ClimaInfo, 11 de fevereiro de 2019

ClimaInfo mudanças climáticas

Desastre da Vale 1: destaque no New York Times

Uma das melhores matérias sobre a tragédia provocada pela Vale em Brumadinho foi publicada neste final de semana pelo New York Times. A matéria diz que “o dilúvio de lama tóxica se estendeu por oito quilômetros, esmagando casas, escritórios e pessoas – uma tragédia, mas dificilmente uma surpresa.” Segundo o NYT, existem 88 represas de rejeitos de mineração similares à que desmoronou em Brumadinho, “enormes reservatórios de rejeitos de mineração contidos por pouco mais que areia e lodo”. Segundo o governo, 84 delas são tão ou mais vulneráveis que a do Córrego do Feijão. Destas, quase 30 ficam diretamente acima de cidades e vilas onde moram mais de 10.000 pessoas.

O diagnóstico do NYT é mortal: “Um reservatório fraco de rejeito de mineração, construído o mais barato possível, situado em cima de uma cidade. Problemas estruturais ignorados que poderiam indicar um colapso e equipamentos de monitoramento que haviam parado de funcionar. E, talvez acima de tudo, um país onde a poderosa indústria da mineração está livre, ou quase, para fazer o que quiser.”

Além de trazer fotos de satélite mostrando o caminho da lama, a matéria explica de maneira simples e direta porque o assim chamado reservatório se rompeu. “Começa em um pontinho pequeno e, talvez em um segundo, já é uma faixa. Rapidamente a parede desaba e o reservatório vira um inferno e a represa simplesmente desaparece.”

A matéria coloca o dedo em uma segunda ferida. Dada a falta de fiscais do governo, “as mineradoras podem se autorregular, contratando auditores independentes para verificar a segurança dos reservatórios em inspeções periódicas – sempre pagos pelas mineradoras” – um claro conflito de interesse onde o resultado só pode ser menos custo para a empresa e mais risco para trabalhadores, populações e o meio ambiente.

O artigo termina com uma nota macabra. Diz que, ao longo de várias reuniões com a comunidade, técnicos da Vale diziam que os reservatórios eram super-seguros e que seus escritórios ficavam logo abaixo da represa. “Nós seríamos os primeiros a morrer”.

 

Desastre da Vale 2: uma lição para o governo

O ex-Ministro do Meio Ambiente, José Carlos Carvalho ,disse que o desastre da Vale “deu um choque de realidade no governo”. Carvalho explica que a Lei Nacional da Política Ambiental Brasileira prevê cinco instrumentos de atuação – monitoramento, fiscalização, zoneamento, informação e licenciamento – mas seu emprego “acabou se resumindo a apenas um dos seus instrumentos, que é o licenciamento.” José Carlos fala especificamente da mineração: a Constituição estabelece que o subsolo é propriedade da União, mas que as concessões para exploração mineral são feitas sem nenhuma avaliação ambiental – isso fica para o licenciamento. Na fase de licenciamento dificilmente um empreendimento é rejeitado, no máximo determina-se condicionantes que, uma vez cumpridas, o negócio pode ir em frente. Assim, o poder público abre mão de zelar pelos interesses da comunidade em prol dos interesses de grupos econômicos.

Para quem imagina que o desastre da Vale arranhará a imagem da empresa no exterior e criará pressões para a melhoria da governança ambiental de suas atividades, Carvalho dá um recado seco: “Eu acho que arranha a imagem, mas vamos ser sinceros, o maior comprador de minério hoje é a China. A China não está nem aí. Então, não vamos cair na ingenuidade de achar que o país vai criar restrições na compra de minérios do Brasil por causa do meio ambiente e morte de inúmeras pessoas. Pelo contrário, eles podem usar isso para forçar a baixa da commodity no mercado internacional.”

 

Desastre da Vale 3: leis que não são cumpridas

Uma frase clássica do mundo político brasileiro classifica as leis segundo aquelas que pegam e as que só existem no Diário Oficial. Em menos de um mês, tragédias que não podiam ter acontecido no Brasil do século 21, aconteceram e levaram a mais de 160 mortes no desastre da Vale, a 7 mortes nas chuvas do Rio e a 10 mortes no incêndio no CT Ninho do Urubu do Flamengo. Em comum, são tragédias anunciadas pelo absoluto descaso que os ditos responsáveis têm para com a lei. Flávia Oliveira escreveu um artigo contundente n’o Globo antes da última tragédia, dizendo que “a regra aqui não é prevenir nem remediar; é esperar pela próxima ocorrência.” Poucas horas depois de escrever o artigo, os contêineres do Ninho do Urubu pegaram fogo.

