PF intercepta oferta de ajuda do presidente da FUNAI a servidor preso por arrendar Terras Indígenas; Marcelo Xavier responde

Presidente FUNAI ligação interceptada
reprodução vídeo g1

O delegado da Polícia Federal, Marcelo Augusto Xavier, que ocupa atualmente a presidência da FUNAI, teve um telefonema seu interceptado por investigadores da própria corporação em uma investigação sobre arrendamento ilegal de áreas dentro de Terras Indígenas no Mato Grosso. De acordo com O Globo, Xavier teria oferecido apoio a um servidor da FUNAI que está detido sob suspeita de participação no esquema criminoso.

O servidor em questão é Jussielson Silva, ex-coordenador da FUNAI no município de Ribeirão Cascalheira, preso em março passado na operação Research Capta. Militar reformado da Marinha do Brasil, Jussielson foi detido com outros dois militares que serviam junto com ele na FUNAI – o sargento da Polícia Militar do MT Maximiliano Rodrigues de Souza e o ex-PM amazonense Enoque Bento de Souza. À época, a PF também prendeu o cacique xavante Damião Paridzané, acusado de facilitar o esquema de arrendamento.

Antes de ser preso, Jussielson fez contato telefônico com Xavier, no qual relatou ao então chefe a movimentação da PF em torno da suspeita de arrendamento ilegal em Terras Indígenas. Segundo a reportagem, com base na conversa interceptada, Xavier teria reclamado sobre o caso e contatado a delegacia da PF responsável pela investigação. “Eu falei agora com o chefe da Delegacia aqui e me parece que eles tão com uma má vontade enorme. Eu vou dar ciência já do caso ao corregedor lá de MT, ao corregedor nacional da PF aqui [em Brasília] e já vou acionar nossa corregedoria pra atuar nisso aqui. Pode ficar tranquilo”, disse o presidente da FUNAI.

A reportagem também citou um relatório da PF encaminhado à Justiça Federal na qual os investigadores alegam que “é possível concluir que o presidente do órgão, Marcelo, tem conhecimento do que está se passando, sendo possível que esteja dando sustentação à ilegalidade ora investigada”. O documento também sugere que a conduta de Xavier mostra uma “disposição” por parte do chefe da FUNAI de “interferir no trabalho investigativo da PF”. g1 e UOL também repercutiram essa revelação.

Em respeito à lei 13.188/15 (direito de resposta), atualizamos o texto desta nota no dia 26 de setembro de 2022 para garantir o direito de resposta ao presidente da Funai, Marcelo Augusto Xavier da Silva (processo número 08620.008188/2022-62).

“Recentemente, o presidente da Funai, Marcelo Xavier, enviou ofício à Polícia Federal exigindo a instauração do competente inquérito policial para apuração do seu suposto envolvimento em arrendamento ilegal na Terra Indígena Maraiwatsede (MT), ou justificativa plausível para deixar de fazê-lo, sob pena de prevaricação.

No que se refere à sua atuação no processo de desintrusão da Terra Indígena Maraiwatsede, ressaltamos que nunca houve nenhum indício de que tenha atuado de forma parcial ou praticado alguma irregularidade, sendo mentirosas e ofensivas as narrativas dos veículos de comunicação com vazamento descontextualizados dos áudios. Tanto é verdade que durante o procedimento de desintrusão foi efetuado o indiciamento de mais de 40 pessoas que invadiram a respectiva área indígena. Foram indiciadas pela prática de crimes ambientais, conforme consta nos Inquéritos Policiais nº 10/2013, 11/13, 12/13, 12/12, 13/09, 13/12, 14/13, 14/12, 15/13, 15/12, 16/13, 16/12, 17/13, 14/12, 18/12, 19/13, 19/12, 20/12, 22/12, 28/13, 29/13, 30/13, 31/13, 32/13, 33/13, 34/13, 35/13, 82/12, 87/12, 111/11, 117/12, 191/12, 192/12, 193/12, 207/12, 75/13, 59/13, 133/13, 143/13 e 110/11, todos oriundos da Delegacia da Polícia Federal de Barra do Garças e presididos por Marcelo Xavier à época. Ressalta, ainda, que à época, por sua iniciativa, ocorreu a mensuração de danos ambientais, resultando em somas milionária para recomposição ambiental. Logo, absolutamente despropositada a tentativa de seu envolvimento na prática de atos ilícitos, os quais combateu, eis que quando lá esteve indiciou várias pessoas pela prática delitiva. 

É incompreensível essa sanha midiática em denegrir a imagem de Marcelo Xavier, recrudescida em momento pré-eleitoral, voltada para criar um ambiente social e familiar hostil, trazendo indevida repercussão na esfera criminal, ao proceder sensacionalismo irresponsável e manipular notícias falsas.

O caso que repercutiu envolve o áudio de uma ligação telefônica do investigado Jussielson Gonçalves Silva, à época Coordenador Regional da FUNAI de Ribeirão Cascalheira/MT, interceptado pela Polícia Federal, sendo o outro interlocutor o Presidente da FUNAI, Marcelo Xavier, que jamais foi investigado no caso em questão.

Foram divulgados trechos adredemente e maliciosamente selecionados de uma gravação de aproximadamente 05 minutos e deram ao caso uma narrativa totalmente insana e fantasiosa, com vinculação a fatos apurados posteriormente, dos quais o Presidente da FUNAI sequer havia ciência à época da ligação. Tratou-se de uma conversa rotineira de uma instituição na qual um subordinado lotado em região descentralizada da Sede relatava uma situação concreta de informalidade no requerimento de documentos oficiais, por autoridades policiais, sob pena de configurar crime de desobediência. 

