Térmicas para quê? Aumentar o calor extremo?

térmicas para quê?
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Onda de calor incomum e duradoura, resultado da mudança climática somada com El Niño potente, levou o consumo elétrico a patamares históricos. Térmicas são solução?

O Brasil “torrou” na semana passada. Uma onda de calor incomum e duradoura, resultado da mudança climática somada com um El Niño potente, levou várias regiões do país a bater recordes de calor, com os termômetros nas alturas. Para aliviar o sufoco – que fez muita gente passar mal e ir a hospitais e postos de saúde –, quem pôde ligou ventilador, ar-condicionado ou qualquer aparelho para amenizar as altas temperaturas. E isso levou o consumo elétrico a patamares históricos.

A demanda máxima de eletricidade bateu recorde por dois dias consecutivos e pela primeira vez na história do sistema elétrico brasileiro superou 100.000 megawatts (MW). E, para reforçar a análise de cientistas de todo o planeta de que 2023 certamente será o ano mais quente da história, foi somente em fevereiro deste ano que o pico de consumo elétrico no Brasil superou 90.000 MW pela primeira vez. Depois disso, voltou a patamares entre 80.000 e 90.000 MW. Até explodir e ultrapassar a barreira dos 100.000 em novembro.

Preocupado com o atendimento dessa demanda, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) decidiu ligar usinas termelétricas a gás fóssil e carvão mineral. Plantas da Petrobras, Eneva e EDP entraram em operação, e assim devem continuar pelo menos até dezembro.

O ONS justifica a medida como de segurança do sistema. Mas há 2 efeitos muito ruins nessa medida. Um deles é que as termelétricas a combustíveis fósseis têm uma energia bem mais cara que a das usinas hidrelétricas, eólicas e solares, fontes renováveis que dominam a matriz elétrica do país, e seu uso vai encarecer a conta de luz, doendo no nosso bolso. O outro, ainda mais perverso, é que as térmicas emitem gases de efeito estufa, responsáveis pela mudança climática, que alimentam as ondas de calor, que vêm se tornando cada vez mais frequentes e violentas no Brasil e em todo o mundo. É o cachorro correndo atrás do rabo.

Especialistas destacam que a forte expansão das fontes renováveis nos últimos anos na matriz brasileira, principalment a da energias solar e da eólica, tem reduzido a necessidade de ligar as térmicas a combustíveis fósseis. Isso causa impacto positivo tanto no nosso bolso como nas emissões do setor elétrico. Mas ainda há quem defenda que essas termelétricas são fundamentais para garantir a segurança do sistema elétrico brasileiro. Serão mesmo?

Um estudo da Coalizão Energia Limpa mostra que a principal medida para garantir energia segura à população brasileira é acelerar a implantação de fontes renováveis no país, fortalecendo a matriz hidro-solar-eólica nacional. Essa expansão, claro, deve rever falhas cometidas no passado, quando a implantação dessas usinas ignorou as demandas e o bem-estar das comunidades onde foram instaladas. E também “cobrir” os impactos que as usinas já instaladas passam e deverão passar com o agravamento da crise climática, que altera os regimes de chuvas, ventos e até mesmo insolação.

O que o relatório da Coalizão evidencia é que é possível conciliar os anseios das comunidades locais e a necessidade energética da população brasileira com eletricidade renovável e cada vez mais limpa. Apostar em termelétricas sujas, movidas a combustíveis fósseis, para levar eletricidade a brasileiras e brasileiros é alimentar o ciclo vicioso – leia-se mudança climática – que tem feito todos nós sofrermos cada vez mais. E ainda pagarmos mais por isso. 

Além disso, num momento em que o governo brasileiro aposta num Plano de Transformação Ecológica, que tem como um dos eixos principais a transição energética, expandir a participação dos combustíveis fósseis na matriz brasileira é ir na contramão desses planos. Às vésperas da COP28, e preparando-se para sediar a COP30, o Brasil tem a faca e o queijo nas mãos para mostrar que não apenas fala, mas faz. E fazer é também estabelecer datas claras e objetivas para zerar o uso de petróleo, gás fóssil e carvão mineral para suprir nossas necessidades energéticas. Não precisamos deles. E temos potencial solar e eólico de sobra para substituí-los sem grandes traumas.

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Por Alexandre Gaspari, ClimaInfo

 

ClimaInfo, 21 de novembro de 2023.

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