Como aconteceu nos desastres da Samarco e da Vale, os dirigentes do Flamengo simplesmente ignoraram as leis. No caso das mineradoras, as licenças foram concedidas no limite do risco. No caso do Flamengo, seus dirigentes economizaram colocando os meninos em contêineres provisórios onde deveria ser um estacionamento.

Os governos do Rio sabem de há muito dos riscos de deslizamentos nos morros da cidade. São eleitos por forças “ocultas” que dependem da precariedade para movimentar seus negócios.

Quando confrontados com a pilha de mortes que se avoluma, se abrigam atrás do emaranhado de recursos que o sistema jurídico permite a quem pode pagar os melhores escritórios de advocacia. Lembram, no limite, o texto de Morte e Vida Severina: “Como aqui a morte é tanta, só é possível trabalhar, nessas profissões que fazem da morte ofício ou bazar.”

 

O tempo esquenta para o agronegócio

Na semana passada, a NASA e o serviço de Mudança Climática da União Europeia disseram que 2018 foi o quarto ano mais quente dos registros e o serviço meteorológico britânico, o Met Office, avisou que, a continuar a tendência atual, é possível que a barreira dos 1,5oC acima dos níveis pré-industriais seja ultrapassada nos próximos cinco anos.

A novidade é que o público rural está tomando nota. O pessoal do Canal Rural deu a notícia e foi falar com meteorologistas para entender melhor o que está acontecendo e o que está por vir. O ex-ministro da agricultura, Roberto Rodrigues, escreveu na sua coluna no Estadão fazendo várias alusões à safra “que dependerá do clima, hoje incerto” e a uma “chuva (…) irregular e mal distribuída (…) de modo que já se prevê uma quebra significativa do volume nacional da soja” e “mais a quebra de produção de cana em função da seca”. Roberto conclui dizendo que “o agro está mesmo perdendo renda, e não é pouca”.

Às duas matérias, só faltou juntar lé com cré e dizer que o desmatamento da Amazônia e do Cerrado contribui para mudar o clima global e localmente. Certo, o desmatamento não é o único responsável pela mudança do clima e nem a mudança do clima é a única responsável pelas chuvas irregulares e pelas secas. Mas sua contribuição é incontestável e, portanto, não faz sentido apoiar políticas que só piorarão a situação no campo.

 

A mudança do clima e a segurança nacional

O ex-Ministro da Marinha do governo Collor, almirante Mario Cesar Flores, manifestou em artigo preocupação com “meio ambiente, clima e suas relações com a política externa”, em função de uma série de decisões e declarações feitas nestes primeiros dias do novo governo. Como “meio ambiente e clima não se sujeitam às fronteiras políticas”, ele discorda do discurso de afastamento de organismos multilaterais, “que são essenciais num mundo integrado e diverso”. E coloca que o bilateralismo é um jogo ruim quando a disparidade entre os parceiros é muito grande. Ao fim, o recado do almirante é quase uma prece: “Resta ‘torcer’ para que (as mudanças do novo governo) sejam protegidas das injunções de interesses econômicos, da conveniência de associações bilaterais e de arrolos do nacionalismo populista ao estilo “America first”, quando não sancionadas pelo multilateralismo global e/ou implicarem condutas contrárias ao que sugerem a ciência e a realidade. E protegidas de influências ideológicas do tipo “a questão climática seria um complô marxista”.

Adriana Erthal Abdenur, do Instituto Igarapé, escreveu um artigo sobre a inter-relação entre segurança nacional e mudança do clima. Ela cita impactos diretos de furacões, vendavais e enchentes em bases militares. Mas, mais importante do que impactos diretos, Abdenur aponta para os conflitos causados ou agravados por condições climáticas extremas. Ela coloca na pauta algo bem mais próximo a nós: “Na Amazônia, mudanças nos padrões pluviais afetam os padrões de seca e de inundações. Isso exacerba os conflitos em torno da terra, provoca enormes fluxos migratórios internos e contribui para crises hídricas em grandes regiões metropolitanas, tais como São Paulo.” E adverte: “Faltam, portanto, políticas e diretrizes que levem a sério o enorme impacto que as mudanças climáticas já surtem sobre os interesses nacionais, e os efeitos ainda mais graves que o fenômeno causará sobre a segurança durante as próximas décadas. As mudanças climáticas requerem uma visão a longo prazo, sob uma ótica de direitos humanos e fundamentada no planejamento sistemático e de precaução.”

