsável, além de um comitê executivo, um grupo de acompanhamento e avaliação, um comitê de suporte, tudo com a participação do ministério do meio ambiente, minas e energia, transporte, marinha, Ibama (…) Todos esses órgãos já estão acompanhando a situação, mas o decreto prevê um sistema de resposta absolutamente organizado e coordenado, em rede. Não estamos vendo isso acontecer conforme o previsto no decreto.”

Atraso: O Estadão confirmou o que escrevemos aqui ontem: o PNC só foi oficialmente formalizado por Salles no dia 11 de outubro, 41 dias depois de terem surgido as primeiras manchas de petróleo no litoral.

Sobre o PNC, uma nota da entidade de servidores dos MMA, Ibama, ICMBio e SFB afirma que o atraso no acionamento do Plano de Contingência gerou “ações desarticuladas e sem fontes de recursos orçamentários necessárias para a situação de emergência”.

De onde veio o óleo? O comandante da Marinha, Ilques Barbosa, disse ontem que o governo está concentrando as investigações sobre as causas da mancha de óleo em 30 navios de dez países diferentes. Mas, para ele, a maior probabilidade é que o vazamento tenha partido de um navio irregular, um dark ship.

Repercussão internacional: “Há uma clara aversão à inação do governo”, disse ao Guardian o professor Marcus Melo, da UFPe: “O governo tem uma certa miopia para entender o quão sério isso é”. Também ao Guardian, José Álvaro Moisés, professor sênior de Ciência Política, da USP, observou que, em abril, o governo de Bolsonaro dissolveu dois comitês que faziam parte do Plano Nacional de Contingência para derramamentos de petróleo. “A posição do governo é contra a defesa do meio ambiente”, disse ele.

 

ClimaInfo, 23 de outubro de 2019.

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