Clima, urbanização e desigualdade: os ingredientes do desastre no litoral norte de SP

tragédia litoral norte SP
Amanda Perobelli

As chuvas intensas que provocaram a morte de mais de 60 pessoas no litoral norte de São Paulo na semana passada contam apenas parte da história por trás da tragédia. Além do clima extremo, outros fatores ajudam a explicar o problema – em particular, o avanço das cidades sobre áreas de risco, a desigualdade social e o fracasso da política habitacional brasileira.

A Folha mostrou que a população do litoral norte paulista cresceu mais de 100% nos últimos 30 anos, o que resultou numa expansão ainda maior das áreas urbanas, de quatro vezes nesse mesmo período. Uma consequência disso foi o aumento das construções em áreas com elevado risco de deslizamento, junto à Serra do Mar.

A ocupação dessas áreas acaba sendo a opção mais barata para a população mais pobre, prejudicada pelo déficit habitacional e pelo fracasso das políticas recentes para o setor no Brasil. Até por isso, como assinalado por O Globo, muitos desses terrenos ocupados ficam em áreas públicas, como é o caso da Vila Sahy, que concentrou a maior parte dos mortos nas chuvas em São Sebastião: de acordo com a prefeitura, pelo menos 448 casas estão dentro do Parque Estadual da Serra do Mar, área de proteção integral.

O governo de São Paulo promete realocar as pessoas que vivem em áreas de risco em São Sebastião e outras cidades do litoral norte. O problema é que a pressão imobiliária e a falta de terrenos disponíveis dificultam uma solução viável para a construção de moradias seguras. O Globo também abordou esse desafio.

Essas dificuldades deixam ainda mais urgente a necessidade de medidas preventivas, como a instalação de sistemas de alerta sonoro por sirene, para evitar novos desastres no curto prazo, além de treinamentos e simulações para a população nas áreas de risco, para que elas possam escapar de possíveis desastres.

“Se esses eventos [extremos] serão mais frequentes e fortes no futuro, a população tem que ser treinada para respeitar o alerta, ser preparada para isso, sair de casa e ir a um lugar seguro, e não voltar”, alertou José Marengo, do CEMADEN, citado por Daniela Chiaretti no Valor. “Tem que se criar a percepção cultural no Brasil de que o alerta de desastre existe para ser respeitado. Se o clima está mudando, não há outra forma”.

Em tempo 1: Por falar em prevenção, a Folha tratou do caso do sistema de monitoramento de chuvas e alertas de desocupação emergencial da prefeitura do Rio de Janeiro. Criado em 2011, pioneiro no país, ele conta com 162 estações sonoras em 103 áreas com alto risco geológico. O sistema tem ajudado na prevenção de mortes em desastres naturais, especialistas ressaltam a necessidade de melhorias na definição de rotas de fuga e no acompanhamento das comunidades na resposta aos alertas.

Em tempo 2: A Folha também destacou o projeto Monan (Modelo para Previsão dos Oceanos, Superfícies Terrestres e Atmosfera), desenvolvido pelo INPE com o objetivo de criar um novo modelo matemático de previsão de tempo específico para o Brasil. “Será [um modelo] tão moderno e avançado como os modelos atuais dos EUA, Japão e Europa, com a vantagem de considerar as especificidades do Brasil”, explicou Gilvan Sampaio, coordenador-geral de Ciências da Terra do INPE.

ClimaInfo, 1º de março de 2023.

Clique aqui para receber em seu e-mail a Newsletter diária completa do ClimaInfo.