Recados do almirante e da pesquisadora se alinham.

 

Hidrelétrica polêmica seca importante rio da Colômbia

Grandes hidrelétricas são polêmicas em todo o mundo. Grandes hidrelétricas na Amazônia são ainda mais polêmicas pelos enormes impactos socioambientais que podem provocar. A construção de uma hidrelétrica no Rio Cauca, na Colômbia, entrou com galhardia na galeria das obras que nunca deveriam ter sido feitas. O rio Cauca é o segundo rio mais importante da Colômbia, percorrendo 1.350 km entre as cordilheiras Central e Ocidental até se encontrar com o Rio Magdalena, já perto do seu estuário no Caribe. No meio do seu curso, está sendo construída uma grande hidrelétrica, a Hidroituango, com 2,4 GW de capacidade. Durante a construção, as águas do Cauca foram desviadas para passar por três túneis enquanto a barragem era construída. Só que dois deles tiveram que ser abandonados. Em abril do ano passado, começaram a encher a represa. Problemas na obra inutilizaram o túnel que sobrou. O pessoal tentou reativar os dois primeiros, mas não conseguiu. A represa continuou a encher, mas sem que houvesse nenhum mecanismo de escoamento. A água chegou a atingir o canteiro de obras. Sem que houvesse qualquer ação humana, um dos túneis tornou a abrir e a água começou a jorrar em alta vazão, provocando inundações e fazendo com que 25 mil pessoas precisassem ser evacuadas. Com esse descontrole, os engenheiros começaram a temer pela estrutura da barragem e pelas mais de 130 mil pessoas sob alerta de evacuação. Para voltar a controlar a vazão, entenderam que era preciso que a represa enchesse até chegar nos vertedouros. Só que começou o período seco. Eles decidiram, primeiro, reduzir drasticamente a vazão de água e, dias depois, fechar completamente as comportas. Alguns quilômetros rio abaixo, a medição do nível despencou, em dois dias, de quase 2 metros para menos de meio metro. Segundo a BBC, as “comunidades que antes haviam sido evacuadas devido a enchentes, agora enfrentavam problemas para pescar e irrigar seus campos agrícolas.” E ninguém sabe quanto tempo essa situação perdurará.

 

O colapso da população de insetos levará ao colapso da vida como conhecemos sobre a Terra

Os insetos estão na base da pirâmide alimentar de quase toda a vida na Terra. Elimine os insetos e muitos peixes, répteis e pássaros desaparecem. E os outros peixes, répteis, pássaros e mamíferos que se alimentam destes primeiros. Plantas que dependem de insetos para polinização também se vão. Em suma, a vida sobre o planeta, tal qual a conhecemos, marcharia a passos largos para uma extinção.

E é isto que está começando a acontecer, de acordo com a primeira grande revisão científica sobre a população de insetos no mundo. O trabalho que acaba de ser publicado pela revista científica Biological Conservation mostra que mais de 40% das espécies de insetos estão ameaçadas de extinção.

– Dentre os mais afetados estão borboletas e mariposas, vespas (Lepidoptera); abelhas e formigas (Hymenoptera); besouros e joaninhas (Coleoptera).

– No meio aquático, quatro taxa estão ameaçadas e já perderam uma quantidade grande de espécies: as libélulas (Odonata), plecópteros, tricópteros e efeméridas.

– A perda de habitat para a agricultura intensiva é o principal vetor do declínio.

– Poluentes agroquímicos, espécies invasivas e a mudança do clima são causas adicionais.

O The Guardian escreveu a respeito.

 

Ártico quente empurra ursos polares para ilhas russas

Um Ártico com menos gelo por causa do aquecimento global está fazendo com que os ursos polares passem mais tempo caçando em terra do que nos bancos de gelo. Segundo a BBC, no arquipélago russo de Nova Zemba, os ursos estão entrando em casas e prédios públicos buscando comida. A matéria diz que houve ataques à população: “o principal assentamento do arquipélago, Belushya Guba, registrou 52 ursos polares nas proximidades, sendo que um grupo de 6 a 10 deles transita constantemente pelo território.”

Curioso que a matéria da BBC tenha sido classificada como “curiosidade”.

 

 

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