Com prolongamento da guerra na Ucrânia, aumentam incertezas sobre ação climática global

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Alexander Ermochenko/Reuters

Dois meses depois dos primeiros tanques russos invadirem o território da Ucrânia, os dois lados seguem sem perspectivas de uma resolução rápida para o conflito. A guerra dinamitou a ordem política internacional do pós-Guerra Fria e intensificou as tensões e as desconfianças entre as grandes potências globais, trazendo de volta ameaças tidas como superadas até pouco tempo atrás, como a da guerra nuclear.

Uma das vítimas colaterais do conflito no leste europeu certamente foi a cooperação climática global. Com o isolamento político e econômico da Rússia e os reflexos da alta do petróleo nos mercados energéticos, a ordem do dia dos governos passou a ser garantir a oferta de combustíveis fósseis, ainda que às custas dos compromissos e das metas de mitigação da mudança do clima. O otimismo observado na Conferência de Glasgow (COP26), realizada há apenas cinco meses, definitivamente ficou para trás.

No Washington Post, Ishaan Tharoor apontou a crise ucraniana como um “marco” para a transição energética global: ou os países acordam para a necessidade de se distanciar dos combustíveis fósseis e avançar rumo à descarbonização da energia, garantindo energia segura e limpa para seus mercados, ou eles seguirão reféns do humor dos ditadores de plantão que governam os principais países produtores de petróleo e gás natural. Nesse sentido, ele destacou o exemplo da Espanha, que anunciou o investimento da maior parte dos recursos destinados pela União Europeia para recuperação pós-pandemia na expansão da geração de energia renovável. 

Mas o caso espanhol é uma exceção. Infelizmente, na maior parte dos países, inclusive na Europa, o raciocínio ainda está calcado na busca por mais combustíveis fósseis. A Bloomberg repercutiu como o aumento de demanda por carvão fez com que o preço do combustível ficasse mais caro no mercado internacional, menos de dois anos após ele ter caído para o menor patamar da história. A China tem sido outro ator importante na retomada infeliz do carvão, como destacamos ontem aqui.

A disrupção da cooperação internacional, causada pela guerra na Ucrânia, também está colocando em xeque o modelo diplomático que garantiu por décadas a gestão do Ártico, uma das regiões mais vulneráveis e afetadas pela mudança do clima. A Rússia, que possui a mais longa fronteira marítima com o Oceano Ártico do planeta, está suspensa do Conselho do Ártico, o principal fórum de cooperação internacional na região. Como a Vox ressaltou, isso não compromete apenas o diálogo e a comunicação entre os países árticos, mas também projetos de pesquisa climática e ambiental que monitoram e analisam as mudanças pelas quais o extremo norte da Terra está passando por conta da crise climática. Um efeito colateral disso pode ser um blecaute científico nos próximos anos, com pesquisas seriamente prejudicadas.

Em tempo: A guerra também representa uma catástrofe ambiental para a própria Ucrânia. Além da perda assombrosa de vidas e da destruição de sua infraestrutura, os ucranianos estão lidando com os primeiros reflexos da guerra na saúde das pessoas: incêndios em fábricas e prédios civis e militares, bem como explosões, estão liberando um grande volume de poluentes no solo, na água e na atmosfera, criando um caldeirão tóxico que pode ter efeitos pelas próximas décadas. O Wall Street Journal destacou essa história.

 

ClimaInfo, 26 de abril de 2022.

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