Empresas incorporam mudanças climáticas em planejamento, mas tema permanece fora do menu político

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Victor Moriyama/Greenpeace

Enquanto companhias utilizam inteligência estratégica para minimizar impactos e criar oportunidades em seus negócios, políticos titubeiam ao agir, avaliando que ações climáticas “não dão voto”.

A evidência de que as mudanças climáticas fazem parte do dia a dia vem gerando atitudes diferentes no poder público e no mundo corporativo. Ambos já reconhecem o novo cenário, em ritmos bastante distintos.

A tragédia gaúcha pressiona os políticos a tomarem ações imediatas para reagir aos problemas causados pela emergência climática e a se explicarem sobre a falta de ações preventivas. Porém, como ressalta a Folha, a adoção de medidas efetivas em relação ao tema esbarra na dificuldade de transformar essas ações em voto, diante das características do sistema político no Brasil e do cenário eleitoral. 

Com efeitos que em geral só serão sentidos em longo prazo, a pauta ambiental em alguns momentos pode entrar em descompasso com o tempo da democracia, marcado por eleições periódicas, diz a cientista política Kathryn Hochstetler, da London School of Economics and Political Science (LSE). Situação que se agrava no Brasil, onde presidente, governadores e prefeitos são eleitos por sistema majoritário e a polarização tem gerado eleições acirradas.

Kathryn lembra ainda que o campo político do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) associou normas ambientais à esquerda. Dessa maneira, o peso de medidas impopulares nessa área, como o aumento do preço do combustível, tenderia a recair mais sobre esse espectro ideológico. Isso embora o governo atual dê sinais a favor dos combustíveis fósseis.

Segundo a professora da LSE, uma saída para implantar medidas de longo prazo em prol do ambiente é exaltar seu efeito mais imediato. O fechamento de uma mina de carvão, por exemplo, ajuda a não piorar o aquecimento global no futuro, mas pode-se enfatizar também seu benefício mais palpável de melhorar a qualidade do ar de uma localidade.

É preciso destacar que a tragédia do RS é também política, como frisa Flávia Oliveira n’O Globo. Isso significa não apenas a necessidade do poder público agir “para ontem” nas medidas de mitigação e adaptação, como também expurgar nas urnas ocupantes de câmaras de vereadores, bem como da Câmara dos Deputados e do Senado, que negam as evidências científicas e ainda promovem o “Pacote da Destruição”, formado por leis e propostas constitucionais que desmontam a legislação ambiental.

“A tragédia é humanitária, econômica, ambiental, mas sobretudo política. É do embate político franco, severo e firme – sem sutileza – que pode emergir um plano de adaptação às mudanças climáticas capaz de salvar brasileiras e brasileiros. Não tem cabimento, a esta altura, um vereador ocupar a tribuna para defender derrubada de árvores, em Caxias do Sul”, frisou Flávia.

“Enquanto o Congresso aprovava a lei de alívio na dívida do RS com a União para financiar a reconstrução, a CCJ do Senado apreciava o projeto que cria normas para elaboração de planos de adaptação à mudança do clima. O texto recebeu votos contrários de dois dos três senadores do Rio de Janeiro, Flávio Bolsonaro e Carlos Portinho, ambos do PL. Desconhecem que o estado que representam tem 75 dos 92 municípios classificados como suscetíveis a desastres climáticos, segundo o CEMADEN. Hamilton Mourão (Republicanos), ex-vice-presidente e senador pelo RS, também votou contra”, detalhou.

Enquanto políticos tentam negar o óbvio, o setor empresarial tenta salvar sua pele diante dele. Cada vez mais empresas buscam consultorias meteorológicas a fim de guiarem seus negócios, tentando evitar ou minimizar prejuízos com eventos climáticos extremos, informa a Folha.

Fabricantes de cosméticos, varejo têxtil, logística, marketplaces, deliveries de comida e até empresas do ramo de entretenimento vêm usando consultorias como Climatempo e Nottus para obter análises mais assertivas sobre variações do clima que possam impactar suas operações.

 

 

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ClimaInfo, 20 de maio de 2024.

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