ClimaInfo, 11 de janeiro de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

E o clima sumiu (no ministério das relações exteriores)

As mudanças climáticas não aparecem mais no novo organograma Ministério das Relações Exteriores. Por muito tempo, as posições brasileiras nas negociações do clima foram conduzidas por uma parceria entre o Itamaraty e o ministério do meio ambiente. Segundo algumas declarações, estas funções foram absorvidas por outras secretarias e pautadas por outros objetivos.

Fechados em suas crenças, os ministros e o presidente não se dão conta que o clima mudou e continuará a mudar em ritmo acelerado se todos os países, mas principalmente grandes emissores como o Brasil, não agirem rápida e decisivamente. Aliás, não há país que saia no lucro num mundo 3oC ou 4oC mais quente, e o Brasil não está na lista dos menos prejudicados. Negar os fatos condena o país, sua população e o meio ambiente a um futuro trágico. Giovana Girardi, no Estadão, e Maurício Tuffani, no Direto da Ciência, também comentam o súbito desaparecimento do clima da estrutura governamental. O Observatório do Clima disse que essa reorganização “é medida ideológica e antipatriótica”.

 

O discurso perigoso do ministro do meio ambiente

Em entrevista dada para O Globo, o ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, assumiu as promessas (NDC) do estado brasileiro feitas ao Acordo de Paris (“nossas metas estão postas”) e avaliou que o Brasil já fez muito e teve pouco reconhecimento prático pelo que fez (“agora é a hora de colher (…) nos comprometemos muito e colhemos pouco”). O ministro não explicou sua estranha avaliação. Estranha porque é ainda muito cedo para dizer se o país conseguirá ou não cumprir sua NDC. Teremos que esperar até 2025 para ter certeza dos resultados, e trabalhar muito até lá para atingi-los. Além disso, o país segue entre os seis maiores emissores de gases de efeito estufa e com emissão per capita acima da média mundial.

Salles também disse que não comprometerá o país com novas metas e que seu papel é dizer “olha, a lição de casa está feita até aqui. Quanto isso vale?”. Esta fala do ministro bate de frente com os objetivos de longo prazo do Acordo (manter o aquecimento global abaixo de 2oC e envidar todos os esforços possíveis para limitá-lo a 1,5oC). Isto porque está claro que a soma dos possíveis resultados de todos as promessas feitas ao Acordo até agora nos leva a um mundo aquecido a 3,4oC, de maneira que a revisão das promessas de todos os países no sentido de maior ambição na redução de suas emissões é fundamental para que o conjunto de nações reduza os impactos causados pelo aquecimento global. Se não forem feitos esforços adicionais e conjuntos por todos os países, as consequências atingirão o conjunto da humanidade.

Salles, perigosamente, parece querer deixar a porta aberta para uma retirada do país do Acordo, afinal, para ele, não adianta ficar no Acordo se o mundo não recompensar o país pelos seus esforços.

 

A Amazônia se aproxima de um ponto de ruptura

O climatologista Carlos Nobre alerta mais uma vez para a aproximação de um ponto de ruptura para a floresta Amazônica. Em entrevista à National Geographic, Nobre diz que a floresta poderá entrar em um processo irreversível de savanização se perder 25% de sua cobertura. Nobre conta que quando produziu ‘os primeiros estudos, entre 1988 e 1991, aquilo era uma hipótese (a savanização deste bioma). Naquela época, o desmatamento da Amazônia brasileira estava na faixa de 8%, 9%. Hoje, chega a 20%”. Nobre compara Santarém, no meio da floresta, com o Cerrado: “Alguns lugares do Cerrado têm o mesmo nível de chuva da região de Santarém, na Amazônia – anualmente, um total de 1.800 mm. Se chove o mesmo volume, por que em um lugar se tem floresta e no outro, Cerrado? Na região de Santarém a chuva é bem distribuída o ano todo e a estação seca é muito curta. No Cerrado, a precipitação é muito concentrada na estação chuvosa e, depois, essas regiões passam por três, quatro meses de chuva zero, enquanto em Santarém chove 80, 100 mm na estação seca. Esta é a grande diferença. Estudos de ecologia começam a mostrar um aumento da mortalidade de algumas espécies de árvores. Então, estamos realmente muito próximos desse ponto de ruptura (…) Nos últimos 30 anos, a estação seca está em média seis dias mais longa por década. A mais duradoura passou de meio mês. Se continuar assim, aquela região acabará virando uma savana bem degradada.”

