
O financiamento internacional para ação climática nunca foi um tema tão crucial como em 2025, com a intensificação de eventos climáticos extremos com impactos devastadores ao redor do mundo, particularmente nos países mais pobres e vulneráveis. No entanto, ao mesmo tempo, nunca foi tão difícil discutir este assunto como agora, com o recrudescimento do negacionismo climático e as pressões militaristas nas grandes potências.
Os recuos são ideologicamente ecléticos, abrangendo governos de extrema-direita à centro-esquerda. O caso mais radical é o dos Estados Unidos, cujo governo voltou ao colo do negacionista climático Donald Trump em janeiro. Desde então, com uma rapidez surpreendente, a Casa Branca vem desmontando todos os programas, políticas e objetivos do clima da gestão do ex-presidente Joe Biden, o que inclui também os compromissos de Washington para o financiamento climático.
Na frente doméstica, os cortes estão sendo encabeçados pela Agência de Proteção Ambiental (EPA), outrora bastião das políticas ambientais nos EUA. Nesta semana, o órgão acabou com um fundo de US$ 20 bilhões que financiava projetos de transição energética, criado em 2022 por meio do Inflation Reduction Act (IRA), o pacote climático aprovado por Biden no Congresso norte-americano. O caso foi judicializado, já que os beneficiários e a oposição democrata entendem que o governo não pode unilateralmente suspender um programa criado pelo Legislativo.
Já na frente externa, que envolve diretamente os compromissos dos EUA com financiamento climático, os cortes estão acontecendo por meio do desmonte da agência norte-americana de ajuda humanitária e internacional, a USAID. Um dos primeiros alvos de Trump em seu retorno à Casa Branca, o órgão foi totalmente paralisado e todos os projetos e doações relacionados a ele foram encerrados.
Na semana passada, o governo Trump formalizou a saída dos EUA do conselho que administra o Fundo de Perdas e Danos e sinalizou que não irá cumprir com a promessa da gestão Biden de doar US$ 17,5 milhões – um valor irrisório considerando os impactos climáticos da economia norte-americana. Para a Casa Branca, nada disso é relevante.
“Ao cortar abruptamente quase 10% dos fundos limitados para proteção climática em países em desenvolvimento, o governo Trump está efetivamente abandonando milhões de comunidades que não fizeram nada para causar o aquecimento global, mas que estão perdendo casas, meios de subsistência e vidas por causa disso”, lamentou Anne Jellema, diretora-executiva da 350.org, ao Guardian.
A tesoura não se limita aos negacionistas nos EUA. O governo do Reino Unido, liderado pelo premiê trabalhista Keir Starmer, contrariou seu próprio discurso de líder climático internacional e anunciou que pretende cortar o orçamento para ajuda internacional de 0,5% para 0,3% do PIB britânico. Os valores cortados serão destinados a fortalecer os gastos com defesa, que passarão a representar 2,5% da renda nacional. O Climate Home deu mais detalhes.
Na Europa, o discurso de cortes orçamentários para ajuda internacional também vem ganhando apelo político. Como destacou a AFP, países como Alemanha, Bélgica, França e Países Baixos já sinalizaram que pretendem reduzir esses montantes. Até mesmo a União Europeia, que sempre se gabou de ser uma das maiores financiadoras para ação climática internacional, estuda reduzir seus gastos nesta agenda. A Folha traduziu a reportagem.
A secura de recursos dos países desenvolvidos deixa as nações mais pobres e vulneráveis ainda mais pressionadas, em busca de alguma alternativa para conseguir lidar com os impactos do clima extremo. Um alvo alternativo potencial dessas demandas podem ser as economias emergentes, que vira-e-mexe tentam escapar das cobranças por mais atuação em financiamento climático.A Bloomberg destacou a avaliação da primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, sobre a necessidade de lideranças do Sul Global emergirem nessa discussão. Para ela, os países em desenvolvimento podem trabalhar juntos como uma forma de neutralizar a omissão do Norte Global. “Precisamos criar oportunidades uns para os outros, e eu realmente acredito que isso é inteiramente possível”, disse Mottley.