
Um júri em Mandan, no estado norte-americano de Dakota do Norte, condenou na última 4ª feira (19/3) o grupo ambientalista Greenpeace pela realização de protestos contra um gasoduto da empresa Energy Transfer há quase uma década. A sentença, criticada por juristas e especialistas, prevê o pagamento de mais de US$ 600 milhões como indenização por difamação, um montante que pode forçar o fechamento da entidade nos EUA.
Os protestos em questão aconteceram entre 2016 e 2017, quando o Greenpeace participou, junto com outras organizações ambientalistas e indígenas do Povo Sioux, de protestos contra o oleoduto Dakota Access, de propriedade da Energy Transfer e localizado na reserva de Standing Rock.
A empresa processou não apenas o Greenpeace norte-americano, mas também o escritório internacional da entidade, acusando-os de “incitar” as pessoas a protestar usando uma “campanha de desinformação”. Já o Greenpeace contestou a acusação, argumentando que as manifestações estavam protegidas sob a 1ª Emenda da Constituição norte-americana, que garante o direito à liberdade de expressão.
A entidade também criticou o pedido de US$ 300 milhões de indenização requisitado pela Energy Transfer, classificando a ação como um exemplo de “processo estratégico contra a participação pública”, ou SLAPP (na sigla em Inglês), visando coibir a liberdade de expressão por meio da judicialização.
Os jurados não apenas concordaram com os argumentos da Energy Transfer, como também concederam mais do que o dobro do valor requisitado pela empresa como indenização, condenando o Greenpeace a pagar US$ 660 milhões.
O resultado já era esperado por conta da composição dos jurados que participaram do caso. Mais da metade dos integrantes do júri possui conexões com a indústria de combustíveis fósseis, com posições contrárias aos protestos antifóssil e aos grupos ambientalistas em geral. O Greenpeace tentou transferir sem sucesso o julgamento para outra localidade.
“O que vimos nessas três semanas foi o flagrante desrespeito da Energy Transfer às vozes da tribo Sioux de Standing Rock. E enquanto eles também tentaram distorcer a verdade sobre o papel do Greenpeace nos protestos, nós, em vez disso, reafirmamos nosso compromisso inabalável com a não violência em todas as ações que tomamos”, disse Deepa Padmanabha, consultora jurídica sênior do Greenpeace, citada pelo Guardian.
Como o Guardian destacou, a condenação foi bastante criticada por organizações ambientalistas e juristas nos Estados Unidos. Para Rebecca Brown, CEO do Center for International Environmental Law (CIEL), o processo é “um exemplo clássico de instrumentalização corporativa do sistema legal para silenciar protestos e intimidar comunidades”.
A presidente tribal dos Sioux de Standing Rock, Janet Alkire, criticou a Energy Transfer por tentar calar as vozes que se manifestaram em favor dos indígenas contra o oleoduto. “O caso é uma tentativa de silenciar nossa tribo sobre a verdade do que aconteceu em Standing Rock e a ameaça representada pelo oleoduto à nossa terra, água e povo. Os Sioux de Standing Rock não serão silenciados”, afirmou.
Em nota, o Greenpeace-EUA afirmou que entrará com recurso contra a condenação: “Acreditamos totalmente em nossa defesa legal e que a lei está do nosso lado. Acreditamos no que fizemos em Standing Rock e que, no final das contas, prevaleceremos contra esse processo sem mérito”.
Al-Jazeera, Associated Press, BBC, Bloomberg, CNN, Deutsche Welle, Financial Times, NY Times, POLITICO e Washington Post, entre outros, repercutiram a notícia. A condenação também foi destacada no Brasil por Folha, g1, O Globo e Poder360.