Os impactos não se limitam à perda da floresta. “Em um total desmatamento da Amazônia, ou seja, na substituição de floresta por pastagem, há boas evidências de que haveria uma alteração das chuvas no inverno no sul da Bacia do Prata, no sul do Paraguai e do Uruguai, no sul do Brasil e no centro-leste da Argentina. Nessas regiões, há uma correlação de fluxo do vapor d’água que sai da Amazônia e segue ao sul, paralelo aos Andes, e abastece os sistemas de chuva.” Recomendamos a leitura de toda a entrevista.

 

Para Raquel Dodge, lei da grilagem é inconstitucional

Em 2017, Temer sancionou a regularização de uma imensa área de terras públicas grilada no sul do Pará. Agora, a Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, enviou um parecer ao Supremo Tribunal Federal (STF) dizendo que a lei é inconstitucional e favorece a concentração de terras: “a Lei 13.465/2017, ao promover profunda e complexa reestruturação dos regimes de regularização fundiária urbana, com foco na distribuição de títulos de propriedade, reforça a desigualdade social e consolida danos ambientais decorrentes de desmatamentos e ocupações ilegais de terras públicas e privadas”.

O secretário de demarcações, Nabhan Garcia, é conhecido pela defesa irrestrita da propriedade privada e por ser contrário a toda e qualquer invasão. Agora, como zelador da coisa pública, espera-se o mesmo empenho na defesa da propriedade do Estado.

 

Os novos responsáveis pela Amazônia

Quatro países da bacia Amazônica – Brasil, Colômbia, Equador e Peru – nomearam novos ministros do meio ambiente nos últimos oito meses. A ligação do novo ministro brasileiro com o agronegócio já é bem conhecida entre os leitores do ClimaInfo. Mas quem são os demais? Abaixo sintetizamos os perfis destes novos ministros feitos pelo China Dialogue.

Colômbia: Ricardo Lozano, ministro do meio ambiente desde agosto, chegou ao poder em um momento crucial. O segundo ano da implantação do histórico acordo de paz com as FARC viu aumentar rapidamente o desmatamento de regiões da Amazônia antes controladas por guerrilheiros e narcotraficantes. Geólogo, Lozano é conhecido por ter criado e liderado o Ideam, instituto de meteorologia que opera um sistema robusto de monitoramento florestal e que publica alertas antecipados de tendências de desmatamento a cada três meses. A Colômbia está perdendo da ordem de 220 mil hectares de floresta por ano e é presidida por um governo que chegou ao poder com a promessa de se opor ao acordo de paz e promover o setor agrícola do país. Para Lozano, “o desmatamento não é apenas um problema para o Ministério do Meio Ambiente ou apenas para um ministro, mas para o Estado”.

Equador: Marcelo Mata Guerrero tomou posse há apenas duas semanas em meio à reformulação do gabinete do presidente Lênin Moreno. Advogado, Guerrero gerenciou questões ambientais para as petroleiras Repsol Equador e Petroecuador (estatal), ocupou cargos no Ministério de Minas e Petróleo e participou da formulação de políticas públicas para o setor de mineração. A influente ONG Acción Ecológica pensa ser “inaceitável que hoje o chefe do Ministério do Meio Ambiente seja um ex-funcionário da primeira empresa petrolífera a extrair neste parque nacional [Yasuní], o mais biodiverso do Equador, e onde há pessoas vivendo em isolamento voluntário”.

Peru: Fabiola Muñoz Dodero assumiu o ministério em abril com a posse do novo presidente Martín Vizcarra. Advogada, Dodero liderou por quatro anos o Serviço Nacional de Silvicultura e Vida Silvestre vinculado ao Ministério da Agricultura. Antes liderou o programa do Serviço Florestal dos Estados Unidos no Peru e foi gerente de relações comunitárias da Anglo American no Peru. Dodero dedicou uma importante parte de sua carreira ao combate às atividades ilegais que dizimam a Amazônia e outros ecossistemas peruanos. No ministério, está focada na mineração ilegal e no desmatamento, e enfatiza a necessidade de alternativas para as comunidades. “Temos que reconhecer que dentro do Estado não somos geralmente eficientes em criar condições para que a atividade legal seja mais barata e mais rápida do que a atividade ilegal”.

