
Uma ausência foi sentida no lançamento do relatório “A Petrobras de que precisamos”, posicionamento do Observatório do Clima com propostas factíveis e economicamente viáveis para a companhia iniciar sua transformação de uma petrolífera para uma empresa de energia. Diretores e gerentes da empresa foram convidados a participar do evento, o que seria um primeiro passo para abrir um diálogo necessário sobre a transição energética justa no Brasil. Mas nenhum integrante do comando respondeu ao convite ou apareceu.
A Petrobras foi questionada sobre o documento pela imprensa. Poderia ter valorizado a produção do trabalho e respondido que se tratava de uma contribuição importante num momento em que as mudanças climáticas se agravam e pedem soluções urgentes. No entanto, optou por requentar projetos futuros envolvendo combustíveis de baixo carbono.
Mas a empresa não parou na “requentada”. Resolveu investir ainda mais em sua campanha publicitária sobre transição energética justa nas redes sociais, usando até mesmo animaizinhos “fofinhos”. A estratégia é tentar convencer de que a única parte “justa” nesse processo é “garantir energia” para a população brasileira. Ainda que esta energia seja suja, mais cara e piore os eventos climáticos extremos que cada vez mais atingirão esta mesma população.
Brasileiras e brasileiros estão sendo “bombardeados” há meses por anúncios da Petrobras na TV aberta, em aeroportos e nas redes sociais, nos quais a empresa se auto-intitula “líder da transição energética justa”. Em reportagem na Agência Pública, Juliana Aguilera, do ClimaInfo, tentou descobrir quanto a petrolífera está gastando nessa pesada campanha de marketing enquanto pressiona o IBAMA pela licença para perfurar um poço de exploração de combustíveis fósseis na Foz do Amazonas. Autorização que pode sair às vésperas da COP30, em Belém, na Amazônia.
Em resposta, após várias tentativas via Lei de Acesso à Informação (LAI), a empresa alegou se tratar de uma informação “estratégica” e que, por isso, não poderia ser revelada. Ou seja, a transparência esperada de uma empresa pública, pertencente ao povo brasileiro, passou longe da Avenida Chile, no Rio de Janeiro, onde está a sede da Petrobras. Ainda mais porque se trata de uma informação que de estratégica não tem nada, já que não afeta seus negócios.
Mas há algumas pistas dessas cifras, mostra a Pública. A responsável pela campanha de transição energética justa da Petrobras é a Propeg, uma das duas empresas de marketing que têm contrato com a petrolífera desde 2022 até 2027. Junto com a Ogilvy Brasil, cada uma tem um contrato de R$ 449,75 milhões com a estatal para esse período temporal.
Contudo, Juliana conseguiu escancarar o lado insidioso da campanha da Petrobras: a cooptação de influenciadores ligados ao clima, ao meio ambiente e à ciência. A petrolífera criou um “time” [squad] de gente com centenas de milhares de seguidores nas redes sociais. Pessoas que publicam posts – que podem custar de R$ 7,5 mil a R$ 25 mil cada um, conforme sua característica – reforçando a narrativa da empresa sobre transição energética justa e enaltecendo seus [parcos] projetos ambientais e suas iniciativas em pesquisa, desenvolvimento e inovação (PDI) relacionadas à descarbonização.
O que a Petrobras está fazendo não é novo, nem na indústria dos combustíveis fósseis, nem entre grandes empresas com atividades de altíssimo impacto ambiental e climático. As petrolíferas sabem o poder das redes sociais para catapultar seu greenwashing. Como dinheiro não falta – afinal, elas garantem anualmente lucros bilionários e [ainda] não pagam pelos prejuízos sociais, ambientais e climáticos que causam em todo o planeta –, capturar influenciadores dispostos a olhar apenas para o lado “formoso” que vendem não é difícil.
Mas, no caso da Petrobras, a situação é mais grave. Quando a companhia quer, ela se coloca como vetor de políticas públicas. Quando não quer, joga esta responsabilidade para o governo, seu acionista controlador.
Assim, quando chama de “transição justa” a ideia de “garantir energia” ao “povo brasileiro”, a petrolífera dá a entender que essa responsabilidade é dela. Por isso, ela deve investir na exploração de petróleo no Brasil “até a última gota”, como se esse combustível fóssil fosse a única alternativa energética. Esquece de contar, porém, que o Brasil já é exportador líquido de petróleo. E que sua estratégia empresarial continua deixando uma parcela significativa da população sem acesso a uma energia decente.
O discurso da Petrobras como “responsável por garantir energia ao povo brasileiro”, no entanto, muda quando a empresa é [cada vez mais] questionada pela ausência quase total de investimentos em energias renováveis e combustíveis de baixo carbono. A empresa lava as mãos e diz que falta uma política governamental. O que é verdade, já que o Ministério de Minas e Energia (MME) ainda não apresentou o Plano Nacional de Transição Energética (PLANTE), mas que não se justifica vindo de uma companhia que se diz “líder na transição energética justa” e que tem, sim, muita influência nas definições sobre a política energética nacional.
O comando da Petrobras, portanto, precisa escolher de que lado está. O que importa mais para a empresa:agradar acionistas privados, parte significativa deles do exterior, distribuindo polpudos dividendos? Ou garantir a soberania energética do Brasil, soberania esta que não depende de mais combustíveis fósseis, mas sim de uma energia que não cause prejuízos climáticos e ambientais à população brasileira, e a preços acessíveis e [como já provado] lucrativos para a companhia?
A resposta está na aceitação do diálogo proposto pelo Observatório do Clima. Variadas soluções sustentáveis e financeiramente sustentadas já estão na mesa, e outras tantas podem vir. O avanço não virá com greenwashing nas redes sociais, mas sim com conversas francas e colaborativas para que a Petrobras lidere, de fato, a transição energética justa no Brasil.



