Emirados Árabes articulam aliança da indústria fóssil por descarbonização sem acabar com combustíveis fósseis

COP28 Emirados Árabes e fósseis
Bernd Von Jutrczenka / DPA via AP

De maneira discreta, o governo dos Emirados Árabes Unidos (EAU), anfitrião da próxima COP28, está articulando uma aliança internacional com empresas do setor de petróleo e gás para “descarbonizar” seus negócios, mas sem inviabilizar a produção de combustíveis fósseis. Sim, você não leu errado: eles querem descarbonizar, carbonizando.

O Financial Times deu mais informações. Batizada inicialmente de Global Decarbonization Alliance, a iniciativa pretende estabelecer uma meta de descarbonização líquida até 2050 a partir de emissões diretas (Escopo 1) e derivadas da energia consumida pelas empresas (Escopo 2). Sem nenhuma surpresa e com toda a comodidade, o compromisso deixa de fora as emissões indiretas (Escopo 3), o que incluiria as emissões indiretas, como as decorrentes da queima dos combustíveis fósseis pelos consumidores – a maioria esmagadora das emissões de carbono da indústria fóssil.

Esse contorcionismo climático é apenas mais um exemplo da atuação ambígua dos EAU na condução dos trabalhos prévios à Conferência do Clima de Dubai, programada para o final de novembro. Essa ambiguidade está presente nos níveis mais superiores das negociações: o presidente designado da COP28, Sultan Al-Jaber, também é CEO de uma das maiores petroleiras estatais do mundo.

“É difícil ver muita descarbonização nessa aliança”, comentou Thomas Hale, do Net Zero Tracker, que ressaltou que qualquer iniciativa honesta da próxima COP para engajar a indústria de combustíveis fósseis na agenda do net-zero precisa abordar as emissões de Escopo 3. “Os EAU, como produtores de petróleo e gás, têm uma grande oportunidade de ser a força transformadora para reunir toda a indústria para levar esse desafio a sério”.

O NY Times explicou parte do raciocínio utilizado por Al-Jaber e por representantes dos Emirados Árabes para justificar essa abordagem pró-fóssil. Para eles, combustíveis como petróleo e gás continuarão sendo importantes para a economia global, ao menos nas próximas décadas. Assim, os países e as empresas deveriam se focar no desenvolvimento e disseminação de tecnologias para captura e armazenamento de carbono da atmosfera (CCS, sigla em inglês).

Esse discurso tem sido repetido à exaustão por empresas petroleiras, aproveitando estudos científicos que indicam que mesmo a interrupção total das emissões de carbono não será suficiente para impedir mudanças climáticas mais profundas. No entanto, o argumento ignora outros aspectos levantados pela ciência, como o custo excessivo dessas tecnologias e as incertezas sobre sua capacidade de retirar carbono da atmosfera na proporção necessária para reduzir o aquecimento global.No plano multilateral, os países estão divididos sobre as possibilidades de CCS e o fim da queima de combustíveis fósseis. Como assinalou o Climate Home, enquanto a União Europeia segue pressionando pela definição de um prazo para acabar com o consumo de energia fóssil, as nações produtoras desses combustíveis querem redobrar esforços para viabilizar o CCS sem precisar mexer com seu core business.

ClimaInfo, 8 de maio de 2023.

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