Em tempo: no período entre agosto de 2017 e julho de 2018, pelas contas oficiais do governo brasileiro, o desmatamento atingiu 790 mil hectares na nossa parte da Amazônia e 666 mil hectares no Cerrado.

 

Precificação do carbono avança na América do Norte

Catorze estados dos EUA e províncias canadenses, além de uma cidade dos EUA, já colocaram um preço sobre suas emissões de gases de efeito estufa (GEE), e outros sete estão para fazê-lo, mostra um relatório do American Council for an Energy-Efficient Economy (ACEEE). Duas abordagens estão prevalecendo: impostos ou taxas sobre o carbono ou sistemas de limitação e comércio de emissões. Os impostos sobre o carbono, embora tenham custos conhecidos, têm efeito incerto sobre as emissões. Este tipo de imposto está em vigor nas províncias de Alberta e British Columbia, e na cidade de Boulder, Colorado. Massachusetts, Washington State, Newfoundland, Prince Edward Island, e os Territórios Canadenses do Noroeste estão todos considerando seriamente implantar impostos sobre o carbono. A maioria destes impostos incide sobre múltiplos setores econômicos. Já os sistemas de limitação e comércio colocam um limite às emissões de GEE e emitem licenças de emissão, muitas vezes chamadas de “permissões” ou “certificados”. Os emissores podem negociar esses certificados, permitindo que o mercado encontre as reduções de emissões mais baratas disponíveis. Nos sistemas de limitação e comércio, o nível de emissões é conhecido, mas o preço de mercado dos certificados é menos certo. Esta abordagem está em vigor na Califórnia, Quebec, Nova Escócia e nove estados do nordeste que fazem parte da Iniciativa Regional de Gases de Efeito Estufa (RGGI). Nova Jersey, Virgínia, Oregon e Saskatchewan estão seriamente considerando programas deste tipo. A RGGI cobre apenas o setor de energia; os outros programas são mais amplos.

Steven Nadel, diretor executivo da ACEEE, diz que as iniciativas destes estados e cidades é importante porque é improvável que o governo federal dos EUA tome decisões que lidem com a mudança climática, embora a recente Fourth National Climate Assessment advirta sobre terríveis impactos climáticos. O trabalho também diz que é preciso aprender com os protestos do “coletes amarelos” na França. Em função destas lições, recomenda que os programas ofereçam restituições de impostos ou outras considerações para o pessoal de baixa e média renda como meio de mitigar o impacto para as famílias da precificação do carbono.

 

China investe bilhões em hidrelétricas reversíveis

A China está investindo pesado em armazenamento de eletricidade para o aproveitamento máximo de tudo que o Sol e o vento proporcionam ao país. A primeira imagem que nos vem quando se fala de armazenagem é a de baterias, nas quais, aliás, a China tem investido pesadamente. Mas outra alternativa de armazenamento é o aumento do aproveitamento das hidrelétricas, tornando-as reversíveis. Quando a demanda é alta, a usina faz passar a água pelas turbinas gerando eletricidade. Quando a demanda é baixa, bombas jogam a água de volta para as represas. A estatal elétrica chinesa State Grid investirá quase US$ 6 bilhões em cinco plantas reversíveis no interior do país, com uma capacidade total de 6 GW, e que estão programadas para começar a operar em 2026. A empresa tem, hoje, mais de 19 GW de capacidade reversível e tem planos para acrescentar mais 30 GW.

Em tempo: no Brasil, o último Plano Decenal de Expansão de Energia faz várias menções a usinas reversíveis e, juntando todas as opções de armazenamento de eletricidade, prevê que até 2027 seja instalada uma capacidade total de 7 GW.

