
A crise causada pelo apagão da última 6ª feira (11) em São Paulo segue encurralando a principal concessionária de energia elétrica do estado, a Enel. A empresa chegou a anunciar ontem que teria restabelecido o fornecimento elétrico para todos os clientes com pedidos protocolados de religamento. No entanto, como O Globo apontou, cerca de 36 mil imóveis seguiam às escuras pela manhã.
A Folha visitou casas que ainda estavam sem energia elétrica na zona sul de São Paulo. Mesmo clientes com solicitações de religamento protocoladas junto à Enel seguiam sem qualquer sinal da volta da energia, a despeito do anúncio da empresa. Estabelecimentos comerciais tiveram que recorrer a geradores de energia para diminuir o prejuízo causado pelo apagão. Agência Brasil e g1 também abordaram a situação.
De acordo com a Enel, cerca de 3,1 milhões de imóveis foram afetados pelo apagão causado pela tempestade do último dia 11, um milhão a mais do que o estimado inicialmente pela empresa. Desses, cerca de 1 milhão tiveram o fornecimento elétrico restabelecido no mesmo dia, mas a maior parte só experimentou a volta da energia elétrica ao longo do final de semana passado. Os números foram destacados por Estadão, Metrópoles e Valor.
A situação pode ficar ainda mais complicada neste final de semana. A expectativa é de que uma nova frente fria chegue ao estado de São Paulo e se choque com uma massa de ar quente, criando as mesmas condições que causaram o forte temporal da última 6ª feira. Segundo o Estadão, a Enel informou que manterá sua operação reforçada nos próximos dias, com cerca de 2,4 mil profissionais, para manter e reparar eventuais danos à rede elétrica.
Enquanto isso, a novela política em torno do apagão segue quente. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, fez coro ao pedido de prefeitos e do governo de São Paulo por uma intervenção federal na Enel. Ele criticou a empresa por “não conhecer a realidade nacional” e lembrou as circunstâncias que resultaram na sua saída no estado de Goiás; sob risco de sanções, a Enel repassou a operação à Equatorial Energia no início de 2023.
Silveira também criticou os atuais contratos de distribuição de energia, classificados como “frouxos e inadequados à realidade do novo momento energético do mundo”, que enfrenta eventos climáticos mais severos. O ministro afirmou que isso deve mudar nos novos contratos de concessão. O Valor deu mais detalhes.
O Globo destacou que a crise causada pelo apagão do último dia 11 evidenciou as novelas que marcam o setor elétrico brasileiro, bem como o esforço de Silveira e de outros atores para ampliar sua influência. Um dos panos-de-fundo da crise é a tensão entre o governo federal e a ANEEL, comandada por nomes indicados pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. Não à toa, um dos alvos de Silveira no episódio atual é a direção da agência, em especial seu presidente, Sandoval Feitosa.
O embate entre governo e ANEEL deve aumentar, já que a Controladoria-Geral da União (CGU) confirmou que está apurando possíveis irregularidades cometidas pela Enel e pela agência no apagão em São Paulo. Uma das investigações do órgão mira agentes da ANEEL que possam ter atuado com “desídia, corrupção ou conflito de interesses”, informou a CartaCapital.
Especialistas ouvidos pelo Valor consideram que o apagão em São Paulo expôs a ANEEL à pior crise institucional desde sua criação, em 1998. Nem o racionamento de energia em 2001, nem a reformulação do marco regulatório do setor elétrico, entre 2003 e 2004, foram tão críticos para a agência como a enxurrada de acusações do poder público dos últimos dias.