Narrativas e seus vieses na cobertura socioambiental

Nesta aula, a professora Raquel Longhi, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), fala sobre como as narrativas e seus vieses influenciam na cobertura socioambiental. Ela ressalta a importância de conhecermos o nosso lugar de fala, e a influência dele no enquadramento da notícia que podemos utilizar na cobertura jornalística sobre as questões sociais e ambientais.

Destaques da aula:
  • Ao contar uma história, todos trazem consigo um viés construído a partir de experiências, ideologias e valores preestabelecidos.
  • O jornalista escolhe o que contar e como contar, e sua decisão é carregada de aspectos conscientes e inconscientes.
  • Uma narrativa é composta de nuances e, para realizar uma cobertura socioambiental responsável, é preciso, antes, ter consciência delas.
  • O jornalista deve reconhecer o seu poder – chamar para o engajamento, chamar para a participação política e social.

Todo ser humano, ao contar uma história, traz consigo um viés construído a partir de suas experiências, ideologias e valores preestabelecidos. Isto não é diferente para os jornalistas, como explica a professora Raquel Longhi, da Universidade Federal de Santa Catarina.

Ao narrar um fato, ou até mesmo ao escolher quais fatos narrar, o jornalista leva em consideração o contexto, mas ele escolhe também o que contar e como contar, e a sua decisão é carregada de aspectos conscientes e inconscientes.

Raquel cita um exemplo de uma foto tirada no começo de 2020, por um profissional da agência Associated Press. Cinco ativistas pelo clima, dentre elas Greta Thunberg, protestavam no Fórum Econômico de Davos e foram clicadas lado a lado. Ao distribuir a foto, um dos editores da agência cortou especificamente a ativista ugandesa Vanessa Nakate – única negra retratada na imagem. Isso gerou mobilização e muitas reclamações e deixou claro um lugar de fala introjetado de preconceito, que não cabe na cobertura socioambiental.

Em sua conta no Twitter (@vanessa_vash), Vanessa Nakate escreveu o seguinte, ao apontar a edição da foto da qual foi excluída pela AP: “Você não apenas apagou uma foto, você apagou um continente. Mas estou mais forte do que nunca”. O caso ganhou ampla repercussão internacional, e,  posteriormente, a agência se desculpou.

Uma das coisas mais fundamentais que precisamos levar em consideração é que estamos narrando o humano e vivemos em um contexto de desigualdade social e de injustiça climática. Temos de reconhecer o nosso lugar de fala, como lidamos com (ele), e qual é a nossa responsabilidade”, ressalta a professora.

Outro aspecto relevante é a possibilidade de ação política inerente a toda narrativa. Iniciativas independentes, como a da Agência Pública, ou do portal AzMina, têm usado esse poder de forma transparente e eficiente, se colocando de forma clara em seu lugar de fala e entregando conteúdos com reconhecimento de seu poder de convocação.

Uma narrativa é composta de nuances. Para que a cobertura jornalística seja realizada de forma responsável, é preciso, antes, se ter consciência dessas nuances que atravessam a própria produção jornalística. Linguagem, ferramentas, imagens, dados e contexto se somam para a entrega de mensagens que informem e colaborem com a construção da justiça climática.

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Agência Pública
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Portal AzMina
A crise ambiental é problema de mulher?
Elas no Congresso
https://www.elasnocongresso.com.br 
The Guardian
2020 The Guardian’s climate pledge
Knight Center – (Simpósio Internacional de Jornalismo Online – ISOJ)
Innovación en el periodismo digital latinoamericano: cinco proyectos exitosos
Blog Ecoa (UOL)
Racismo Ambiental: comunidades negras e pobres são as mais afetadas por crise climática

Sobre a professora:

Raquel Longhi é professora do programa de pós-graduação em Jornalismo e do curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Desenvolveu pesquisas de pós-doutorado no Departamento de Comunicação Audiovisual e Publicidade da Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade Autônoma de Barcelona, em 2019, e no Centro de Investigação em Mídia e Jornalismo da Universidade Nova de Lisboa, em 2013. Coordena a Rede de Pesquisa Aplicada Jornalismo e Tecnologias Digitais/Jortec, credenciada à Sociedade Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo (SBPJor). É graduada em Comunicação Social pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (1985), mestre em Comunicação e Informação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1998) e doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2004).