“É como discutir com robôs”: negociadores desabafam sobre bloqueadores da COP30

Nos bastidores, secretário-geral da ONU indicou a Arábia Saudita como líder de movimentos para obstruir resultados-chave na conferência.
21 de novembro de 2025
cop30 falando com robôs
© UN Climate Change - Kiara Worth

Nas salas de negociação da COP30, representantes de países mais vulneráveis às mudanças climáticas e com menos recursos para combatê-las ​​trabalham para obter o melhor acordo possível na conferência do clima. Três deles revelaram ao Guardian o que acontece a portas fechadas.

Seus desabafos mostram como negociadores de vários países – em geral, dos menos ameaçados pela crise do clima, ou que têm mais dinheiro para lidar com ela – são insensíveis ao drama de nações em risco extremo. E para impedir decisões importantes relacionadas a financiamento, adaptação e transição energética justa são capazes até mesmo de negar a ciência.

“Precisamos nos guiar pela ciência, e a ciência é muito clara, mas alguns argumentam contra ela. O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) deixou bem claro que 1,5°C é um limite crítico. Mas ouvimos nas salas de negociação pessoas se opondo à ciência, dizendo: ‘Ah, existem outras ciências além do IPCC’, que o IPCC não é ‘a melhor ciência disponível’. É realmente angustiante ouvi-los dizer isso. Me machuca. Continuamos defendendo nossa posição, mas eles não escutam. Eles não querem escutar”, disse um negociador.

Outro fez uma crítica direta aos países desenvolvidos e sua eterna resistência em pagar a conta da crise climática pela qual são os principais responsáveis: “Para o meu povo, adaptação não é apenas uma palavra que se repete em uma COP. Significa sobrevivência,  a diferença entre colocar comida na mesa e entrar na fila por ajuda humanitária, se as colheitas vão fracassar ou não, se o gado vai viver ou morrer por falta de água. Estamos sofrendo a pior seca em 40 anos, precisamos de ajuda para nos adaptar aos impactos da crise climática agora. Vejo lugares em meu país onde antes havia abundância e agora não há nada. Os países desenvolvidos sabem disso, mas acho que eles não compreendem de verdade. Não acho que eles sintam isso da mesma forma intensa que nós sentimos, porque nós vivemos essa realidade”.

O terceiro negociador lembra do Artigo 9.1 do Acordo de Paris, que trata da obrigação dos países desenvolvidos de fornecer financiamento climático às nações em desenvolvimento. Um tema que chegou como crucial na COP30, mas que continua sendo ignorado pelos devedores históricos.

“Temos a União Europeia, o Reino Unido e outros países historicamente poluidores que têm resistido aos apelos de todo o Sul Global para que haja um espaço dedicado à discussão do artigo 9.1. Esses países estão dizendo para incorporar essa discussão a um debate mais amplo sobre todas as finanças, mas sabemos por experiência própria que isso não funciona. Quando tentamos falar sobre tudo, acabamos não falando de nada. Os países ricos falam sobre o que lhes convém. Alguns dos negociadores mais experientes do Sul Global estão dizendo: ‘Sem um espaço para discutir provisões, por que sequer vir à COP?’”, desabafou.

Um país em especial parece despontar como um dos principais bloqueadores de negociações das conferências do clima: a Arábia Saudita. Segundo fontes ouvidas pelo Financial Times, o secretário-geral da ONU, António Guterres, identificou que o petroestado está mais ousado como líder de movimentos para obstruir resultados-chave na COP30.

Guterres fez os comentários em uma reunião com ministros e assessores europeus em Belém na 4ª feira (19/11). Há muito tempo os sauditas resistem a tentativas de discutir a transição para longe dos combustíveis fósseis em negociações climáticas, apesar do aval para uma transição de petróleo, gás e carvão no balanço global (GST) da COP28, em Dubai, há dois anos. Mas agora, em Belém, o país recusou a inclusão do mapa do caminho proposto pelo presidente Lula no texto final da COP30. 

Haveria algum “dedo” do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, nessa “raiva” saudita? Afinal, nesta semana o “agente laranja” recebeu na Casa Branca o príncipe saudita Mohamed Bin Salman, que não pisava nos EUA há anos, conta Jamil Chade no UOL. No final, a luta pelo poder entre poluidores históricos, como Reino Unido e União Europeia, e poluidores emergentes, como China e Arábia Saudita, deixa nações africanas sem financiamento climático crucial, enquanto esses atores trocam acusações, destaca o Africa Report. Um drama que se estende a outros países mais vulneráveis do Sul Global. E que custa cada vez mais vidas.

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