O que esperar dos EUA na COP23

Para quem acompanha as negociações climáticas, a decisão de Trump foi quase um dejá-vu do Protocolo de Kyoto, assinado pelo democrata Bill Clinton e rejeitado pelo republicano George Bush. Mas além do fato de que, passadas duas décadas, a geografia do poder e da economia está diferente, o que também alterou a lista dos grandes emissores de gases de efeito estufa, desta vez o acordo inclui todos os países do mundo e os atores não-nacionais estão mais organizados e fazendo a diferença. Não por acaso, a presidência fijiana desta COP se propõe a criar uma grande coalizão para acelerar a ação climática antes e além de 2020, incluindo a sociedade civil, a comunidade científica, o setor privado e todos os níveis de governo, inclusive cidades e regiões. Ou seja, provavelmente haverá mais protagonismo por parte de atores não nacionais (NSA, na sigla em inglês) do que nas COPs anteriores. E como recentes anúncios de imprensa indicam, os atores não nacionais norte-americanos usaram a CoP como palanque para fazer oposição a seu presidente.

 

Apesar dos jogos de palavras de Donald Trump e seu falacioso aceno à renegociação do acordo, o fato é que:

 

  • ao longo de 2017, nas várias reuniões intersecionais da COP e nos grandes eventos multilaterais, como os encontros do G7 e do G20, todos os países defenderam o Acordo de Paris, o que é um forte indicador de que os EUA de Trump continuarão isolados em sua decisão;
  • a saída dos EUA de Paris só se efetivará em 2020, pelas regras da UNFCCC, quando talvez Trump não seja mais o presidente dos EUA;
  • até lá, a mudança na posição do governo dos Estados Unidos não o dispensa dos compromissos assumidos por Obama em Paris, seja em finanças ou mitigação.

 

Este último ponto é importante porque os EUA disseram que participarão ativamente das negociações deste ano, mas seu presidente afirmou que o país não acrescentará recursos ao Fundo Verde para o Clima, ao Fundo de Adaptação e a outros mecanismos de ajuda aos países pobres na resposta ao aquecimento global. Esse é um bom indicador de que o capítulo das finanças não deverá ter avanços nesta COP.

 

A saída dos EUA leva à pergunta sobre quem assumirá a liderança climática exercida pelos norte-americanos até o ano passado. Especialistas, incluindo Patricia Espinosa, diplomata mexicana que chefia a Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas, não acreditam em uma liderança única, mas sim em um modelo difuso que congregue vários países desenvolvidos e em desenvolvimento.

 

Ela embasa sua tese nos acontecimentos deste ano: o Canadá sediou um encontro ministerial, a França terá sua própria cúpula climática em dezembro, a Alemanha conseguiu encerrar o G20 com uma mensagem climática no comunicado oficial e o presidente chinês, Xi Jinping, usou seu discurso na reunião do Fórum Econômico Mundial de janeiro em Davos, na Suíça, para abordar o assunto.

 

A liderança da própria delegação de negociadores norte-americanos foi de certa forma rebaixada por Trump. O posto de enviado especial do clima, criado na administração Obama e ocupado por Todd Stern, não será preenchido. Portanto, os EUA voltam aos tempos dos republicanos, apenas com a presença do negociador-chefe – que ironicamente será um diplomata de carreira que foi trabalhar na área climática por indicação de Obama: Thomas Shannon.