Assembleia da ONU evidencia divisões no tabuleiro da transição energética antes da COP28

ONU tabuleiro climático
Lu Guang / Greenpeace

Divergências sobre o fim dos combustíveis fósseis se intensificam e elevam pressão sobre a próxima rodada de negociações climáticas no final do ano em Dubai.

A pouco mais de dois meses da Conferência da ONU sobre o Clima em Dubai (COP28), as diferenças seguem superando as convergências nas discussões internacionais sobre clima. A Assembleia Geral da ONU, ocasião que poderia destravar algum entendimento, não logrou nenhum avanço político substancial, o que joga mais pressão sobre as negociações do final do ano nos Emirados Árabes Unidos.

As divergências estão presentes em diversos itens da agenda climática, desde ambição até financiamento climático e compensação por perdas e danos. Em termos políticos, no entanto, a proposta de um cronograma para o fim da queima de combustíveis fósseis nas próximas décadas vem sendo o “pomo da discórdia” nas conversas pré-COP28.

Defendida pela União Europeia e pelo secretário-geral da ONU, António Guterres, a proposta de abandono dos combustíveis fósseis foi duramente criticada pela China, sob o argumento de que não se trata de um objetivo “realista”.

Segundo a Bloomberg, o enviado especial chinês para as negociações climáticas, Xie Zhenhua, defendeu uma abordagem mais cautelosa. “Devemos construir o novo antes de descartar o antigo”, disse ele em uma gravação exibida durante um evento em Pequim na semana passada. O Climate Home também repercutiu essa fala.

A crítica de Xie acontece ao mesmo tempo em que o colega dele, o norte-americano John Kerry, questiona a “fome” dos países asiáticos por novos projetos de energia baseados em fontes fósseis, principalmente carvão.

“O que me enfurece, francamente, [é que] não estamos limitando as contribuições para o problema em uma escala suficientemente ampla, e com isso quero dizer que as emissões estão aumentando. A humanidade segue planejando, construindo e queimando combustível fóssil de forma contínua”, disse Kerry, citado pelo Financial Times.

A Reuters destacou o discurso dos países produtores de energia fóssil na ONU, no qual defenderam com maior ênfase a utilização de tecnologias para capturar e armazenar o carbono da atmosfera ao invés do fim da queima de petróleo, gás e carvão como caminho para combater a crise climática. Essa posição vem sendo encampada pelo futuro presidente da COP28 (e executivo petroleiro dos Emirados Árabes), Sultan Al-Jaber.

Por falar em produtores de energia fóssil, a presença da indústria petroleira nas negociações climáticas em Dubai também está dividindo os países. Grupos ativistas e representantes de nações mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas, como os pequenos países insulares, estão ressentidos com o destaque que os organizadores da COP pretendem dar ao setor petroleiro. O Financial Times destacou essa desconfiança.

“Se [as empresas fósseis] vão estar lá para obstruir e colocar obstáculos no sistema, elas não deveriam estar na conversa”, criticou a ex-secretária-executiva da Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima (UNFCCC), Christiana Figueres, citada pelo Guardian. “Minha paciência [com a indústria fóssil] acabou. Eles poderiam ter um impacto incrível na aceleração da descarbonização, mas decidiram não fazê-lo”.

Em tempo: A COP28 caminha para ser um desfile de conflitos de interesses. Além de ter um executivo petroleiro no comando das negociações climáticas, a equipe que organiza a realização da Conferência de Dubai está repleta de profissionais que também atuam no setor fóssil. O Guardian revelou que dois profissionais de relações públicas da empresa estatal ADNOC, presidida por Al-Jaber, estão atuando como “apoio adicional” no time de comunicação do evento, auxiliando na promoção de mensagens positivas sobre os Emirados Árabes e a COP.

 

ClimaInfo, 26 de setembro de 2023.

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