O Irã e a transição energética

Guerra entre Israel e Irã confirma instabilidade extrema do mercado de petróleo e reforça urgência da segurança energética local e renovável.
25 de junho de 2025
  • Alexandre Gaspari, jornalista no ClimaInfo.

O mais novo conflito no Oriente Médio mostra que não é “só” o clima do planeta que precisa que os combustíveis fósseis sejam eliminados urgentemente e substituídos por fontes renováveis de energia. A soberania e a segurança energéticas dos países também dependem disso. Assim como as economias nacionais.

Analisemos os últimos dias. O mercado de petróleo global sofreu um baque com a guerra entre Israel e Irã, que contou com a participação dos Estados Unidos – estes dois últimos são grandes produtores mundiais da commodity. Referência mundial de preços, o barril do Brent disparou. Com a ameaça iraniana de fechar o Estreito de Ormuz, por onde passa volume significativo do petróleo produzido no mundo, analistas projetaram que o petróleo poderia chegar a US$ 130 – o dobro dos cerca de US$ 65 do Brent antes da guerra.

Com a escalada do preço do petróleo, os países começaram a fazer contas. O combustível fóssil ainda é a principal fonte energética do mundo, e a maior parte das nações ou não o produz, ou não dispõe de quantidade suficiente para garantir o abastecimento interno. Precisam importar óleo cru ou derivados e ficam sujeitos aos preços do mercado. 

De um lado, a dependência preocupa governos quanto ao abastecimento energético. Ainda que nas últimas décadas o mundo tenha visto um aumento expressivo no número de fornecedores de petróleo e gás, o Irã não só é um dos maiores produtores do mundo como é capaz de “barrar” a produção de outros países no Estreito de Ormuz. Isso faz com que as nações tenham de acionar um plano B para receber esses combustíveis fósseis, caso haja algum sobressalto.

E o plano B custa mais caro, obviamente, com base na famigerada lei de oferta e demanda. Assim, por mais que os países consigam garantir petróleo e gás fóssil de outros fornecedores, terão de pagar mais em momentos de escassez. Como esses combustíveis fósseis são usados pelos setores de transportes e energia elétrica, o aumento de seus preços pressiona inicialmente os custos desses segmentos, mas cria um “efeito cascata” sobre outros setores – afinal, não há atividade econômica no planeta que não precise de transporte e de eletricidade. No final, essa conta bate nos consumidores. Uma dor no bolso na certa.

E o Brasil nessa história? O país é autossuficiente na produção de petróleo, mas não tem capacidade de refino suficiente para transformar esse óleo cru em gasolina, óleo diesel e gás de cozinha, por exemplo. Embora seja exportador líquido de petróleo, o Brasil tem de importar esses combustíveis. Assim, fica à mercê dessas flutuações do mercado mundial, como a causada pela guerra entre Israel e Irã.

O conflito entrou na pauta da reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) desta semana. Uma das propostas analisada – e aprovada – no encontro é o aumento da adição de etanol na gasolina, dos 27% atuais para 30%, e do biodiesel no óleo diesel, de 14% para 15%. O aumento dos biocombustíveis nos combustíveis fósseis reduziria os gastos com importação e, assim, evitaria uma pressão sobre os preços da gasolina e do diesel no país.

O Brasil que criou o Proalcool nos anos 1970 justamente para sobreviver após as duas grandes crises do petróleo naquela época mostra, portanto, que tem alternativas renováveis e mais baratas para prescindir dos combustíveis fósseis. Isso vale também para o biodiesel, que é adicionado ao diesel fóssil.

No entanto, este mesmo país também está ávido por ampliar a exploração de combustíveis fósseis, inclusive em áreas de altíssima sensibilidade ambiental como a Foz do Amazonas e outras bacias da Margem Equatorial, mesmo já sendo exportador líquido de petróleo. E planeja investir em refinarias para diminuir sua dependência de derivados do petróleo, mesmo sabendo que essas plantas são caras, têm margem de lucro pequena e podem se tornar ativos encalhados em pouco tempo, já que o consumo desses derivados deve cair a partir de 2030, tanto aqui como no mundo, como projeta a Agência Internacional de Energia (IEA).

A insanidade não para aí. O mesmo Brasil que tem sua matriz elétrica 90% renovável e dispõe de vento e sol de sobra quer aumentar a quantidade de termelétricas a gás fóssil nessa matriz. Plantas que estarão vulneráveis à intermitência imprevisível dos preços dos combustíveis fósseis no mercado mundial.

Assim, o mais novo conflito mundial dá lições que valem não só para o Brasil, mas para todos os países. Se a urgência das mudanças climáticas não parece suficiente para convencer as nações de que precisamos acelerar a transição energética, que a soberania e a segurança energéticas, assim como as contas públicas e toda a população, sejam motivo suficiente para ampliarem o quanto antes a produção de energia localmente. E que essa energia seja renovável, blindada, portanto, da volatilidade de mercados globais de commodities como é o do petróleo e do gás fóssil.   

Continue lendo

Assine Nossa Newsletter

Fique por dentro dos muitos assuntos relacionados às mudanças climáticas

Em foco

Aprenda mais sobre

Justiça climática

Nesta sessão, você saberá mais sobre racismo ambiental, justiça climática e as correlações entre gênero e clima. Compreenderá também como esses temas são transversais a tudo o que é relacionado às mudanças climáticas.
2 Aulas — 1h Total
Iniciar