Desmoralização da divulgação científica pode ser a nova estratégia do Big Oil para seguir desinformando o público sobre a crise climática e sua responsabilidade direta.
Comunicar sobre ciência é um desafio hercúleo para pesquisadores desde sempre. A dificuldade de equilibrar a complexidade do raciocínio científico, seu rigor e sua precaução, com a necessidade de um argumento informativo simples e direto já quebrou a cabeça de cientistas de todas as áreas, em todos os temas, sem uma solução convincente até aqui.
Porém, nos últimos anos, a disseminação das redes sociais e a emergência da figura do “influenciador” abriram novas possibilidades para a comunicação científica. Muitos cientistas se aventuraram no mundo da comunicação, com o intuito de contextualizar e explicar melhor suas pesquisas e descobertas.
Esse esforço também foi uma reação da comunidade acadêmica ao surgimento de discursos anticientíficos, patrocinados por interesses escusos dos mais diversos, que também ganharam tração nas redes sociais. Isso foi particularmente importante durante a pandemia de COVID-19, quando a negação à ciência se transformou em plataforma política da extrema-direita.
Um dos nomes que despontaram nesse período foi o do biólogo Átila Iamarino, influenciador com mais de 1,6 milhão de inscritos no YouTube e 1 milhão de seguidores no Instagram. Atacado pelos negacionistas da vacina, Átila acabou se tornando porta-voz da defesa da ciência como um todo.
Bem, ao menos essa era a visão que boa parte do público tinha de Átila até a semana passada, quando ele publicou um post publicitário destacando os benefícios do… petróleo. Isso mesmo: os combustíveis fósseis, principais causadores das mudanças climáticas que assolam o mundo atualmente, de acordo com a esmagadora maioria dos cientistas.
A postagem, a terceira de uma série, foi patrocinada por uma grande petroleira global como parte de uma campanha publicitária nacional que visa identificar o petróleo como uma “energia vital”. Repetindo um discurso bastante comum entre os países petroleiros nas COPs climáticas, a campanha distorce o conceito de transição energética para defender a continuidade da produção de combustíveis fósseis, como se eles fossem um “caminho” para a descarbonização da economia.
Como a jornalista e cineasta Thais Lazzeri assinalou no UOL, essa campanha não é acidental. Ela faz parte de uma estratégia antiga do Big Oil de distorcer e desinformar para manter sua “licença social”, a despeito de toda a destruição causada pela crise climática. A escolha do Brasil também não é aleatória: o país estará no centro das discussões globais em 2025, ano em que receberá a COP30 na cidade de Belém (PA).
A escolha de influenciadores científicos para estrelar a campanha publicitária não é uma surpresa, mas a decisão destes em aceitá-la não deixa de ser uma decepção. “Há anos as petroleiras contratam famosos para suas campanhas. O problema é quando este famoso, um influenciador, é um cientista bem informado. Não tem como não saber do impacto gigantesco do petróleo sobre as mudanças climáticas”, disse a atriz e influenciadora Laila Zaid ao Capital Reset.
ClimaInfo, 21 de outubro de 2024.
Clique aqui para receber em seu e-mail a Newsletter diária completa do ClimaInfo.