Estudo que atestava segurança de glifosato é despublicado após 25 anos

Funcionários da Monsanto contribuíram para a redação do artigo, e a empresa também patrocinou o estudo.
9 de dezembro de 2025
estudo segurança glifosfato
Aqua.Mech/Flickr

Um artigo científico publicado em 2000 sobre a segurança do glifosato, o agrotóxico mais usado no mundo, foi oficialmente despublicado pela revista “Regulatory Toxicology and Pharmacology” 25 anos depois. Entre os motivos estão questões éticas, falta de integridade científica e desconfiança sobre os resultados apresentados.

Como a Repórter Brasil detalha, o estudo concluía que o glifosato não representava risco de desenvolvimento de câncer e subsidiou diversos debates regulatórios no mundo e no Brasil, inclusive as análises da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sobre o agrotóxico. Sendo base de mais de cem produtos disponíveis no mercado, o glifosato é o ingrediente ativo do Roundup, produzido pela Monsanto, empresa adquirida em 2018 pela Bayer.

Segundo um comunicado da revista científica, o estudo apresentava falta de clareza sobre os verdadeiros autores do texto assinado por Gary M. Williams, Robert Kroes e Ian C. Munro. Também não mencionava o envolvimento direto de funcionários da Monsanto e foi patrocinado pela empresa, informa o Health News.

A ANVISA afirmou que o artigo agora despublicado “não foi o único dado, pesquisa ou informação utilizada para avaliação” da agência. Já a Bayer se limitou a dizer que o glifosato tem sido usado “com segurança e sucesso em todo o mundo há mais de 40 anos”.

No entanto, não é isso que estudos e processos têm mostrado. Levantamento inédito do Repórter Brasil encontrou pelo menos 1.006 processos judiciais envolvendo pessoas afetadas pela exposição aos agrotóxicos, a maioria, trabalhadores. E lembra que a Bayer já desembolsou mais de US$ 11 bilhões (R$ 59 bilhões) para encerrar cerca de 100 mil processos de vítimas do seu Roundup.

“A ANVISA deveria colocar o glifosato em reavaliação novamente, porque as pessoas estão adoecendo e morrendo por conta desse agrotóxico”, afirma a toxicologista Karen Friedrich, do Grupo Temático de Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO).

Pesquisadores acreditam que o estudo levou as pessoas a acreditarem na segurança do agrotóxico e desestimulou formuladores de políticas a regulá-lo, destaca a Folha. O artigo está entre os 0,1% mais citados na literatura acadêmica sobre glifosato, segundo Alexander Kaurov e Naomi Oreskes, que solicitaram a retratação.

Uma enxurrada de estudos comprova a ligação direta do glifosato com a piora da qualidade de vida e a contaminação do meio ambiente. Um exemplo disso vem dos municípios de Santarém, Belterra e Mojuí dos Campos, no oeste do Pará, onde o avanço da soja e do milho aumentou quase seis vezes os casos de contaminação por agrotóxicos. Segundo Repórter Brasil, InfoAmazonia e UOL, foram registrados 200 casos entre 2021 e 2025, ante 31 no quinquênio anterior.

Pesquisas feitas pelo médico Marcos Mota, do Instituto Evandro Chagas, apontam no mesmo sentido. “Sintomas neurológicos estão amplamente confirmados no nosso estudo, tanto em Mojuí dos Campos quanto em Belterra”, diz, citando também sintomas como alteração do sono, quadro depressivo e irritabilidade.

  • Em tempo: O Supremo Tribunal Federal (STF) pode decidir na 4ª feira (10/12) pontos relevantes sobre a tributação de agrotóxicos. Como o Valor detalha, está em pauta a validade de benefícios fiscais de ICMS e IPI. Os processos questionam regras que reduzem em até 60% a base de cálculo do imposto estadual e instituem alíquota zero do IPI para alguns produtos.

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