
A cerca de dois meses da primeira conferência do clima da ONU na Amazônia, a região vive sob a expectativa de uma mudança real: dos compromissos firmados para a implementação de ações de combate às mudanças climáticas. Há pelo menos um dado positivo a ser celebrado neste 5 de setembro, Dia da Amazônia: a queda do desmatamento, que, apesar de alguns sobressaltos, continua acontecendo.
Mas o Dia da Amazônia deste ano será manchado por petróleo. Na semana passada a Petrobras finalizou a Avaliação Pré-Operacional (APO) no bloco FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas. O simulado de vazamento de petróleo e atendimento à fauna é a etapa final do licenciamento do poço de exploração de combustíveis fósseis que a estatal quer perfurar no litoral amazônico.
O licenciamento do bloco 59 foi marcado pela ausência de consulta livre, prévia e informada aos Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais do Amapá. Mesmo com a recomendação da FUNAI, dos protestos de indígenas, quilombolas, ribeirinhos e pescadores artesanais, e das ações do Ministério Público Federal (MPF), o processo seguiu sem consentimento. E a pressão política sobre o IBAMA pela liberação da licença resultou em mais pressão sobre esses territórios apenas pela possibilidade de a Petrobras operar na região.
Como se vê, a licença do bloco 59 já provoca estragos antes mesmo de ser confirmada. Mas, se a autorização for mesmo dada, o que o governo brasileiro considera como fato consumado, abrirá a porteira para uma “boiada petrolífera” passar no litoral da Amazônia, onde estão 75% dos manguezais do país. Manguezais que têm papel crucial na absorção de carbono da atmosfera, estocando quase 1,5 bilhão de toneladas de CO2, e que estarão ameaçados pela indústria petrolífera.
As empresas de petróleo e gás que já têm concessões na região aguardam apenas o sinal verde do IBAMA para a Petrobras para avançar com licenciamentos de outros poços na Foz do Amazonas. E com a Licença Ambiental Especial (LAE), incluída pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), no PL da Devastação, e que entrou em vigor de imediato ao ser publicada numa medida provisória, essas autorizações poderão sair em um ano. Mesmo com a ausência de estudos aprofundados como a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS).
Diversos estudos científicos já mostraram que a preservação da Floresta Amazônica não depende apenas do combate ao desmatamento. O excesso de GEE na atmosfera compromete os serviços climáticos da maior floresta tropical do planeta, bem como a própria sobrevivência da floresta e de seus povos. Para preservarmos a floresta, é essencial eliminar os combustíveis fósseis, cuja queima responde por cerca de 75% das emissões de gases de efeito estufa em todo o mundo.
Ignorados no licenciamento do bloco 59 da Petrobras, Povos Indígenas, Quilombolas e Comunidades Tradicionais da Amazônia reivindicam que a região se torne uma área transnacional de exclusão de combustíveis fósseis. E que seja palco de uma transição energética justa, que garanta energia renovável, com respeito aos saberes tradicionais, ao meio ambiente e às pessoas.
Os povos amazônidas são os primeiros afetados pela devastação da floresta, seja pelo desmatamento, seja pela ação da indústria petrolífera. Comunidades da Amazônia já sofrem com a falsa promessa de desenvolvimento que o setor de petróleo e gás fóssil usa para se instalar na região. Sabem melhor do que ninguém que a riqueza petrolífera fica nas mãos de poucos, mas a conta socioambiental é paga por todos, principalmente por elas.
“A Amazônia pulsa como o coração da Terra. Nossas florestas, rios, solos e ciclos formam o tecido de vida que sustenta o último fôlego do equilíbrio climático. Mas não há Amazônia sem seus povos. Os territórios que nossas comunidades protegem são as últimas fortalezas contra a devastação. A ciência confirma o que nossos ancestrais já sabiam: justiça climática só será possível se for também justiça territorial, social e popular. A RESPOSTA SOMOS NÓS”, afirma a declaração do Mutirão dos Povos, que reúne povos da terra, das águas, dos territórios da Amazônia e movimentos sociais do Brasil profundo.
Portanto, a notícia mais esperada pelos Povos Indígenas, Quilombolas e Comunidades Tradicionais é uma Amazônia Livre de Petróleo e Gás. Sem ela, o Dia da Amazônia continuará sendo uma data com pouco a se comemorar.



