Propaganda pró-Salles não teve o aval de empresas

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Na 3ª feira (26/5), os principais jornais do Brasil estamparam um anúncio em defesa da gestão de Ricardo Salles no Ministério do Meio Ambiente assinado por diversas associações setoriais. Eram tantos nomes que não dava para ler direito e identificar quem eram os signatários da peça. Quem olhasse apenas a sopa de letras poderia imaginar que o apoio das organizações empresariais à política ambiental brasileira atual era generalizado e amplo. No entanto, como muita coisa vinda desta gestão, boa parte daquilo era fake news.

Algumas das principais empresas filiadas às associações signatárias do anúncio rejeitaram seu envolvimento e contestaram a participação das associações setoriais. Entre elas a Natura e a Avon, filiadas à Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC), uma das signatárias do anúncio. As duas empresas disseram não aprovar a peça e não terem sido consultadas sobre ela. “Os índices de desmatamento no Brasil são alarmantes e existe uma urgência real por mais fiscalização e cumprimento da legislação. A gente discorda dessa manifestação de apoio”, respondeu a Natura. O Boticário foi na mesma direção e adicionou pedido à ABIHPEC para que esta retire sua assinatura do anúncio.

O Beach Park também contestou seu envolvimento no anúncio e acusou a Associação para o Desenvolvimento Imobiliário e Turístico do Brasil (ADIT), outra signatária da peça, de não ter feito nenhuma consulta aos seus associados: “O Beach Park não foi consultado sobre esse material e não tinha conhecimento da publicação”, informou a empresa no Twitter. “Já formalizamos nossa reclamação à ADIT e pedimos a desfiliação da associação. Estamos juntos com todos os que defendem o meio ambiente”.

Da mesma forma, o gigante da hotelaria francesa, Accor Group, acusou a ADIT de não ter consultado seus associados sobre o anúncio. “[A] Accor é fortemente comprometida em reduzir sua pegada de carbono. Esse anúncio não representa nem os valores do Grupo nem seu engajamento diário. Estamos em contato com a associação e pedimos por um esclarecimento oficial”.

Também responderam na mesma linha o grupo Bourbon de hotéis, os resorts Txai, a L’Occitane, a Mars (Whiskas, Pedigree e Royal Canin), a licenciadora da marca Turma da Mônica, a Batavo e a gigante do agro Marfrig.

O anúncio em favor de Salles pode ter aprofundado ainda mais o racha dentro do agronegócio brasileiro. No Valor, Daniela Chiaretti e Fernando Lopes falam de uma divisão entre empresas exportadoras, mais modernas e sensíveis aos humores do mercado externo, e entidades mais conservadoras, fortemente alinhadas com o governo Bolsonaro.

Já o De Olho nos Ruralistas fez uma análise detalhada sobre os signatários do anúncio e identificou que alguns deles também são os principais financiadores da bancada ruralista no Congresso Nacional.

Ainda que o agronegócio tenha sido o carro-chefe do anúncio pró-Salles, a articulação em torno dele saiu do setor de construção civil, informa Mauro Zalafon na Folha. Isso é nítido na lista de signatários: das 87 entidades que assinaram o anúncio, apenas 30 são relacionadas ao agronegócio; todas as demais estão ligadas às áreas de comércio, indústria, construção e administração de imóveis urbanos.

Em tempo 1: Atingido em cheio pelo “boiada-gate” de Ricardo Salles, o PL 2.633 tenta avançar na Câmara dos Deputados depois de ter sido retirado da pauta da Casa na semana passada em virtude de desavenças entre o texto do relator Marcelo Ramos (PL-AM) e o governo federal e a oposição da sociedade civil. Ramos informou ontem que insistirá na votação do PL, eventualmente ainda na semana que vem. O governo segue pressionando para que o PL incorpore os pontos mais problemáticos da falecida MP 910, como a ampliação da isenção de vistoria para imóveis de até 15 módulos fiscais e a mudança da linha de corte temporal para titulação das terras de 2008 para 2012.

Em tempo 2: O ministro Salles parece estar fazendo escola. A ministra de energia da província canadense de Alberta disse, em uma entrevista, que “agora é um ótimo momento para construir um oleoduto porque não pode haver protestos com mais de 15 pessoas. Vamos construí-lo.” Segundo a matéria do The Globe and Mail, o entrevistador achou graça e riu. A ministra, não.

 

ClimaInfo, 28 de maio de 2020.

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