Ao contrário do que foi veiculado de maneira deturpada, a questão tratada entre o Presidente da FUNAI e o então Coordenador Regional gira em torno da ausência de formalidade em requisição de informações por parte da Polícia Federal à FUNAI. Na ligação, Jussielson reporta ao Presidente que foi procurado por agentes da Polícia Federal, a pedido do Delegado Federal em Barra do Garças/MT, os quais requisitaram informalmente documentos que, segundo o então coordenador, tramitavam internamente na FUNAI sob o caráter sigiloso, razão pela qual ele não poderia fornecer tais documentos a terceiros sem a devida formalização. Afirmou, ainda, segundo sua versão, que foi ameaçado e coagido pelo Delegado da Polícia Federal e que achou toda a situação estranha e atípica. Por isso, o Presidente da FUNAI, entendeu que toda a questão que envolvesse o fornecimento de documentos deveria ser tratada formalmente, vez que a comunicação entre a Polícia Federal e a FUNAI é feita através do sistema SEI. Nessa senda, o Presidente orientou que Jussielson tratasse toda a questão de maneira formal, informou que Jussielson teria “toda sustentação” para que a informação entre a FUNAI e a Polícia Federal ocorresse via Sistema Eletrônico de Informações, obedecidos os aspectos formais, pois considerou inadequada a tratativa informal dada ao caso pelo Delegado da PF.

A narrativa acima encontra-se claramente delineada na degravação do diálogo assinada pelo Agente de Polícia Federal, Murilo Alves dos Reis, em 21/02/2022, da qual extrai-se a afirmação do próprio agente federal de que o diálogo interceptado refere-se a uma possível “ausência de formalidade de informações por parte da Polícia Federal ao órgão em que ambos são vinculados”. Para melhor entendimento, cumpre destacar a informação que foi omitida:

Por óbvio, a operação deflagrada pela Polícia Federal era sigilosa, razão pela qual o pedido de quebra de pedido de sigilo também se deu por sigilo processual. Isso significa que, por parte da Sede da FUNAI, em Brasília, não havia ciência de que o então coordenador se encontrava sob investigação por envolvimento com o arrendamento ilícito das áreas indígenas. O mandado de prisão preventiva em face de Jussielson foi cumprido em 17/03/2022, um mês após a interceptação telefônica.

Inclusive, a situação ilegal foi encaminhada pelo próprio Presidente da FUNAI, Marcelo Xavier, através do Ofício nº 1404/2021/PRES/FUNAI, datado de 17/09/2021, ao Departamento de Polícia Federal e também à Procuradoria da República de Barra do Garças/MT, através do Ofício nº 1478/2021/PRES/FUNAI, datado de 21/10/2021, sendo um paradoxo ululante imaginar seu envolvimento em um ato ilícito do qual solicitou a apuração. Cumpre registrar, ainda, que, em face de tais assuntos e para tratar de soluções na construção de um potencial Termo de Ajustamento de Conduta, a assessoria da Presidência da FUNAI efetuou reunião com a Procuradoria da República em Barra do Garças/MT, em 13/11/2021, ou seja, em aproximadamente 04 meses antes da deflagração da operação policial.

Ademais não é possível subsistir a falácia de que houve apoio ou amparo, pelo Presidente da FUNAI, ao servidor preso por suspeita de arrendar terras indígenas se a própria prisão do servidor ocorreu um mês depois da ligação telefônica gravada pela PF.

Levianas, portanto, as informações divulgadas que acabam chegando ao expectador de forma deturpada, o que, para um leigo, é aceito como a verdade absoluta. 

Repisa-se, ainda, que o apoio oferecido pelo Presidente da FUNAI ao então Coordenador Regional foi tão somente no âmbito administrativo, pois envolvia o envio de documentos à Polícia Federal, que, se utilizado da autoridade policial, requisitou informalmente os documentos, inclusive em prazo exíguo, sob pena de crime de desobediência. Era apenas essa a narrativa que o Presidente da FUNAI tinha conhecimento e foi sobre essa narrativa que o Presidente buscou a tomada de providências administrativas para, então, resguardar a FUNAI e os documentos oficiais e sigilosos no âmbito da FUNAI.

Pelo que se depreende, o ato ilícito foi localizado e realizado no âmbito da Coordenação Regional de Ribeirão Cascalheira/MT. É necessário esclarecer que o Presidente da FUNAI nunca questionou nenhuma investigação instaurada em desfavor do acusado, Jussielson Gonçalves Silva, bem como não mantém nenhum relacionamento e desconhece as pessoas de Enoque Bento de Souza, Gerard Maximiliano Rodrigues de Souza e Thaiana Ribeiro Viana, até porque não era de seu prévio conhecimento a existência de investigação envolvendo a apuração de alguma ilicitude praticada pelo respectivo servidor. A Coordenação Regional de Ribeirão Cascalheira/MT é Unidade Gestora, órgão descentralizado, com autonomia para firmar contratos, realizar licitações e propor indicações para as nomeações, conforme Regimento Interno da FUNAI (Portaria 666/MJSP/FUNAI/2017 e Decreto 9.010/2017), pelo que não mantemos nenhum relacionamento e desconhecemos as pessoas de Thaiana Ribeiro Viana, Gerard Maxmiliano Rodrigues de Souza e Enoque Bento de Souza.

Marcelo Xavier, portanto, não tinha ciência da Operação Res Capta, tampouco da condição de investigado de Jussielson. O Presidente da FUNAI, exatamente por ser da carreira da Polícia Federal, tem a plena ciência de que quaisquer requerimentos entre instituições, inclusive autoridade policial, deve tramitar através dos sistemas oficiais, em observância aos princípios da Administração Pública.” 

ClimaInfo, 26 de agosto de 2022, atualizado em 26 de setembro de 2022.

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