O saldo da primeira semana do Brasil na COP26

Brasil na COP26

Os três minutos do discurso de Bolsonaro na abertura da COP26 foram concedidos em troca da assinatura da Declaração de Florestas anunciada no início do encontro em Glasgow. Ana Carolina Amaral apurou para a Folha que a condição foi imposta pelo Reino Unido pois “não faria sentido dar palco para um país que não estivesse disposto a assumir compromissos climáticos”.

Segundo o Estadão, os EUA reconheceram que o Brasil fez “anúncios significativos” neste início da COP26. Mas tais acenos de Bolsonaro na pauta ambiental – uma prioridade da diplomacia de Washington – não foram suficientes para destravar a relação entre os presidentes dos dois países: “O papel do Brasil na COP26 tem sido muito bom, vamos ver o que acontece na próxima semana. Espero que com ajuda do Brasil possamos chegar a um consenso sobre o artigo 6”, afirmou Douglas Koneff, encarregado de negócios da embaixada dos EUA em Brasília.

É greenwash, afirmou taxativamente o ombudsman da Folha ao comentar o que ele chama de diversionismo do atual governo neste momento: “Da noite para o dia, o país estabelece metas e assina tratados sem explicar como irá cumpri-los. “O como fazer é questão interna nossa”, declara Hamilton Mourão. “Agora nós entramos de cabeça”, afirma Paulo Guedes. Só falta Bolsonaro anunciar que vai proibir carne vermelha na cozinha do Planalto.”

Como lembra a Economist, o Brasil costumava ser um dos protagonistas nas negociações climáticas globais. Não mais. Para a revista liberal, esta mudança de status é reconhecida pelo próprio governo brasileiro, e cita a frase proferida por Mourão – o general-vice – ao explicar porque Bolsonaro decidiu não participar da COP26: “Todos lhe atirariam pedras”.

A nova condição brasileira de pária nas negociações climáticas não surgiu do nada. Os dados do desmatamento estão aí para contrarrestar quaisquer declarações de boas intenções. E os novos conhecimentos trazidos pela ciência só pioram o quadro de destruição ambiental. Somente os incêndios florestais, se contabilizados, aumentariam em 21% as emissões anuais de gases estufa relacionadas ao desmatamento na Amazônia nos últimos 15 anos, conforme informa um novo estudo lançado pelo IPAM em Glasgow. Comentando o estudo, uma matéria da Eco 21 informa que os incêndios florestais geraram quase 1,3 bilhão de toneladas de CO2 entre 1990 a 2020, contando tanto a combustão quanto a decomposição. Já o Monitor da Floresta, apresentado também  em Glasgow, mostra que 9 milhões de árvores tombaram desde o início da cúpula. Matéria do InfoAmazônia sobre o Monitor mostra que nos primeiros seis dias da COP de Glasgow, mais de 9 milhões de árvores foram ao chão na Amazônia brasileira. O total derrubado desde o início deste ano é de mais de 470 milhões de árvores, 1.059 árvores por minuto ou 17 árvores por segundo.

Como o país pode sair desta condição de pária? Em entrevista concedida a Cristiane Fontes e Marcelo Leite na Folha, a ecóloga, professora da UnB e coautora do relatório do Painel Científico sobre a Amazônia, Mercedes Bustamante, diz que a prioridade é zerar o desmatamento, legal ou ilegal, “sem adjetivos”. Ela diz também que, ao não controlar o desmatamento nem investir em adaptações às mudanças climáticas, o atual governo coloca a economia do país em risco.

Em tempo: O discurso firme da jovem Txai Suruí, do povo Paiter Suruí de Rondônia, deixou nervosos o governo brasileiro e seus apoiadores. Desde que disse no palco de abertura da COP26, que os animais estão desaparecendo, os rios, morrendo e seus parentes sendo vítimas de crescente violência, Txai tornou-se alvo dos ataques do bolsonarismo, enquanto deu o tom ao protagonismo indígena na Conferência da ONU. Por conta dos ataques bolsonaristas à Txai e aos demais indígenas, o Brasil recebeu no sábado (6/11) o antiprêmio Fóssil da Semana, concedido por Climate Action Network, uma rede de mais de 1.500 organizações, aos países que “fazem o melhor para ser os piores” na COP26. Segundo a CAN, o país mereceu o troféu da vergonha por conta do “tratamento tenebroso e inaceitável aos povos indígenas”.

 

ClimaInfo, 8 de novembro de 2021.

Se você gostou dessa nota, clique aqui para receber em seu e-mail o boletim diário completo do ClimaInfo.