A comédia de erros de Bolsonaro sobre a exportação de madeira ilegal

23 de novembro de 2020

O discurso desconexo de Bolsonaro ao G20 foi o ápice de uma semana de polêmicas sobre a situação do meio ambiente no Brasil. O presidente tinha prometido revelar os países que atuariam como “receptadores” de madeira ilegal brasileira, em uma tentativa de distorcer o debate público sobre o desmatamento ilegal no país. A insinuação era de que boa parte das nações que criticam a política ambiental do Brasil (em especial, na Europa) serviria também como mercado consumidor da madeira derrubada de maneira ilegal na Amazônia.

Mas “a montanha pariu o rato”: ao invés de falar sobre os países, Bolsonaro recuou e disse que apresentaria o “nome de empresas” estrangeiras que comprariam essa madeira ilegal – e, ainda assim, não apresentou nome algum.

O recuo bolsonarista faz sentido: especialistas, empresas e diplomatas reagiram de forma dura à insinuação de Bolsonaro sobre os países europeus e criticaram a tentativa do governo de terceirizar a responsabilidade sobre o controle do desmatamento para o exterior. A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que reúne mais de 250 representantes do agronegócio, sociedade civil, setor financeiro e academia, afirmou que cabe ao poder público o enfrentamento mais forte do desmatamento, já que os demais atores não têm poder nem autoridade para fiscalizar e reprimir ilegalidades na cadeia da madeira.

Já ao Estadão, o embaixador da Dinamarca no Brasil, Nicolai Prytz, disse que cabe ao governo federal contatar as autoridades dinamarquesas caso identifique alguma empresa do país envolvida com atividades ilícitas de qualquer natureza. O jornal também ouviu Roberto Waack, que ressaltou que o principal mercado consumidor da madeira ilegal da Amazônia não está fora do país, mas sim dentro. “A exportação não é o foco da questão. O ponto é que o consumo é aqui mesmo. É ótimo ir atrás de quem compra madeira ilegal, mas antes tem muita coisa para resolver aqui, especialmente os esquemas para ‘esquentar’ a madeira no país”.

Na Folha, Vinicius Sassine destacou decisões recentes da direção do Ibama que facilitaram o fluxo comercial de madeira ilegal, diminuindo a responsabilização por parte das empresas sobre a origem do material. A queda nas vistorias do produto in loco, ainda nos portos e antes do embarque, também é vista como um fator contribuinte do aumento da exportação de madeira ilegal amazônica. Ele também mostrou que os traficantes de madeira ilegal adaptaram suas operações após a Polícia Federal e o Ministério Público Federal (MPF) terem desbaratado um esquema de lavagem de madeira no porto de Manaus. De acordo com investigadores, os criminosos passaram a direcionar os carregamentos ilegais para portos no Sudeste e no Sul, em especial Santos e Paranaguá.

Também no Estadão, André Borges lembra que “as organizações socioambientais, que já foram chamadas de ‘câncer’ pelo presidente Jair Bolsonaro, foram as instituições que recorreram à Justiça para tentar derrubar uma decisão do governo que, na prática, fragilizou o controle da exportação de madeira no país, favorecendo a saída de material ilegal do Brasil.”

No Valor, Assis Moreira sugeriu que a União Europeia deve usar a fala de Bolsonaro sobre o comércio de madeira ilegal para reforçar o endurecimento das regras de acesso de produtos tropicais no mercado europeu – o que atinge em cheio os interesses comerciais do agronegócio brasileiro.

O vai-e-vem de Bolsonaro sobre a exportação de madeira ilegal foi repercutido por Correio Braziliense, Estadão, Folha, O Globo, Reuters e Valor.

 

ClimaInfo, 23 de novembro 2020.

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