EPE não consegue justificar exploração de petróleo na foz do Amazonas

Margem Equatorial
Reprodução / Google maps

A estatal rebate artigos que criticam a busca por combustíveis fósseis com narrativas rasas e infundadas acionadas por defensores do petróleo “até a última gota”.

Shigueo Watanabe Jr. e Alexandre Gaspari, do ClimaInfo, questionaram em artigo no Valor quanto valerá em 2050 o petróleo da Foz do Amazonas – se de fato ele houver nas quantidades preconizadas pelos defensores da exploração de combustíveis fósseis na região. Para mostrar que, além de problemática ambiental e climaticamente, essa exploração causará prejuízos financeiros à Petrobras e, por tabela, à sociedade brasileira, usaram projeções da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) divulgadas no início de dezembro.

Semanas antes, o analista ambiental do IBAMA e doutor em planejamento energético pela Coppe/UFRJ Cristiano Vilardo também questionou a sanha dos defensores da exploração de petróleo no Brasil “até a última gota” em busca de explorar a Foz do Amazonas, em artigo n’O Globo. Vilardo lembrou o compromisso do transitioning away assumido na COP28 pelos países – Brasil incluído – e tratou do “lobby pró-petróleo”, que “fomenta uma narrativa de suposta escassez iminente no pré-sal e apela ao fantasma da perda de autossuficiência”.

A EPE publicou uma “nota de esclarecimento jornalística” respondendo aos dois artigos. A resposta da estatal de planejamento energético foi repercutida pelo Valor. E o que seu viu é o que Watanabe Jr., Gaspari e Vilardo apontaram: não há justificativa climática, muito menos energética ou econômica, para explorar petróleo numa região de altíssima sensibilidade ambiental como a foz. Apenas narrativas rasas a infundadas.

Afirma a estatal: “Não avançar em novas fronteiras exploratórias colocará o país em situação de vulnerabilidade energética que pode significar aumento nos preços dos energéticos, o que impactaria desproporcionalmente as camadas mais vulneráveis da população brasileira com uma elevação no nível de preços no setor produtivo e de serviços”.

No entanto, as projeções da EPE para o petróleo da foz – se for um volume comercialmente viável –, associadas às expectativas da Petrobras, apontam que essa produção só se daria após 2030. É quando a Agência Internacional de Energia (IEA) e a própria Petrobras apontam como o ano do pico da demanda petrolífera no mundo. A partir daí, haverá uma queda progressiva no consumo, com os volumes de 2050 sendo pouco mais da metade do consumido em 2030.

Em caso de sucesso exploratório, a EPE desenhou a curva da produção na foz: um pico de 300 mil barris por dia poderia ser atingido 14 anos depois do início da extração. Isso seria próximo a 2050. Portanto, quando esse petróleo já não seria tão necessário. Sobretudo pelo alto custo ambiental e climático associado a uma possível produção de combustíveis fósseis na foz do Amazonas. Um petróleo que valerá bem menos do que custará.

No seu levantamento sobre as possíveis reservas de petróleo na foz, a EPE faz a ressalva que se baseou em mapeamento sísmico e interpretação geológica para projetar reservas de 10 bilhões de barris de óleo equivalente (BOE) na região. Mas muitos desses estudos não são confirmados em campo. E perfurar poços na foz não é tarefa fácil – a própria Petrobras sabe disso.

O que parece não ter ficado claro para a EPE nos artigos é que não há qualquer questionamento à sua capacidade técnica de fazer projeções e estudos que são necessários para o planejamento energético do país. O que se critica é o discurso alarmista que aciona termos como “vulnerabilidade energética” e usa a falácia do petróleo como fonte de riqueza e desenvolvimento.

Hoje, o Brasil é exportador líquido de petróleo, e a Petrobras projeta estabilidade no consumo brasileiro de petróleo a partir de 2030. E mesmo após quase 20 anos da descoberta do pré-sal – então apontado como o “ponto da virada” no combate à pobreza no país –, a desigualdade econômica e social ainda é marcante. Porque o petróleo concentra renda, não a distribui. A história, aqui e em todo o mundo, está aí para provar isso.


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ClimaInfo, 17 de dezembro de 2024.

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