 

Empresas aéreas se preparam para os extremos da mudança do clima

A aviação internacional é responsável por cerca de 3,5% das emissões mundiais de gases de efeito estufa. Um artigo do Financial Times conta das turbulências que o setor enfrentará por conta do aquecimento global. É mais difícil para os aviões levantarem voo em temperaturas mais altas, e cada avião tem uma temperatura limite acima da qual não deve decolar. Tempestades mais frequentes e intensas atrapalharão os planos de voos mais longos. A elevação do nível do mar aumentará a frequência de aeroportos fechados por inundações de suas pistas. Em 2014, o mau tempo provocou um atraso total de 2.400 minutos por dia. Em 2018, esse valor subiu para 14.600, seis vezes mais. Para os aeroportos do mundo todo, o mau tempo foi a principal causa dos atrasos. Isso sem falar no desconforto durante o voo quando da entrada em zonas de turbulência de céu limpo, invisíveis e inesperadas. Talvez o conjunto destes problemas afaste passageiros e reduza, assim, as emissões da aviação.

O artigo do Financial Times diz que os passageiros da rota entre Nova York e Londres, provavelmente, serão os únicos a ganhar com a mudança do clima. É que mudanças particulares do jet-stream estão reduzindo o tempo de voo de cerca de 7 horas para pouco mais de 5 horas.

 

O impacto do aquecimento sobre o maior e mais profundo lago do mundo, o Baikal

O lago Baikal, no sul da Sibéria, tem uma área maior do que a da Bélgica e chega a uma profundidade de mais de 1,6 km. É considerado o lago mais antigo da Terra. Na parte sul do lago, espécies que só existem por lá estão perdendo a competição para espécies exóticas porque o clima está mudando. As invasoras aproveitam as temperaturas mais altas ou uma redução no rigor do inverno siberiano. O artigo da The Conversation diz que, se por enquanto o estrago é muito pequeno e localizado, “pode ser um sinal prévio do pode vir a acontecer no resto do lago nas próximas décadas”.

 

Para ir

Moradia e Expansão das Metrópoles Brasileiras

O Instituto Escolhas e a Folha de São Paulo promovem o seminário Moradia e Expansão das Metrópoles Brasileiras, em parceria com o Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getúlio Vargas e apoio da Fundação Tide Setubal, para lançar os resultados de um estudo que analisa o programa Minha Casa Minha Vida no contexto da expansão das metrópoles brasileiras. O trabalho busca entender o quanto melhorou a qualidade de vida dos beneficiários.

Ainda durante o seminário, será lançada a plataforma interativa ‘#Quantocusta? Morar Longe’, que permite avaliar o custo e a qualidade de um empreendimento habitacional a partir de sua localização.

Dia 22 de janeiro, das 8h30 às 12h, no salão nobre da Fundação Getúlio Vargas, Rua Itapeva, 432, São Paulo.

Inscrições aqui.

 

Para enviar trabalhos e concorrer

Prêmio MapBiomas

Para estimular e ampliar mais aplicações e trabalhos com análises de mudanças de uso da terra no território brasileiro, a iniciativa resolveu lançar o Prêmio MapBiomas em parceria com o Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) e o Instituto Escolhas, e com apoio do Instituto Clima e Sociedade (iCS).

Nesta primeira rodada, o MapBiomas premiará trabalhos que explorem as relações entre a infraestrutura de energia e transporte e as mudanças de cobertura e uso da terra no Brasil.

Prazo de entrega até 31 de janeiro. Mais informações sobre a premiação e como participar aqui.

 

Para calcular

Qual a pegada de carbono do que você come?

Pesquisadores de Oxford lançaram uma calculadora da pegada de carbono do que você come, utilizando dados médios globais. A BBC comparou alguns alimentos usando a calculadora. Um bife, por exemplo, embute 16 vezes mais emissões do que uma porção equivalente de tofu. As tabelas também comparam a pegada de carbono dos bifes de diferentes regiões do mundo. A pegada dos bifes latino-americanos é a maior de todas, provavelmente porque incluem um pouco do desmatamento da região nas suas emissões. A calculadora dá uma boa ideia das emissões que estão por trás daquilo que comemos. Uma sugestão para aprimorar a calculadora seria incluir as emissões do transporte destes alimentos e a fração que não chega à mesa do consumidor, perdida em desperdícios.

 

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