
Com a eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos, em novembro do ano passado, a Net-Zero Banking Alliance (NZBA), coalizão climática global de bancos criada em 2021, começou a minguar. As grandes instituições estadunidenses foram as primeiras a abandonar o barco, seguidas posteriormente por bancos de outros países. Resultado: a NZBA anunciou o encerramento de suas operações na semana passada.
É lamentável ver qualquer mobilização criada para combater as mudanças climáticas chegar ao fim por pressões políticas de negacionistas climáticos. Mas não é esse o caso da NZBA, como pode parecer. Em seus pouco mais de quatro anos de duração, várias vezes bancos associados à coalizão foram expostos por investirem muito dinheiro em setores que não têm nada de sustentáveis, como o de combustíveis fósseis.
Uma prova disso foi divulgada na mesma semana em que a NZBA acabou. Foi quando o estudo “The Money Trail: Behind fossil fuel expansion in Latin America and the Caribbean” mostrou que quase 300 bancos de todo o mundo investiram US$ 138,5 bilhões na expansão da indústria de petróleo e gás fóssil na América Latina e Caribe (ALC) de 2022 a 2024, incluindo na Amazônia. Segundo o levantamento, a Petrobras, que está prestes a obter autorização para explorar combustíveis fósseis na Foz do Amazonas, foi uma das principais beneficiadas.
Mas a pesquisa vai além e lista as 20 instituições financeiras que mais colocaram dinheiro na expansão da energia suja na ALC. O “top 20” respondeu por cerca de US$ 90 bilhões (65%) do total. A maior parte do dinheiro saiu de bancos do Norte Global, especialmente dos Estados Unidos e União Europeia, mas há instituições da China e do Brasil. E pior: boa parte delas eram associadas à aliança bancária criada para combater a crise climática.
| Os 20 bancos que mais investiram na exploração de combustíveis fósseis na ALC (2022-2024) | ||
| Banco | País | Invest. (US$ bilhões) |
| Santander | Espanha | 9,92 |
| JPMorgan Chase | EUA | 8,11 |
| Citigroup | EUA | 7,93 |
| Scotiabank | Canadá | 7,19 |
| Bank of America | EUA | 6,03 |
| SMBC Group | Japão | 5,47 |
| Mizuho Financial | Japão | 4,48 |
| Banco Bilbao Vizcaya Argentaria (BBVA) | Espanha | 4,46 |
| HSBC | Reino Unido | 4,4 |
| Morgan Stanley | EUA | 4,39 |
| Mitsubishi UFJ Financial | Japão | 3,62 |
| Deutsche Bank | Alemanha | 3,39 |
| Barclays | Reino Unido | 3,21 |
| Royal Bank of Canada | Canadá | 3,09 |
| Itaú Unibanco | Brasil | 2,8 |
| Bank of China | China | 2,67 |
| BMO Financial Group | Canadá | 2,61 |
| Toronto-Dominion Bank | Canadá | 2,56 |
| Wells Fargo | EUA | 2,16 |
| BTG Pactual | Brasil | 2,1 |
| TOTAL | 90,59 | |
| Fonte: The Money Trail: Behind fossil fuel expansion in Latin America and the Caribbean | ||
Entre participantes da NZBA que integram a “lista suja” dos combustíveis fósseis na América Latina e Caribe estão Santander, JP Morgan Chase, Citigroup, Scotiabank, HSBC, Deutsche Bank e Morgan Stanley. Além dos brasileiros Itaú Unibanco e BTG Pactual. Bancos que, em tese, estariam comprometidos com a agenda climática. Mas que não se furtaram a aplicar bilhões na indústria de combustíveis fósseis, e numa das regiões do planeta mais ameaçadas pelas mudanças do clima.
Em geral, as inúmeras reportagens que acompanharam o esvaziamento da NZBA, desde a chegada de Trump à presidência dos EUA até o ocaso definitivo da coalizão na semana passada, apontavam a pressão do “agente laranja” como motivo para a debandada dos bancos da aliança. Mas o que o ataque do presidente estadunidense escancarou foi a total falta de comprometimento com a agenda climática e o greenwashing explícito de instituições financeiras auto-intituladas “verdes”. Não à toa alguns analistas disseram um “já vai tarde” para o fim do grupo que, no final das contas, foi apenas mais uma iniciativa de fachada.
Uma das estratégias das instituições financeiras e de gestoras de investimentos para se mostrarem “verdes” envolve o lançamento de fundos com critérios ESG, conceito que o mercado agarrou com unhas e dentes. No entanto, esse mecanismo, que busca atrair investidores preocupados com a agenda socioambiental e climática, também está sendo usado para colocar dinheiro em outros setores destrutivos.
A Bloomberg mostrou que o número de fundos de ações ESG da União Europeia expostos à indústria de armas nucleares aumentou mais de 50%, para mais de 2.000, desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022. “O desenvolvimento expõe da forma mais crua possível a drástica evolução das práticas de investimento ambiental, social e de governança desde que o termo foi cunhado, há mais de duas décadas por uma equipe apoiada pelas Nações Unidas”, destacam Frances Schwartzkopff, Natasha White e Claudia Cohen, da Bloomberg Intelligence.
“Siga o dinheiro!” é o mote de qualquer investigação que se preze para mostrar quem está por trás de setores econômicos – ou de atividades criminosas. E o que se vê na indústria de petróleo e gás fóssil é que o dinheiro dos bancos continua jorrando pesado para sua expansão, apesar da urgência climática. Pior: um dinheiro que se vende como “verde”, mas só se for pela cor das notas de dólar. Porque, no fim, ele é cinza como a poluição causada pela queima de combustíveis fósseis que financia.



