A crise climática e “os miseráveis” do século XXI

miseráveis século XXI
Cristiano Mariz/VEJA

Em seu novo livro, “Uma Breve História da Igualdade”, o economista francês Thomas Piketty argumenta que a dificuldade dos países pobres em lidar com os efeitos da mudança do clima – e a indisposição dos países ricos em se responsabilizar pela injustiça climática criada por eles – pode servir de combustível para novas revoltas sociais contra os ricos e poderosos.

“A atenuação dos efeitos do aquecimento global e o financiamento de medidas de adaptação para os países mais afetados (em particular no Sul [Global]) demandam uma transformação total do sistema econômico e da distribuição das riquezas, o que passa pelo desenvolvimento de novas coalizões políticas e sociais em escala mundial. A ideia de que todos sairiam ganhando é uma perigosa e atenuante ilusão, que precisamos abandonar o mais rápido possível”, escreveu o economista, citado pela Folha.

Em entrevista ao Estadão, Piketty aprofundou sua reflexão. “É importante que o Hemisfério Sul receba parte dos impostos cobrados da riqueza gerada pelo Hemisfério Norte. Acho muito importante que os países em desenvolvimento se unam para cobrar propostas mais concretas, como as prometidas na COP21 em Paris, em 2015. É preciso dizer: ‘temos uma terrível inundação no Paquistão, temperaturas muito altas na Índia, e o dinheiro que seria colocado nos fundos relativos ao clima não está lá’. É necessário criar uma regra para isso”.

Ele também assinalou o papel que o Brasil pode ter nessa discussão em plano internacional. “O Brasil poderia se concentrar na proteção da Amazônia, do meio ambiente em geral, e reduzir substancialmente a exploração de recursos naturais”.

Em tempo: O mundo da crise climática pode se parecer com as ficções científicas dos anos 1960 e 1970, mas nem mesmo a criatividade de autores como Philip K. Dick e Isaac Asimov consegue dar conta da realidade que se avizinha – e que, em muitos casos, já é parte do cotidiano das pessoas. “Pensamos a literatura como vanguarda, mas ela é conservadora, segue aferrada a práticas do século XIX. Não podemos escrever sobre algo absolutamente real, cujas consequências vemos à nossa volta todos os dias, sem ganhar o rótulo de ficção científica”, argumentou o escritor indiano Amitav Ghosh, autor do livro “O grande desatino: Mudanças climáticas e o impensável”, ao jornal O Globo. Para ele, a ausência de questões ambientais na chamada “ficção séria” não é um problema de falta de inspiração dos autores, mas sim das limitações do romance enquanto gênero literário. “O desafio estético fundamental de nossa época é escrever sobre as mudanças climáticas e sobre o não humano, sobre os animais e as florestas. O discurso científico e a não ficção não podem retratar nossas respostas emocionais à crise ecológica. Só a literatura pode”.

 

ClimaInfo, 05 de outubro de 2022.

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