Por que não devemos explorar a Foz do Amazonas?

A pressão política do Ministério de Minas e Energia, de parlamentares pró-combustíveis fósseis e de petroleiras, em especial da Petrobras e da Shell, sobre o IBAMA, que toma decisões técnicas e baseadas no que determina a legislação ambiental brasileira, diz muito sobre a complexidade de se extrair petróleo em uma região de altíssima sensibilidade ambiental como a Amazônia. 

É o caso do bloco marítimo FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas. Técnicos do IBAMA já negaram por duas vezes o pedido de licença feito pela Petrobras. As novas proposições feitas pela petroleira “não apresentaram solução compatível para as questões levantadas” antes pelo órgão ambiental. Um exemplo: “Não foi apresentada alternativa viável que mitigue, satisfatoriamente, a perda de biodiversidade, no caso de um acidente com vazamento de óleo”, notaram os técnicos do IBAMA.

Entenda 15 motivos pelos quais a exploração de petróleo e gás NÃO DEVE ser feita na Foz do Amazonas, região que abriga Povos Indígenas, comunidades ribeirinhas, uma biodiversidade riquíssima e que está localizada na chamada Margem Equatorial Brasileira.

Porque a região é sensível, preciosa e diversa

Os sistemas costeiros e marinhos no entorno da Foz do Amazonas abrigam uma biodiversidade única no mundo e prestam serviços ambientais a Povos Indígenas e a milhares de famílias ribeirinhas e de pescadores.

Ofício, assinado por 80 organizações da sociedade civil e enviado ao Ministério de Minas e Energia, destaca que a costa amazônica é um território estratégico para a conservação da biodiversidade, abrigando 80% da cobertura de manguezais do Brasil.

É uma região extremamente importante nos processos ecológicos, como explica a professora Valdenira Ferreira dos Santos, do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá, nesta aula do Climainfo.

Os corais da Amazônia, por exemplo, descobertos há poucos anos, ocupam uma área de 56 mil quilômetros quadrados e ainda estão sendo estudados pelos cientistas.

Este vídeo do WWF traz mais informações sobre os riscos da exploração de petróleo e gás na região.

Porque Povos Indígenas e comunidades tradicionais, ribeirinhas e pesqueiras dependem da biodiversidade da foz do amazonas para sobreviver

A região onde se situa o bloco FZA-M-59, que teve seu pedido de licença para perfuração de um poço de petróleo pela Petrobras negado pelo IBAMA por questões técnicas, abriga populações indígenas, tradicionais e ribeirinhas, que dependem da biodiversidade da região para o seu sustento.

O Bailique, localizado ao leste do Amapá, é um arquipélago de oito ilhas nas quais vivem aproximadamente 11 mil pessoas. Elas estão distribuídas por 52 comunidades. O acesso ao arquipélago é exclusivamente fluvial, e as principais atividades econômicas são a pesca artesanal e a produção de açaí, segundo o Instituto Amazônia.

Porque a região tem quase 100 poços já perfurados sem qualquer descoberta significativa – vários deles abandonados por acidentes

Dados públicos da Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP), expostos pela epbr, apontam que a Foz do Rio Amazonas já teve 95 perfurações, sendo que todas, até o momento, ocorreram em águas rasas (como mostra o gráfico abaixo, elaborado pela agência).

Ao todo, 27 desses poços perfurados para pesquisas foram finalizados por causa de acidentes mecânicos. A maioria, por não ter encontrado petróleo, por dificuldades logísticas ou por indícios subcomerciais.

Considerando toda a Margem Equatorial Brasileira – que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte e, além da bacia da Foz do Amazonas, inclui também as bacias Barreirinhas, Ceará, Potiguar e Pará-Maranhão –, os registros da ANP indicam a perfuração de 813 poços, com 102 perfurações abandonadas por acidente mecânico. Só 44 de todos os poços perfurados na região resultaram em descobertas, mas nenhuma delas foi na Foz do Amazonas – não em quantidade que justificasse explorar o que foi encontrado.

Porque a Petrobras tem histórico consistente de acidentes ambientais

Dos 51 acidentes envolvendo vazamentos de petróleo e derivados registrados desde 1975 no Brasil, a Petrobras foi responsável por boa parte deles, como mostra levantamento feito pelo Ambiente Brasil.

Um dos piores ocorreu em janeiro de 2000, na Baía da Guanabara, quando um duto se rompeu, provocando o vazamento de 1,3 milhão de litros de óleo, que se alastrou por 40 km2, atingindo mangues e prejudicando o meio ambiente e a vida de pescadores da região.

Porque entre 2011 e 2022, o brasil teve 9 acidentes ambientais com petróleo e derivados. quase um por ano!

Em agosto de 2019, um dos principais acidentes atingiu mais de mil localidades em 130 municípios de 11 estados do Nordeste e do Sudeste brasileiros, em uma área de 4 mil quilômetros. Mais de 5 mil toneladas de resíduos foram recolhidos da costa, como mostra este vídeo do WWF Brasil.

Porque a Petrobras não está acostumada com a força das correntes marítimas da região. Elas não são iguais as bacias de Campos e Santos

A Petrobras diz que nunca teve problemas em perfurar poços para explorar petróleo. Mas a empresa nunca enfrentou as condições da Foz do Amazonas, com correntes marítimas fortíssimas.

