
A Petrobras e o BNDES assinaram na 5ª feira (22/6) um acordo de cooperação técnica com foco em transição energética, pesquisa, desenvolvimento científico e reindustrialização. Foi criada uma comissão mista, que se reunirá a cada dois meses. O presidente do banco, Aloizio Mercadante, disse que pretende aumentar o limite de investimentos na petroleira e que, para isso, tem conversado com o governo federal.
Seria, digamos, “ok”, não fossem os constantes sinais dados por ambos sobre o que consideram “transição energética”. De um lado, Mercadante e Luciana Costa, diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Mudança Climática do banco, defendem a exploração de petróleo na Margem Equatorial como passo para a expansão das fontes renováveis na matriz energética brasileira [?]. De outro, Jean Paul Prates, presidente da Petrobras, também aposta na perfuração de um poço de petróleo na foz do Amazonas como estratégia de transformação da petroleira numa empresa de energia diversificada [??].
Em entrevista à Folha, Prates diz que não considera “fim de linha” a negativa do IBAMA para o pedido de licença para o poço no bloco FZA-M-59. No entanto, pontua que, se for necessário esperar a conclusão da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) – estudo minucioso e detalhado, determinado por portaria conjunta de 2012 dos ministérios do Meio Ambiente e Minas e Energia –, “realmente inviabiliza esse contrato de concessão”. Cumprir a regra virou problema.
O presidente da Petrobras ainda afirma que “se, no limite, o estado brasileiro entender que aquilo [a foz] é uma área interditada para a perfuração de petróleo, nós vamos respeitosamente sair de lá e explorar em outras áreas da margem equatorial”. Só esqueceu que há outros pontos bastante sensíveis ambientalmente nessa região que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte.
A Folha lembra que a possibilidade de explorar petróleo a 250 km da costa de São Luís, como querem Petrobras, governo do Maranhão e empresários, esbarra na maior formação de recife de corais da América do Sul, o Parcel de Manuel Luís. Parque estadual e berçário de várias espécies endêmicas e ameaçadas de extinção, o parcel é um dos ambientes recifais mais exuberantes do continente. Além disso, a exploração de petróleo coloca em risco a maior linha contínua de manguezais do planeta, que vai do Amapá ao Maranhão.
Projeções da Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês) mostram que a demanda por petróleo vai começar a cair em cinco anos, a partir de 2028. Mas isso não parece fazer a Petrobras deixar seu afã por mais combustíveis fósseis. Segundo o Estadão, a petroleira planeja voltar à África em busca de petróleo, se seus planos para explorar a Margem Equatorial não forem adiante. Há uma aposta firme na exploração de reservas ricas em gás fóssil descobertas em blocos da companhia na Colômbia – país que está querendo reduzir sua produção de combustíveis fósseis por causa da crise climática. E também não descarta ir à Guiana e ao Suriname, as novas “queridinhas” do petróleo na América do Sul.
No Valor, Ricardo Junqueira Fujii, do WWF-Brasil, e Suely Araújo, do Observatório do Clima, ressaltam que a oferta de energia no Brasil está garantida para as próximas décadas. Seja porque boa parte dela já é proveniente de fontes renováveis, seja porque as reservas de petróleo já descobertas, notadamente do pré-sal, são grandes e continuam a se expandir.
Ambos também rebatem o falso argumento de que é preciso mais petróleo para supostamente “financiar” a transição energética. “É justamente o contrário: à medida que investidores, empresas e governos alocam recursos financeiros na busca e desenvolvimento de reservas de petróleo, diminui a capacidade de investimento em projetos de fontes renováveis de energia. Sejam eles projetos tradicionais, como os de energia eólica, solar fotovoltaica e biocombustíveis, ou inovadores, como eletrificação dos transportes, hidrogênio de baixo carbono e combustíveis sintéticos”, explicam.
O fato é que a apropriação indevida da noção de “transição energética” pelos defensores dos combustíveis sujos é tanta que Maurício Tolmasquim, que assumiu a diretoria recentemente criada pela Petrobras com tal nome, anunciou que está nos planos da empresa a instalação de uma termelétrica a gás fóssil no polo GasLub (o antigo Comperj), no Rio de Janeiro, segundo o Estadão. E descartou sair desse mercado. E nada de projetos renováveis.
O acordo entre BNDES e Petrobras para estudos sobre “transição energética” foi noticiado por epbr, Poder 360, Agência Brasil, Folha, Valor e CBN.
ClimaInfo, 26 de junho de 2023.
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