BHP tenta se eximir pela tragédia do rompimento de barragem em Mariana

tragédia de Mariana
Gelvana Rodrigues, que perdeu seu filho de sete anos, Thiago, quando a lama invadiu sua casa. (via BBC)

Mais de 620 mil pessoas estão processando a mineradora no Reino Unido por causa do desastre e pedem uma indenização estimada em R$ 266 bilhões.

“Realmente esperamos que a Justiça inglesa faça o que a Justiça brasileira não fez até agora.”

O desabafo é de Monica dos Santos, cuja família perdeu a casa no rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em novembro de 2015, informa O Globo. A esperança de Monica ocorre por causa do início do julgamento em Londres na 2ª feira (21/10) contra a mineradora anglo-australiana BHP, sócia da Vale na Samarco, dona da barragem, para determinar sua responsabilidade sobre o desastre. O rompimento da barragem, a maior tragédia ambiental do Brasil, matou 19 pessoas e destruiu todo o distrito de Bento Rodrigues.

Mais de 620 mil pessoas, incluindo o Povo Indígena Krenak, estão processando a mineradora no Reino Unido por causa do desastre, em uma ação da qual participam também 46 governos locais e cerca de 2 mil empresas. O valor estimado da indenização pedida é de R$ 266 bilhões – o que seria o maior valor da história da Justiça britânica e uma das maiores do mundo, explica a BBC. Serão 12 semanas de depoimentos, sustentações orais, apresentação de evidências e testemunhos de especialistas, detalha o g1.

O escritório Pogust Goodhead, que representa as vítimas do caso no Reino Unido, espera que a BHP feche acordo para encerrar o julgamento e dê início aos primeiros pagamentos ainda neste ano. No entanto, segundo a Folha, a mineradora não fará isso. A estratégia é concluir um acordo no Brasil, onde o pagamento das indenizações aos atingidos ocorrerá “por vias mais rápidas e fáceis”, segundo a companhia. E bem mais baratas, como se verá a seguir.

“Se a defesa da BHP for bem-sucedida, o caso do Reino Unido não terá prosseguimento. Se prosseguir, não é esperado que nenhum pagamento de indenização seja realizado antes de 2028-2030 naquela jurisdição”, disse a mineradora em nota.

Advogado das vítimas, Alain Choo Choy disse nos autos que “há um abismo entre o que a BHP considera ‘aceitável’ e a indenização à qual os reclamantes consideram ter direito legal e moral”, destaca a Reuters. Ele argumentou que as ações da BHP na luta contra o caso e no financiamento de litígios separados no Brasil mostraram que a mineradora estava “cinicamente e obstinadamente tentando evitar” a responsabilidade.

Na 6ª feira (18/10), a Vale divulgou um comunicado no qual informava, junto com a BHP, que estava próxima de um acordo final de indenização com as vítimas de Mariana no Brasil, informam Bloomberg Línea e Folha, cujo valor chegaria a R$ 170 bilhões. A cifra inclui R$ 100 bilhões em indenizações, a serem pagas ao longo de 20 anos, aos governos federal, dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo e de municípios afetados pela tragédia ambiental. No mesmo dia, o advogado-geral da União, Jorge Messias, apresentou a proposta para atingidos pela tragédia e movimentos sociais organizados.

Integrantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) que tiveram acesso à proposta criticaram os termos do acordo, que a Vale espera fechar ainda neste mês. O ponto mais contestado é em relação aos valores das indenizações individuais para os atingidos, considerados baixos, destaca a Folha. Segundo a entidade, as vítimas vão receber até R$ 30 mil. “Da forma que ela [a indenização] está apresentada no acordo, ela atende à estratégia das empresas”, disse Thiago Alves, integrante da coordenação nacional do MAB.

Enquanto BHP, Vale e Samarco pechincham indenizações, Giovanna Rodrigues, uma das 620 mil pessoas que pedem reparação na Justiça britânica e que perdeu seu filho de 7 anos, Thiago, quando a lama invadiu sua casa, lembra sua dor. “As últimas palavras que ouvi ele dizer foram: ‘você sabia que você é a melhor mãe do mundo?’ Passei três dias sem comer ou dormir, eu só queria achar meu filho”, ela conta. O corpo de Thiago só foi resgatado após sete dias. “Naquele dia, minha vida acabou, porque eu vivia para ele.”

UOL, Carta Capital, Metrópoles e RFi também repercutiram o início do julgamento da BHP em Londres pelo desastre de Mariana.

Em tempo 1: Os maiores executivos da BHP e da Vale, operadores da Samarco, ganharam aproximadamente US$ 516 milhões – R$ 2,9 bilhões – das mineradoras desde o rompimento da barragem em Mariana, informa Guilherme Amado no Metrópoles. Uma análise do portal de investigação britânico Finance Uncovered mostra que, sozinhos, os 38 maiores executivos da Vale e da BHP fizeram, desde o desastre, 1,07% do valor total da indenização destinada às mais de 600 mil vítimas da tragédia ambiental. As investigações também mostram que os executivos da Samarco eram mais incentivados financeiramente a aumentar os lucros da empresa do que a promover ações de prevenção de riscos.

Em tempo 2: Associações e comunidades atingidas pelo rompimento da barragem em Mariana intensificaram os pleitos para que o Supremo Tribunal Federal (STF) julgue presencialmente uma ação do Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM) que questiona ações judiciais de brasileiros contra companhias no exterior. O argumento do IBRAM – que citou explicitamente o julgamento da BHP na corte londrina – é de que esses processos ferem a soberania nacional, informa O Tempo.

 

ClimaInfo, 22 de outubro de 2024.

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