Além disso, a Petrobras já viveu, sim, grandes desastres ambientais, com grandes vazamentos de combustíveis fósseis, como já mostrado.

Pior: muita gente não foi indenizada devidamente por esses acidentes e perdeu sua fonte de renda.

Porque a Petrobras e o Brasil não precisam

A Petrobras já tem reservas de petróleo provadas suficientes para produzir por mais 12,2 anos. Isso dá em 2035 – tempo suficiente para a petroleira virar uma empresa de energia. Sem contar que a Petrobras ainda está explorando o pré-sal, com grande potencial de encontrar mais óleo. Por que arriscar o meio ambiente buscando petróleo em uma área tão sensível como a Foz do Amazonas?

Estima-se que o potencial da Margem Equatorial Brasileira, do Amapá ao Rio Grande do Norte, é de 30 bilhões de barris de petróleo. Isso é menos de um terço dos 100 bilhões que as bacias de Santos e Campos ainda vão produzir. Por isso, falar em um novo “pré-sal” na Margem Equatorial torna-se completamente sem sentido, além de enganoso, porque o “potencial do pré-sal” não existe na região. A avaliação de risco precisa ser técnica, e não política!

O discurso de “tirar a última gota de petróleo do mundo”, vai na contramão da transição energética mundial. Estamos vivendo um colapso climático, e o Brasil precisa acelerar a transição para fontes limpas e renováveis, como sol e vento. É urgente aumentar a resiliência do país contra a crise climática!

Porque a exploração de petróleo gera lucro para poucos e prejuízo para muitos. A falácia dos royalties

As chamadas Big Oil têm lucros exorbitantes. Mas isso não se reflete no bem estar da população dos países onde elas operam.

No Brasil, os defensores da exploração de petróleo exaltam os royalties, pagos sobre a produção, como um benefício. Mas na verdade ele é uma compensação pelos impactos socioambientais que a atividade petrolífera causa. E a história mostra, com muitas provas, que a distribuição de royalties não se reflete em melhorias reais para as regiões onde existe extração de combustíveis fósseis e sujos.

Em 2022, a Petrobras teve lucro líquido recorde de US$ 36,6 bilhões, um crescimento de 84,2% na comparação com 2021.

Entretanto, muitas das regiões onde a companhia opera amargam com baixos índices socioeconômicos, como ocorre no Norte Fluminense, no Rio de Janeiro, conforme estudo da FEA (Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária) da USP, apontando a falácia dos royalties.

Outro exemplo emblemático envolve os quatro municípios do Litoral Norte de São Paulo – São Sebastião, Ubatuba, Caraguatatuba e Ilha Bela –, líderes em recebimento de royalties em SP, mas que têm problemas graves de infraestrutura urbana.

Neste ano, 65 pessoas perderam a vida devido à crise climática na região, gerada justamente pelo aumento da temperatura do planeta por queima de combustíveis fósseis. Elas foram ‘empurradas’ para áreas de risco em encostas de morros, devido à especulação imobiliária e à concentração de renda.

Porque o Brasil tem todas as condições de liderar o planeta na direção de uma economia de baixo carbono

Em relatório recente, o Banco Mundial estimou que o Brasil pode perder 317 bilhões de dólares por ano com o desmatamento na Amazônia. Preservar a região é, portanto, essencial para o clima do planeta e também para a economia do país.

Ao todo, a maior parte da matriz energética brasileira é baseada em hidreletricidade.

A capacidade instalada de geração de eletricidade por placas fotovoltaicas no país superou 50 gigawatts (GW), de acordo com dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (ABSolar). Com isso, a fonte se mantém como a segunda colocada na matriz elétrica nacional, com 20,7% , superada apenas pelas hidrelétricas.

Projeção da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) afirma que até 2028 o Brasil terá 44,78 GW de potência instalada dessa fonte. Uma “briga do bem” com a fonte solar.

Porque não faz sentido perder tempo e enterrar dinheiro com uma fonte de energia que tem seus dias contados e que traz tantos riscos para milhões de brasileiros

O prejuízo climático causado pelas 21 maiores petroleiras, entre as quais a Petrobras, soma 209 bilhões de dólares. Pela conta, só a Petrobras deveria pagar 3,9 bilhões de dólares em prejuízos climáticos entre 2025-2050. Isso não aparece nos balanços anuais da empresa, não é mesmo?

Porque investir em renováveis gera muito mais empregos e renda, e de quebra ainda produz energia limpa e renovável!

As energias solar, eólica, hidrelétrica e de biomassa – consideradas renováveis – possuem um grande potencial de geração de empregos. A previsão é de até 42 milhões de empregos, em escala global, até 2050, segundo a Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA).

No Brasil, a estimativa do Nordeste Potência é de que, só no Nordeste, as energias renováveis gerem2 milhões de empregos

Com os R$ 600 milhões gastos pela Petrobras para tentar perfurar a Foz do Amazonas, se os mesmos recursos tivessem sido investidos em energia solar, por exemplo, já teriam gerado 1.800 empregos temporários e 250 permanentes.

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