Conciliação no STF mantém marco temporal para demarcação de Terras Indígenas

Os Povos Originários, que denunciaram a ilegitimidade do processo desde o início, não tiveram participação efetiva.
25 de junho de 2025
conciliação no stf mantém marco temporal para demarcação de terras indígenas
Gustavo Moreno/STF

Após meses de debate, a câmara de conciliação do Supremo Tribunal Federal (STF) alcançou um acordo para uma proposta de alteração da Lei do Marco Temporal (14.701/23). A minuta mantém o argumento jurídico que condiciona o direito à demarcação de terras indígenas à comprovação de que os Povos Originários já ocupavam aquela área específica em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.

Segundo essa interpretação, apenas as terras ocupadas por indígenas nessa data teriam direito à demarcação permanente pelo Estado brasileiro. Os indígenas argumentam que a promulgação da Constituição Cidadã foi um marco na instituição de direitos e que exatamente a partir dela comunidades indígenas forçadas ao deslocamento puderam realizar processos de retomada – além de solicitar ao Estado o cumprimento do Direito Constitucional à demarcação.

Após 23 audiências realizadas entre agosto de 2024 e junho de 2025, o acordo foi fechado sem um consenso geral. O Brasil de Fato destacou que a tentativa de conciliação terminou de forma esvaziada e sem a participação efetiva dos indígenas. Os Povos Originários, que denunciavam a ilegitimidade do processo desde o início, se recusaram a participar. Representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) se retiraram do processo em agosto de 2024, alegando falta de paridade no debate e considerando os Direitos Indígenas inegociáveis.

O texto de revisão da Lei do Marco Temporal mantém pontos controversos, como a permissão para atividades turísticas em Terras Indígenas – apresentada como “autonomia” para as comunidades, mas que especialistas alertam poder abrir espaço para exploração comercial de territórios tradicionais. Outro ponto sensível é a obrigatoriedade de participação de estados e municípios nos processos demarcatórios, medida que, na prática, pode criar novos entraves burocráticos.

A Carta Capital lembrou que a minuta também estabelece uma definição mais ampla de Terras Indígenas, contemplando aquelas adquiridas por compra, venda ou doação. Essas áreas seguirão o regime de propriedade privada coletiva, salvo decisão contrária das próprias comunidades. Como o JOTA pontuou, a atividade de mineração será resolvida em outra ação do STF, que discute os royalties a indígenas quando houver atividades de pesquisa e lavra de recursos minerais e hídricos em suas terras.

Os indígenas criticaram duramente todo o trâmite, destacando que a conciliação reforçou uma exclusão histórica. Maurício Terena, advogado indígena, afirmou ao Brasil de Fato que a elite branca distorceu a noção de democracia ao negociar Direitos Indígenas sem sua participação. Ele também condenou as mudanças acordadas, como a alteração no regime jurídico das Terras Indígenas e, também,  no rito demarcatório, que tornam os processos burocráticos e inviáveis.

Em comunicado, a APIB exige a suspensão imediata da Lei 14.701/23, que “institucionalizou o marco temporal” e intensificou a violência contra Povos Originários, denunciando a “câmara de conciliação forçada” como inconstitucional.

Os representantes do setor rural também não mostraram-se muito satisfeitos com os resultados, já que não houve consenso sobre os mecanismos de pagamento a proprietários rurais que tenham investido em terras antes destas serem demarcadas.

“Pela Constituição Federal, a indenização é só sobre as benfeitorias. Mas o tema 1031, do STF, defende o Valor da Terra Nua (VTN). Como será, ainda está indefinido. Nós defendemos o VTN mais as benfeitorias, mas precisamos aguardar esse plano da União, que vai prever também a indenização com precatórios e a participação dos estados e municípios”, explicou ao Estadão Marcelo Berton, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (FAMASUL).

A Advocacia-Geral da União (AGU) precisa protocolar até 5a feira (26) as regras para resolver pendências remanescentes no processo de conciliação sobre o marco temporal. O ministro Gilmar Mendes, relator do caso, avaliará a proposta de regularização apresentada e, se considerar válida, a submeterá ao plenário do Supremo para homologação. Se aprovado pelos demais ministros, o texto seguirá para o Congresso Nacional, onde os parlamentares decidirão se a nova versão substituirá a atual Lei 14.701/2023.

Agência Brasil, VEJA e Band, entre outros, também abordaram o encerramento da câmara de conciliação do Marco Temporal.

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