A COP30 precisa planejar o fim dos combustíveis fósseis

Para fazer da conferência uma “COP da Verdade”, Lula deve propor a líderes e negociadores um cronograma de abandono de petróleo, gás e carvão.
4 de novembro de 2025
  • Alexandre Gaspari, jornalista no Climainfo
Montagem sobre foto da Petrobras.

A licença do IBAMA para o poço Morpho, que a Petrobras vai perfurar no bloco FZA-M-59 na Foz do Amazonas, foi dada 20 dias antes da COP30, a primeira conferência do clima a ser realizada na Amazônia. A contradição não passou em branco. Minimizando a cobrança, o presidente Lula disse que há uma “celeuma” no Brasil sobre a exploração de petróleo e gás fóssil na região e que “não é possível ninguém abrir mão do combustível fóssil de um dia para a noite. É preciso construir o fim da utilização do combustível fóssil”.

A poucos dias da conferência e de sua cúpula de líderes, cabe perguntar a Lula: o Brasil proporá aos países a construção desse “fim da utilização do combustível fóssil”? Afinal, no final de 2023, na COP28, em Dubai, Lula conclamou as nações a avançarem na eliminação de petróleo, gás fóssil e carvão, em seu discurso na sessão de abertura. 

“O mundo já está convencido do potencial das energias renováveis. É hora de enfrentar o debate sobre o ritmo lento da descarbonização do planeta e trabalhar por uma economia menos dependente de combustíveis fósseis. Temos de fazê-lo de forma urgente e justa”, disse o presidente na ocasião. 

A fala de Lula, contudo, acabou na linha do “faça o que eu digo, mas não o que eu faço”. Já em Dubai, há dois anos, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou a adesão do Brasil à OPEP+, cartel que reúne os petroestados. Segundo Lula, o movimento seria para “convencer” os países do cartel  a abandonar os combustíveis fósseis. 

Poderíamos até ter boa vontade com Lula, não fosse pelo fato de, entre a COP28 e a COP30, o presidente ter engrossado a pressão política sobre o IBAMA pela licença para a Petrobras perfurar um poço de petróleo e gás na Foz do Amazonas. Enquanto repetia que “tudo seria feito com todo o cuidado ambiental” e elogiava a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, Lula também criticava a suposta demora do órgão ambiental em autorizar a atividade. 

Se avançou no petróleo, o Brasil parou na elaboração do Plano Nacional de Transição Energética (PLANTE). Somente uma semana antes da COP30 aconteceu a primeira reunião do Fórum Nacional de Transição Energética (FONTE), que reúne integrantes de governo, sociedade civil e empresas para estabelecer premissas para o plano. Que está sob a responsabilidade da pasta de Alexandre Silveira, que defende com unhas e dentes a exploração de petróleo no Brasil “até a última gota”.

Dois anos se passaram entre Dubai e Belém. As emissões de gases de efeito estufa do planeta continuaram subindo e batendo recordes nesse período, alimentadas sobretudo pela queima de combustíveis fósseis, a principal causa das mudanças climáticas. O secretário-geral da ONU, António Guterres, admitiu recentemente que já é inevitável o aquecimento global a 1,5ºC, limite combinado há 10 anos, no Acordo de Paris. 

A urgência da transição energética mencionada por Lula em seu discurso em dezembro de 2023 está mais do que dada. Logo, é mais do que necessário que o presidente coloque na mesa de negociações da conferência do clima da Amazônia um caminho para que o transition away proposto em Dubai volte para a declaração final da COP, já que desapareceu da edição passada, em Baku, no Azerbaijão. Mas, como a própria presidência brasileira da COP30 vem repetindo incansavelmente, não bastam palavras: é preciso ação e implementação.

O Brasil, felizmente, chegará a Belém com parte de seu dever de casa cumprido, como mostram os recentes números do desmatamento, que vêm caindo graças às ações do governo federal. Mas para o clima pouco adianta cortar emissões de um lado, evitando o desmate, e jogar mais gases de efeito estufa na atmosfera apostando na expansão da exploração de petróleo e gás. Ainda mais quando essa expansão foca a Amazônia, que deveria ser decretada como uma zona de proteção, sem atividade petrolífera.

Cabe a Lula propor às nações que construam um cronograma de abandono global dos combustíveis fósseis, com metas, datas e orçamento adequados. É isso que se espera de um líder climático, como o presidente ambiciona ser. E é isso que a COP30 precisa para ser a “COP da Verdade”, como Lula mencionou na Assembleia Geral das Nações Unidas, em setembro, e a “COP da implementação”, como almeja a presidência brasileira da conferência. 

Continue lendo

Assine Nossa Newsletter

Fique por dentro dos muitos assuntos relacionados às mudanças climáticas

Em foco

Aprenda mais sobre

Justiça climática

Nesta sessão, você saberá mais sobre racismo ambiental, justiça climática e as correlações entre gênero e clima. Compreenderá também como esses temas são transversais a tudo o que é relacionado às mudanças climáticas.
2 Aulas — 1h Total
Iniciar