
O ex-primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair (1997-2007) saiu das catacumbas políticas para gerar controvérsia ao publicar um relatório questionando as políticas net-zero – metas globais que buscam zerar o impacto climático até 2050. As críticas não soaram bem aos ouvidos do atual premiê, o também trabalhista Keir Starmer, e de ativistas climáticos britânicos.
Na introdução de um novo relatório, o Instituto Tony Blair para Mudança Global (TBI) argumentou que pressionar países ricos a reduzir emissões de forma acelerada seria “irracional”, sugerindo que os líderes evitam um debate franco por medo de serem acusados de “negacionismo climático”. Segundo o Guardian, o documento propõe um reset nas políticas verdes, priorizando tecnologias futuras em vez de cortes imediatos nos combustíveis fósseis.
A reação da comunidade científica foi imediata. Sir Nicholas Stern, economista que liderou o relatório climático encomendado pelo próprio Blair em 2006, classificou o texto como “perigoso e fora da realidade”. Especialistas apontaram que o documento subestima o avanço das energias renováveis, como solar e eólica, que já são mais baratas que os combustíveis fósseis em muitos países, e ignora os riscos de adiar o net-zero.
A bola-fora do ex-parceiro de George W. Bush na invasão criminosa ao Iraque de 2003 pode ser explicada pelas conexões do ex-premiê com alguns petroestados. O instituto de Blair tem contratos milionários com Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, onde ele é próximo de Sultan Al Jaber, presidente da COP28 e CEO de uma petroleira estatal.
Em resposta, o governo Starmer reafirmou o compromisso do Reino Unido segue com seus objetivos net-zero. “A descarbonização é prioridade nacional”, declarou o premiê, em claro repúdio às teses do ex-líder. A ironia é histórica: Blair, que nos anos 2000 colocou o Reino Unido na vanguarda climática, hoje vê seu partido rejeitar seu discurso em favor de ações mais ousadas.
Como destacado pelo Guardian, a obsessão de Blair por tecnologias não comprovadas, como a captura de carbono em larga escala, conta com apoio de figuras abastadas. Larry Ellison, bilionário fundador da Oracle e aliado de Donald Trump, é um de seus principais financiadores, com doações ao TBI que superaram £52 milhões em 2023 e promessas de outros US$ 218 milhões. A conexão revela interesses alinhados: Ellison, forte investidor em IA (incluindo vigilância em massa) e que planeja data centers movidos a pequenos reatores nucleares, encontra eco nas propostas de Blair, defensor do uso dessas tecnologias em políticas energéticas.
BBC, Bloomberg, Guardian, Independent, Clean Technica, BBC, entre outros, analisaram as contradições e perigos da posição climática assumida por Tony Blair.
Em tempo: A imagem de Tony Blair não está queimada apenas com os britânicos. O Financial Times informou que o governo brasileiro rejeitou uma oferta de assessoria do TBI para a COP30. A decisão ocorreu pouco depois de Blair criticar publicamente a eficácia das COPs, declarando que o processo da ONU “não tem força para impulsionar ações concretas”.