
Javier vai-com-os-outros. Esse pode ser o novo apelido do presidente argentino, Javier Milei, caso se concretize o que a imprensa de Buenos Aires vem especulando nos últimos dias. Segundo veículos argentinos, a Casa Rosada estaria estudando seguir o exemplo dos EUA de Donald Trump e abandonar o Acordo de Paris.
De acordo com a Folha, a discussão em torno da saída do Acordo de Paris seria encabeçada por três figuras importantes do governo argentino – o próprio Milei; a irmã dele, Karina, que também é secretária-geral da Presidência; e Santiago Caputo, assessor influente do governo.
Um indício dessa possibilidade foi o discurso do presidente argentino ao Fórum Econômico Mundial de Davos (Suíça), na semana passada, em que teceu fortes críticas contra o multilateralismo e um suposto “ambientalismo fanático” que prejudicaria o desenvolvimento econômico dos países.
O Financial Times destacou que servidores de carreira do governo argentino estariam tentando dissuadir a Casa Rosada de deixar o Acordo de Paris, reforçando que os impactos de uma saída seriam fortes para Buenos Aires. Um diplomata ouvido pela reportagem disse que Milei tomará a decisão final e que “parece muito provável que acabemos saindo”. A Folha traduziu a matéria.
A cautela de parte do governo argentino faz sentido. Enquanto o exemplo negacionista de Trump segue forte em Milei, a condição argentina é totalmente diferente da norte-americana. Enquanto o custo de decisão de deixar o Acordo de Paris é relativamente baixo para o presidente dos EUA, esse impacto é bem maior para o presidente argentino, já que uma saída das negociações climáticas pode “vinagrar” fluxos financeiros que trazem preciosos dólares ao mercado argentino.
A saída de Buenos Aires do Acordo de Paris também inviabilizaria a aprovação do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia, como lembrou o embaixador André Corrêa do Lago, futuro presidente da COP30. “Você tem que lembrar que, para poder se beneficiar do acordo Mercosul-UE, você tem que ser membro do Acordo de Paris”, disse o diplomata ao Financial Times.
Além disso, a movimentação negacionista na Argentina destoa da reação do resto do mundo à saída dos EUA do Acordo de Paris, o que indica um isolamento político potencial. Como o Guardian destacou, os governos reforçaram sua defesa pública da ação climática global, apesar da debandada norte-americana.
As principais peças do tabuleiro das negociações climáticas, como União Europeia, China, Reino Unido e Brasil, seguem engajadas no processo multilateral e devem despontar como lideranças alternativas aos EUA na COP30.
O impacto maior dos retrocessos climáticos de Trump, ao menos inicialmente, está no plano doméstico. A Bloomberg sintetizou a blitzkrieg (um termo que se encaixa bem com gestos recentes de um certo bilionário polemista) anticlima do novo governo norte-americano, que surpreendeu pela rapidez dos anúncios e pelas diversas frentes de ação, mas que também não pode ser superdimensionada, já que muitas dessas medidas serão difíceis de serem tiradas do papel no curto prazo.



