Guerra, energia e calor: ação climática ganha obstáculos na Europa

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Genya Savilov/AFP

O cenário vivido hoje pelos europeus pode ser comparado a um verdadeiro “inferno astral”, para quem acredita nas estrelas. A retomada econômica pós-pandemia colocou um gato preto no caminho da Europa, com um aumento da demanda e, por tabela, da inflação. Depois, a invasão da Ucrânia pela Rússia e os efeitos geopolíticos da crise “quebraram o espelho” dos europeus, levando os preços da energia para a estratosfera.

Para completar o azar, a onda de calor “derrubou o saleiro”, aumentando a demanda energética e, ao mesmo tempo, prejudicando a oferta, com usinas operando parcialmente para evitar dano aos equipamentos elétricos.

Noves fora o chiste, não há amuleto da sorte que consiga dar conta de tanto azar. O pior é que isso não complica apenas a situação atual dos europeus, mas também prejudica as possibilidades de enfrentamento das mudanças climáticas pelo continente.

Como escreveu Rafael Garcia no Um Só Planeta, os governos europeus diminuíram a prioridade dada à ação climática nos últimos meses, com medidas para reforçar a geração de energia a partir de fontes fósseis.

“Na Europa, já vínhamos enfrentando ondas de calor intensas nos últimos dez anos, que acabaram gerando uma preocupação muito transitória. O discurso é que a economia vem primeiro e a ecologia, depois”, comentou Claude Gruffat, membro francês do Parlamento Europeu. “Na França, o governo diz que os verdes defendem uma ecologia punitiva, mas punição é o que nós vamos ver nos próximos anos se não mudarmos de comportamento. Será mais calor, mais inundações, mais migrações”.

Na Conferência do Clima de Glasgow (COP26), em novembro passado, muitos países europeus colocaram na mesa propostas e sinalizações ambiciosas para se abandonar o carvão e ampliar a geração de energia por fontes renováveis ao longo desta década. Nem um ano se passou e muitas dessas promessas já podem ser consideradas “letra morta”, descoladas de qualquer ação prática imediata e de médio prazo dos europeus.

Alheios a isso, os russos seguem na estratégia de estrangulamento energético para derrubar a oposição da União Europeia às ações militares de Vladimir Putin na Ucrânia. Como prometido um dia antes, a Gazprom reduziu nesta 4a feira (27/7) o volume de gás natural transportado para seus clientes na Europa por meio do gasoduto Nord Stream 1. De acordo com o governo da Alemanha, o fornecimento foi cortado para ⅕ da capacidade total, o que está sendo considerado uma chantagem da Rússia contra os países europeus. Associated Press, Bloomberg, Financial Times, NY Times, Reuters, RFI e Valor, entre outros, repercutiram a notícia.

A expectativa da UE é de que a Rússia siga nesse vai-e-vem com o gás, com a possibilidade de interromper totalmente o fornecimento no final do ano, em pleno inverno, quando a demanda pelo combustível é muito maior por conta do frio. Segundo a Reuters, o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, sinalizou a possibilidade de aumento do fornecimento de gás para seus vizinhos europeus como uma maneira de evitar o colapso do sistema energético sem a necessidade do gás russo. Em junho, a Espanha reexportou cerca de 20% do gás natural liquefeito que havia importado para outros países do continente.

Outra notícia da Reuters é o movimento da França para ajudar a Alemanha durante o inverno com a possibilidade de fornecer até 20 TWh de gás para substituir o gás russo. Isso representa 5% do consumo francês de gás e cerca de 2% do consumo alemão.

 

ClimaInfo, 28 de julho de 2022.

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