A entrevista de Donald Trump e Elon Musk revelou o óbvio ulutante: que os queridinhos da extrema-direita global não sabem bulhufas sobre a crise climática.
Quem teve o desprazer de acompanhar a “entrevista” do bilionário Elon Musk com o ex-presidente dos EUA Donald Trump no falecido Twitter foi brindado com um show de horrores. Noves fora o mico técnico, que atrasou a conversa em quase uma hora, a dupla mais celebrada do momento pela extrema-direita global mostrou que, a despeito das tagarelices sobre o assunto, eles não sabem o básico do básico da ciência climática.
A começar pelo candidato republicano. Trump repetiu as asneiras de sempre sobre as mudanças climáticas: minimizou os riscos do problema, criticou os apelos de cientistas e ativistas para redução das emissões de gases de efeito estufa e mostrou toda a sua indiferença às vítimas dos eventos extremos.
“A maior ameaça não é o aquecimento global, onde o oceano vai subir alguns milímetros nos próximos 400 anos. (…) E você terá mais propriedades à beira-mar”, vomitou Trump. Para retificar: a expectativa de aumento do nível do mar não é de “alguns milímetros”, mas sim de 25 a 30 centímetros nos próximos 30 anos. Um aumento dessa proporção praticamente tornaria um dos orgulhos imobiliários de Trump, a infame Trump Tower em Nova York, em uma “propriedade à beira-mar”.
Nada disso foi rebatido por Musk, outrora defensor da urgência do enfrentamento à crise climática. O máximo que o dono da Tesla fez foi dizer que a transição energética seria necessária, mas não na velocidade defendida pelos cientistas. Musk também defendeu a continuidade do consumo de combustíveis fósseis e criticou a “difamação” do Big Oil.
“Se parássemos de usar petróleo e gás agora mesmo, estaríamos todos morrendo de fome e a economia entraria em colapso. Com o tempo, queremos mudar para uma economia de energia sustentável porque, eventualmente, você acaba ficando sem petróleo e gás”, disse Musk, ignorando completamente os repetidos alertas da comunidade científica sobre a urgência de acabar com a queima de combustíveis fósseis para evitar mudanças climáticas mais intensas.
O Guardian destacou a reação de cientistas e ativistas climáticos às baboseiras de Trump e Musk. Para o ativista Bill McKibben, a discussão “mergulhou em níveis inteiramente novos de estupidez” e foi “a conversa mais idiota sobre o clima de todos os tempos”.
“Os impactos danosos das mudanças climáticas, em particular de eventos extremos, estão, na verdade, em muitos aspectos, excedendo as previsões feitas há apenas uma década. É triste que Musk tenha se tornado um negacionista”, destacou o cientista Michael Mann, um dos principais pesquisadores internacionais sobre a crise climática.
A conversa entre Trump e Musk deixou claro que um eventual segundo governo do candidato republicano nos EUA desmontará todos os avanços conquistados nos últimos quatro anos pela gestão do democrata Joe Biden na seara climática. Não que faltassem evidências suficientes disso – afinal, isso está escrito e documentado no polêmico “Project 2025”, formulado por ex-auxiliares de Trump na Casa Branca como um roteiro de ação em caso de vitória nas eleições de novembro.
Entre as medidas propostas, estão a revogação da Lei de Redução da Inflação (IRA), que consolidou o primeiro pacote de medidas climáticas em nível federal nos EUA; o fim dos subsídios a fontes de energia renovável e carros elétricos (e aos teslas de Musk, será que ele não se deu conta disso?); e a liberação imediata de novas explorações de petróleo e gás em áreas federais.
Um estudo do think tank Energy Innovation (EI) estimou que a implementação das medidas anticlima propostas pelo Project 2025 resultaria no aumento das emissões de gases de efeito estufa dos EUA da ordem de 2,7 bilhões de toneladas acima da trajetória atual até 2030. Como apontou o Guardian, esse volume seria comparável às emissões totais anuais da Índia, o país mais populoso do planeta.
Não à toa, grupos ambientalistas e climáticos apostam na disseminação do Project 2025 entre o eleitorado norte-americano para informá-lo sobre o radicalismo político de um novo governo Trump e seus impactos potenciais na luta contra a crise climática. A Bloomberg deu mais detalhes.
Axios, NY Times e Washington Post, entre outros, repercutiram o show de idiotices climáticas de Trump e Musk.
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ClimaInfo, 15 de agosto de 2024.
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