Mesmo com marco regulatório, investimentos em saneamento ainda não deslancharam no Brasil

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Quase 100 milhões de brasileiros ainda vivem sem coleta e tratamento de esgoto e cerca de 40 milhões não têm acesso à água potável, de acordo com dados do Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030 lançados no ano passado. Ou seja, quase metade da população do Brasil sofre com alguma restrição relacionada a serviços básicos de saneamento. No entanto, o novo marco do saneamento, aprovado em julho de 2020, ainda não conseguiu entregar sua principal promessa – destravar os investimentos em infraestrutura para ampliar o acesso da população a esses serviços.

“Embora importante para trazer os recursos privados para o investimento em saneamento, o novo marco legal repete a visão criada na década de 1970, de saneamento como obra de engenharia”, disse Guilherme Checco, do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), à Amália Safatle no Valor. Um dos problemas centrais da nova legislação, de acordo com ele, está na falta de inovação por meio de soluções descentralizadas e na consideração das projeções de mudança do clima sobre a infraestrutura de saneamento.

De toda maneira, o marco regulatório foi importante para atrair novos atores. No Valor, Roberto Rockmann informou sobre a aproximação de investidores como Itaúsa, Equatorial, Brookfield e Iguá, com o setor de saneamento. Os estados também estão aproveitando a nova legislação para avançar com parcerias público-privadas e concessões dos serviços de água e esgoto, além da privatização de empresas estatais do setor.

Mas o caminho da universalização do saneamento ainda é longo e acidentado. Uma análise do Instituto Trata Brasil mostrou que o abismo de investimentos entre as cidades com melhores e os piores índices de saneamento e acesso à água potável é grande. Enquanto o top 20 de municípios desembolsa em média R$ 135,24 anuais por habitante, os 20 municípios na parte de baixo do ranking gastam apenas R$ 48,90. Nos últimos cinco anos, isso se refletiu em investimentos desiguais: enquanto os municípios com melhor saneamento e acesso à água investiram R$ 17 bilhões nesses serviços, aqueles com piores indicadores gastaram somente R$ 3,8 bilhões. A Folha deu mais detalhes sobre o levantamento.

Em tempo: Embora o Brasil figure entre os dez países que mais usam água subterrânea, entre 80% e 90% dos poços em funcionamento por aqui são irregulares, afirmou ao Valor o geólogo Ricardo Hirata, da Universidade de São Paulo (USP). Enquanto o Sistemas de Informações de Águas Subterrâneas (SIAGAS) do Serviço Geológico Brasileiro registra cerca de 348 mil poços cadastrados no Brasil, o Censo Agropecuário do IBGE de 2018 encontrou 2,6 milhões de poços. Dados da Agência Nacional de Águas mostram como o uso da água subterrânea é disseminado no Brasil: 40% das áreas urbanas do país são atendidas somente por águas exploradas no subsolo, sendo que mais da metade (52%) são abastecidos total ou parcialmente por esse tipo de fonte.

 

ClimaInfo, 23 de março de 2022.

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